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A Dicotomia Entre Kelsen e Schmitt

Por:   •  27/10/2022  •  Trabalho acadêmico  •  2.645 Palavras (11 Páginas)  •  54 Visualizações

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Dicotomia entre Kelsen e Schmitt

Para o presente trabalho abordarei as principais concepções de Hans Kelsen e Carl Schmitt, buscando compreender as principais máximas de cada autor e sua visão sobre o direito e os elementos que o permeiam. Além disso, ao final será abordado a concepção de cada autor sobre o responsável pela guarda da Constituição, buscando sintetizar as concepções inicialmente já apresentadas no trabalho.  

Para Hans Kelsen a Constituição deveria ser normativa. Assim, ele defende uma visão liberal de Estado, afastando a visão organicista (e por consequência uma compreensão totalitária) de uma nação. Segundo o entendimento organicista, o indivíduo é um “braço” do Estado e, por isso, deve “servir” ao seu país. Dessa forma, há a busca por retomar a ideia de que o ser humano desenvolve uma série de relações para além da vinculação do indivíduo ao Estado.

Assim, quanto maior for a concentração de quem “faz o direito”, mais autocrático é o Estado. Quanto mais se distribui a atividade de criação do Direito, mais se aproxima da ideia de Democracia. Segundo Kelsen, o Direito está sendo criado a todo momento pelo legislativo, judiciário e muitos outros. Dessa forma, Kelsen tenta desenvolver um método para evitar a autocracia, isto é, defende o poder de revisão das Cortes Constitucionais sobre os atos legislativos.                                                         Um ponto muito importante para Kelsen foi o relativismo. O autor entendia que uma ideia de justiça relativista pode ser prejudicial, pois pode velar ao “grupismo”, “sectarismo”, isto é, gera uma sistema de convicção único, que contraria qualquer ideia que seja diferente da concepção já estabelecida. Destarte, evitam dialogar com posições diferentes, só aceitando a interlocução em último caso, gerando certas bolhas de pensamentos reclusos e voltadas para si mesmo.                                                 Entretanto, Kelsen é relativista na medida em que defende que não existe um argumento absolutivo, não há um fundamento que não possa ser revisto. O mesmo vale para o método, ele sempre pode ser repensado. A vista disso, é possível compreender que há uma espécie de Pêndulo entre democracia e autocracia, ou seja, quanto mais um Estado se aproxima da concepção de absoluto, mais se aproxima da autocracia. E quanto mais um Estado relativiza essa busca pelo absoluto, mais ele tende a produzir pontos de vista diferentes, mais se aproxima da democracia (dá mais espaço para distribuir o poder, cria-se mecanismos de participação). Assim, a democracia ou o autoritarismo é um método escolhido pelos chefes de um Estado.         

A democracia, no plano de ideia, é uma forma de Estado e de sociedade em que a vontade geral, ou, sem tantas metáforas, a ordem social, é realizada por quem está submetido a essa ordem, isto é, pelo povo. Democracia significa identidade entre governantes e governados, entre sujeito e objeto do poder, governo do povo sobre o povo (KELSEN, 2000, p. 35).

Assim, Kelsen afirma que a democracia é muito importante pois indica a vontade comum de uma nação. Mas como já afirmado, o autor acredita que sempre haverá uma disputa permanente entre dois polos: Democracia e Autocracia. Democracia (relativismo = método dinâmico) x Autocracia (Absoluto = retirar esferas de decisão).          Um ponto extremamente relevante para Kelsen é o pluripartidarismo. Assim, o partido é um instrumento para a consecução da democracia.

Se quisermos passar da noção ideal para noção real de povo, não poderemos limitar nos a substituir o conjunto de todos os indivíduos submetidos ao poder pelo círculo bem mais estreito dos titulares dos direitos políticos; é preciso dar outro passo e levar em consideração a diferença existente entre o número desses titulares dos direitos políticos e o número dos que efetivamente exercem esses direitos (KELSEN, 2010 p. 37-38).

        A democracia surge da carência de garantias em relação ao povo. Sendo o poder  deslocado do soberano para as mãos do povo. Dessa forma, a vontade do povo é manifestada por meio dos seus representantes. Por isso é fundamental a pluralidade de partidos, para que obtenha a máxima representação na esfera democrática.                        Como abordado inicialmente, Kelsen compreende o Estado como uma ordem normativa. Não existe Estado fora dos campos do direito, sendo o Estado sinônimo de normatividade. Da mesma forma, a autoridade está contida dentro do estado, nunca fora dele. Assim, para Kelsen, a autoridade é a validade objetiva do direito. A autoridade que o Estado tem está em regular as condutas de sua própria sociedade, não há, portanto, uma Teoria da Soberania.                                                                            Para finalizar, Kelsen acreditava na norma fundamental. Assim, há a primeira norma, que é uma norma hipotética que serve de fundamento para todo o sistema jurídico (norma lógico-hipotética). Consequentemente, cria-se um sistema fechado em que o fundamento do direito é o próprio direito. Não existindo nada fora do direito que sirva ao direito, o que levou a fortes críticas, pois o autor foi acusado de despolitizar do direito. Assim, o poder público, território e povo são elementos que derivam da validade. Dessa forma, Kelsen acreditava em uma interpretação científica do direito neutro através de uma pureza metodológica, havendo uma separação entre o conhecimento político e jurídico.          Carl Schmitt foi um teórico político que buscou compreender os Estados e suas relações de poder. Assim, para compreendê-lo é essencial uma digressão ao século XVII, que ocorreu a chamada “Paz de Vestfália”, também chamada de Tratados de  Münster e Osnabruque. Esses tratados puseram fim a algumas guerras que ocorreram na Europa, além de reconhecer oficialmente a autonomia de certos territórios. Dessa forma, os pactos acordados deram início a um novo sistema internacional, pois dava relevância à denominada soberania estatal.                                                                 Esses acordos deram início ao pensamento de paz duradoura, ou seja, havia uma busca por um equilíbrio de poder. Com todas essas mudanças algumas noções foram estabelecidas e consubstanciadas como a soberania, criando a essência dos Estados nações e a preocupação com a territorialidade. Assim, foi  criada uma “balança europeia” havendo limites estabelecidos para evitar a guerra, ou no mínimo, gerar balizadores para seu acontecimento.                                                                         Diferente de Kelsen, Schmitt fez duras críticas ao liberalismo, à democracia parlamentar e ao pluralismo político, pois acreditava que esse modelo de ideias levavam a uma decadência da tradição política europeia. Schmitt acreditava que o modelo político europeu (eurocêntrico) deveria ser mantido para evitar o declínio jurídico. O autor buscou definir a ideia de político por meio da relação entre amigo e inimigo (a política depende sempre da identificação de seu adversário). Sendo assim, para Schmitt, as noções de políticas, trazidas pelo liberalismo, aviltam a política. Como consequência, a política viraria um jogo de interesses, sempre buscando a proteção de interesses privados.                 Segundo o autor, o político precisa definir o seu adversário (do Estado, do povo, das condições de existência). O adversário não é o inimigo pessoal, inimigo econômico, mas um  inimigo público, um adversário (político e jurídico), definido com base no interesse público (que querem subverter a ordem).  Dessa forma, Schmitt fez crítica a outros modelos de pensamento, pois transformam o direito em uma estrutura vazia de conteúdo, havendo a possibilidade de uma guerra infinita e sem limites. Em sua concepção, é o político que coloca limites ao conceito de inimigo.                                 A crítica do pluralismo político é outro componente dos seus ideais, para o autor, ao transformar a política em vários fragmentos, perde-se a capacidade de identificar quem é que está decidindo. Assim, ao invés de gerar um Estado de decisão, cria-se um estado de discussão. Da mesma forma, para Schmitt, o poder de decisão é do soberano, ele que decide sobre o Estado de exceção. Assim,a  decisão não precisa se justificar no sistema normativo.                                                                                Diferente de Kelsen, para Schmitt, a decisão está fora e dentro do direito (simultaneamente). Ela não precisa ter pressupostos normativos. Essa decisão tem um elemento político que não pode ser reduzido, principalmente quando o sistema está sendo ameaçado/ está passando por turbulências. É justamente nesse momento em que o soberano precisa aparecer e tomar uma decisão (de instituir um Estado de exceção). Dessa forma, a decisão é e não é jurídica, pois não está limitada ao direito, mas gera consequências jurídicas.                                                                         É interessante ressaltar que Schmitt parte do mesmo lugar que Kelsen. Kelsen exige que haja um mínimo de eficácia para que o ordenamento jurídico seja considerado válido, mas o autor retira isso do direito. Já  Schmitt, compreende de forma contrária, a grande função do direito é garantir a situação normal/ normalidade. Então, o primeiro fundamento do direito é a política. Assim, enquanto Kelsen precisa imaginar uma norma hipotética para fechar o sistema, para Schmitt o direito depende da decisão. Por isso, ele é um autor decisionista.                                                                         Em relação ao pluriverso político, Schmitt afirma que a ideia de pluriverso político é um pluralismo entre Estados. Já o pluralismo interno ao Estado deve ser considerado perigoso. Dessa maneira, o autor se coloca como contrário ao direito cosmopolita. Para o schimitt, o direito internacional é espaço de disputa entre Estados.                                  Para Schmitt, o núcleo político da constituição são os direitos de emergência, os quais garantem ao soberano decidir sobre o caso crítico. Os poderes de emergência preenchem o núcleo central da decisão. Assim, o autor  é antiburguês e antiliberal. Em sua concepção, a constituição não é apenas uma camada normativa em uma hierarquia escalonada de normas. Schmitt, não poderia reduzir a Constituição ao normativismo. A Constituição prevê e contém uma decisão fundamental (poderes de emergência e situação crítica). Ele tem uma visão decisionista da Constituição, ou seja, a Constituição carrega a decisão.                                                                                         Em síntese, Schmitt pensa a constituição de uma forma completamente diferente de Kelsen. A questão para ele não é a validade do ordenamento jurídico. O ponto principal é entender a hierarquia política (compreendendo a constituição como um instrumento político). Ao definir essa hierarquia política, o autor é antiliberal. Detendo uma visão liberalista, os direitos fundamentais têm papel de destaque. Em uma visão antiliberal, tem-se as garantias institucionais com prevalência, pois é onde a força do soberano está contida. Assim, para Schmitt há os direitos de liberdade: pois um indivíduo só é livre na coletividade, negando a relação entre liberdade e indivíduo. Dessa forma, liberdade vem de um enquadramento na hierarquia do Estado. A liberdade é condicionada a um todo orgânico. Cada indivíduo faz parte do todo (visão orgânica). Gerando a ideia de prevalência do coletivo sobre o indivíduo.                                                         Para finalizar, há um importante debate entre Kelsen e Schmitt: “Quem é o guardião da Constituição?". Schmitt utiliza em seu debate elementos monárquicos para afirmar, em última instância, que não será nem o parlamento, nem necessariamente o executivo, muito menos o judiciário. Para ele, o guardião é o presidente. Quando ele for acionado para decidir sobre a interpretação última da lei, será fundamentado nos direitos de emergência. Já Kelsen entende que o guardião da constituição é o poder judiciário, vinculado aos poderes a ele conferidos pela Constituição, por meio do controle de constitucionalidade.  

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