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A Sociedade Anônima e o Direito Comercial

Por:   •  20/6/2015  •  Trabalho acadêmico  •  7.477 Palavras (30 Páginas)  •  231 Visualizações

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Sociedade Anônima e o Direito Comercial - parte 1

Introdução

Sob o regime político do Estado Novo, no ano de 1940, surgiu o Decreto-Lei 2.627, que se propunha, entre outras regras, a regular os direitos essenciais dos acionistas das companhias abertas e fechadas. Na exposição de motivos do Anteprojeto do referido Decreto, há aparente intenção, por parte do legislador, em proteger os interesses dos acionistas não controladores. No entanto, esta proteção mostrou-se ineficaz com o passar do tempo e, pior do que isso, nossos legisladores até os dias atuais, permanecem indiferentes ao desrespeito e ao solapamento dos direitos essenciais dos acionistas minoritários. Na realidade, os direitos essenciais foram concedidos de forma demagoga, conferindo direitos às minorias, porém com a devida cautela de não protegê-los em demasia, para que os negócios sociais desejados pelos controlados não pudessem ser obstaculizados. Os direitos elencados no Decreto-lei de 1940, foram inspirados na legislação alemã e, mais especificamente na lei acionária de 1937 que retirava da minoria o "excessivo" poder decisório anteriormente concedido, pois estes acionistas acabam por impedir a conclusão de contratos "úteis" à sociedade. Era o interesse da companhia enquanto instituição considerado acima do bem e do mal, desconsiderando completamente as minorias. A conjuntura da época favorecia essa visão "às avessas" da função social da companhia. Hoje, como sabemos, a função social das empresas é voltada para a geração de empregos, crescimento econômico e estímulo cada vez maior da poupança popular. Uma proteção eficaz às minorias é crucial nesse momento se quisermos alavancar o crescimento do país, isto porque com seus direitos efetivamente protegidos, as minorias cada vez mais investirão suas economias no mercado de capitais. A condição de abandono e o descaso em relação aos acionistas minoritários é antiga e remonta no Brasil de legislação nascida sob a égide de um regime totalitário, como afirmamos. No entanto, ainda mais grave do que isso, é o fato dos direitos essenciais até os dias atuais serem os mesmos do Decreto-lei 2.627 de 1940 e pior ainda houve supressão de alguns deles. Inconcebível que o espírito de uma lei, gerada nos porões do nazismo, como foi a Lei Acionária Alemã de 1937, com raízes em correntes ultradireitistas, possa continuar prevalecendo até nossos dias, quando felizmente alcançamos a democracia. Dentro dessa política, forçosa concluir-se que as minorias de um modo geral, somente eram lembradas para serem perseguidas e rechaçadas, o povo judeu que o diga. A legislação nada mais é do que o reflexo direto da conjuntura política e social de uma época e, uma vez que não se questiona a evolução dos povos, não há que se falar em estagnação normativa. Por outro lado, se a legislação existe com a finalidade de regular nossa convivência em sociedade, e se os princípios da igualdade e isonomia foram erigidos à categoria de norma suprema, não podem ser simplesmente ignorados. A conjuntura do Brasil durante do Estado Novo era de autoritarismo absoluto, no ano de 1937, seu início, Vargas fecha o Congresso Nacional, as Assembléias Estaduais e suspende as liberdades políticas, a pretexto de acabar com a instabilidade política brasileira, que sofria as conseqüências da tensão que tomava conta da Europa, principalmente na Alemanha e Itália. É nesse contexto de desmandos sem resistência eficaz, até porque Vargas possuía forte carisma e a exemplo do Führer possuía um grande poder de convencimento, que nasceu a primeira legislação de proteção ao acionista minoritário. O Decreto-lei 2.627 de 1940 representou retrato da época e mostrou-se ineficaz diante das manobras perpetradas pelos controladores das companhias. “O Decreto-lei já previa, em casos de conflitos de interesses entre o acionista e a sociedade, com vistas a coibir os abusos praticados por majoritários, a anulação da deliberação decorrente de voto exercido por acionista com o objetivo de obter, para si ou para outrem, vantagens particulares, estranhas à sociedade, e de que resultassem, ou pudessem resultar, prejuízos para a companhia ou para outros acionistas.” Consagrava dispositivos eminentemente voltados à proteção das minorias, tais como o direito de recesso nos casos de criação de ações preferenciais ou alterações nas preferências ou vantagens conferidas a uma ou mais classes delas ou criação de nova classe de ações preferenciais mais favorecidas; mudança do objeto essencial da sociedade; incorporação da sociedade em outra ou sua fusão; cessação do estado de liquidação, mediante reposição da sociedade em sua vida normal. Aos titulares de ações preferenciais e detentores de um quinto ou mais do capital social, era facultado eleger, separadamente, um dos membros do conselho fiscal e respectivo suplente. Aos minoritários era igualmente assegurado os direitos de fiscalização, exibição judicial dos livros e, de convocação de Assembléias Gerais em casos comprovados de inércia da Diretoria na resolução de problemas graves e urgentes.

No entanto, na prática os desmandos e abusos por parte dos controladores continuavam a acontecer. Em conferência realizada no ano de 1969, Hernani Estrela, ilustre mestre gaúcho, desvendava as fraudes perpetradas pelos majoritários com o intuito de exclusão dos minoritários da distribuição de dividendos. Assim manifestou-se o jurista: “Seria difícil, senão impossível, enumerar e descrever os processos que são postos em prática pelos órgãos dirigentes de certas sociedades anônimas, a fim de sonegarem lucros ou não os distribuir.” Todos os expedientes e artifícios, alguns cavos e vulgares, outros elaborados com requintada astúcia, entram em ação. A fertilidade e o engenho são tais que desafiam, por vezes, até os versados em contabilidade, dificultando-lhes a localização da fraude. As regras da técnica contábil sobre o bom arranjo da escrituração, e as normas legais acerca da confecção do balanço, são com freqüência falseadas, sem que do vício fique rastro visível. Mas mesmo fora desses casos, a ocultação do lucro costuma ser feita, com aparente observância da lei e segundo os ditames da ciência contábil. Notadamente o balanço do exercício, apesar de legalmente padronizado, quanto aos componentes ativos e passivos e, também, quanto ao critério a seguir nas avaliações, representa, para a generalidade dos acionistas, um jogo intrincado de parcelas e cifras, um verdadeiro enigma... Não admira portanto, que não o examinem nem tentem interpretá-lo, contemplando-o como qualquer coisa que foge ao entendimento comum... Quando, em face desse estado de coisas, os desventurados acionistas componentes da minoria querem protestar, a maioria lhes opõe carradas de razões. Responde que à Administração, com o plácito da Assembléia, cabe resolver sobre o que mais convenha à sociedade, traduzindo-lhe o querer e o sentir, sendo a vontade do órgão coletivo essencialmente diversa da vontade singular de cada um de seus membros. Nesta contraposição, deve prevalecer o interesse "superior" impessoal, que é o bem comum... Para protegê-lo, pois, os poderes dirigentes (Administração e Assembléia) têm a prerrogativa de adotar, conforme o seu critério prudencial, as medidas econômicas e financeiras que julgar necessárias ao bem da empresa. Aos sócios, singularmente considerados, como também ao judiciário, é defesa qualquer apreciação a tal respeito. Sustenta-se, ainda, que os lucros, enquanto não distribuídos e no poder da sociedade, a esta pertencem, como pessoa distinta da de seus membros. Estes teriam, apenas, uma mera expectativa de direito, somente concretizável quando ditos lucros fossem distribuídos. Por conseguinte, e salvo disposições em contrário nos estatutos, a distribuição ficaria a depender da Assembléia. A periodicidade dos exercícios sociais, mesmo depois de consagrada em lei, por si só não implicaria obrigação de partilha dos lucros. Graças a tais arranjos e argumentos, a minoria acaba sendo expoliada."

O direito italiano, em seu Código Comercial, na tentativa de coibir abusos por parte dos administradores das sociedade anônimas, já previa, assim como nossa atual legislação comercial (Lei 6.404/76), vedação expressa ao voto do acionista administrador nas deliberações assembleares de aprovação do balanço e naquelas que dissessem respeito à sua própria responsabilidade perante a companhia. A violação a esta norma acarretava a nulidade absoluta do voto proferido. Havia ainda o artigo 150 da referida legislação italiana, o qual ordenava que o administrador que, em determinada operação, tivesse interesse contrário ao da sociedade, devia dar notícia aos outros administradores e aos conselheiros fiscais, abstendo-se de tomar parte da deliberação a respeito, sob pena de responder pelos prejuízos causados. No entanto, o conflito de interesses, no caso do artigo 150, não dava lugar à invalidade no voto do administrador, mas apenas à sua responsabilidade por perdas e danos. Na esteira do Código de Comércio da Itália, o nosso Decreto 434, de 1891, não continha uma norma genérica de proteção ao interesse da companhia nas deliberações assembleares , mas apenas um dispositivo vedando aos acionistas o exercício do direito de voto nas hipóteses de aprovação das próprias contas como administrador, de avaliação de seus quinhões e de atribuição de vantagens estipuladas nos estatutos. O legislador, portanto, proibia o direito ao voto com base no pressuposto de que a ninguém é permitido julgar em causa própria.

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