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Reflexão sociológica sobre as mudanças mais marcantes nos padrões e experiências modernas de maternidade

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Por:   •  21/8/2014  •  Trabalho acadêmico  •  5.308 Palavras (22 Páginas)  •  366 Visualizações

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Introdução

O objetivo deste artigo é fazer uma reflexão sociológica das mudanças mais marcantes nos padrões e experiências contemporâneas da maternidade, com base em estudos e pesquisas existentes, situando o debate teórico em torno desse processo (Badinter,1980; Chodorrow, 1980; Deutsch,1987; Ferrand, 1982; Knibielher, 1977; Kitzinger, 1978; Vilaine et al., 1986). Pressupomos que a escolha da maternidade é um fenômeno moderno consolidado no decorrer do séc. XX com o avanço da industrialização e da urbanização.

As transformações pelas quais os padrões de maternidade vêm passando, nos últimos trinta anos, devem ser pensadas em conexão com esses processos sociais e com a globalização econômica, a qual contribuiu para acelerar a difusão de novos padrões de comportamento e consumo. Entre estes, podemos citar como exemplo, o consumo crescente das novas tecnologias reprodutivas (contraceptivas e conceptivas) que ofereceram às mulheres, da década de sessenta em diante, a possibilidade de escolher com maior segurança a realização da maternidade.

Cabe lembrar, neste decurso, as mudanças que vêm ocorrendo na vida privada, especialmente na família e nas relações de gênero, com a emergência de novos modelos de sexualidade, parentalidade e amor, tais quais os apontados por Giddens (1993, p.73) como o "amor confluente" que "presume igualdade na doação e no recebimento emocionais", fruto das relações de gênero observadas, em pesquisas analisadas por este autor, nas sociedades inglesa e americana, nas décadas de setenta e oitenta.

Neste artigo abordamos a maternidade como um fenômeno social marcado pelas desigualdades sociais, raciais/étnicas, e pela questão de gênero que lhe é subjacente. Decorre disto que as mudanças e implicações sociais da realização dessa experiência não atingem da mesma forma todas as mulheres, países e culturas, apesar de existir um modelo de maternidade preponderante nas sociedades ocidentais contemporâneas, que tem como características gerais proles reduzidas e mães que trabalham fora2.

Portanto, é necessário considerar neste debate a inserção das mulheres no mercado de trabalho, sua presença no mundo público e os impactos que estes fatos trouxeram à instituição familiar e, em conseqüência, à experiência da maternidade. O pano de fundo desta discussão ressalta que a questão da maternidade em todos seus aspectos sempre esteve presente na luta libertária das mulheres e, portanto, foi objeto constante da reflexão teórica feminista. É com base nestes elementos que construímos nossa reflexão sobre a maternidade.

Ser ou não ser mãe: dilema moderno?

Nas sociedades rurais, a maternidade sempre foi assimilada à fecundidade da terra. As crianças apareciam como necessárias para o trabalho e como segurança para o futuro dos pais, na velhice e na doença, embora, muitas vezes, representassem um encargo no presente (Knibielher, 1977). O "infanticídio tolerado" a que se refere Ariès (1981), no final da Idade Média, retrata uma época na qual a vida da criança e a própria experiência da maternidade tinham outro valor.

Segundo Giddens (1993) a "invenção da maternidade" faz parte de um conjunto de influências que afetaram as mulheres a partir do final do séc. XVIII: o surgimento da idéia de amor romântico; a criação do lar, a modificação das relações entre pais e filhos. O autor assinala que no final do séc. XIX houve um "declínio do poder patriarcal" com o "maior controle das mulheres sobre a criação dos filhos" referindo-se a um deslocamento da "autoridade patriarcal para a afeição maternal" (Ryan 1981, apud. Giddens, 1993, p.53). Ele destaca como novo, neste período, a forte associação da maternidade com a feminilidade.

Este modelo se consolidou-se em uma ideologia que passou a exaltar o papel natural da mulher como mãe, atribuindo-lhe todos os deveres e obrigações na criação do(a)s filho(a)s e limitando a função social feminina à realização da maternidade. Entretanto, como nos alerta Knibielher e Fouquet (1977), a realização desse ideal de maternidade era impossível para as mulheres pobres:

As classes dominantes que reinventam a maternidade como vocação feminina exclusiva estão em contradição absoluta com a realidade concreta: muitas mulheres trabalham no séc.XIX e devem assumir sua maternidade nas condições mais difíceis. A distância é imensa entre o ideal descrito e sonhado da mãe educadora, consagrada em tempo integral a suas crianças, e a vida cotidiana das mães de origem modesta.3 (p.210)

A transição de um modelo tradicional de maternidade (a mulher definida essencial e exclusivamente como mãe: proles numerosas) para um modelo moderno de maternidade (a mulher definida também como mãe, entre outras possibilidades: proles reduzidas e planejadas) deu-se com a consolidação da sociedade industrial.

As contradições inerentes ao processo de industrialização e a forma como as mulheres ingressaram no mercado de trabalho, marcadas por profundas desigualdades sociais e sexuais, revelam os impactos desse processo na mudança dos padrões da maternidade. No momento em que as mulheres das famílias operárias, no séc. XIX, começaram a associar, de forma crescente, trabalho fora do lar e maternidade (leia-se, também, como trabalho no lar), instaurou-se a lógica da dupla responsabilidade, que se consolidou no séc. XX, com o avanço da industrialização e da urbanização, recebendo por parte das análises feministas contemporâneas a designação de "dupla jornada de trabalho" 4.

Com mais acesso à educação formal e à formação profissional, as mulheres vão, no decorrer do século XX, ocupar gradativamente o espaço público, ao mesmo tempo em que mantêm a responsabilidade na criação do(a)s filho(a)s. Neste contexto, ser ou não ser mãe passou a ter uma dimensão reflexiva5, a ser uma decisão racional, influenciada por fatores relacionados às condições subjetivas, econômicas e sociais das mulheres e, também, do casal.

O advento da modernidade e de suas conquistas tecnológicas, sobretudo no campo da contracepção, e mais recentemente da concepção, trouxe às mulheres uma maior possibilidade na escolha da maternidade e abriu espaço para criação do dilema de ser ou não ser mãe. Um dos elementos que viabilizou a escolha da maternidade foi, sem dúvida, a contracepção moderna.

Entretanto, o controle da fecundidade

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