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Resumo Livro Magnoli

Por:   •  9/9/2015  •  Resenha  •  8.056 Palavras (33 Páginas)  •  236 Visualizações

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Simultaneamente, o empreendimento recolonizador britânico punha em questão um outro fundamento do modo de vida e da economia bôer: a utilização de mão-de-obra escrava. Nas primeiras décadas do século XIX a Grã-Bretanha completava uma virada radical na sua política colonial, determinando a abolição completa da escravidão nos territórios sujeitos à sua autoridade. Essa decisão abriu um fosso intransponível entre o Ministério Colonial e os fazendeiros e criadores do Cabo. P. 21

Os ingleses tinham participado ativamente do comércio de escravos africanos para a América nos séculos XVII e XVIII, disputando o controle sobre o tráfico atlântico com os holandeses, franceses e portugueses. Contudo, nas últimas décadas do século XVIII irromperam as primeiras vozes contrárias ao tráfico e Lorde Wilberforce, deputado na Câmara dos Comuns, liderava uma estridente campanha de opinião pública pela abolição do comércio negreiro. P. 21

Ao lado da convicção, cada vez mais difundida, na maior eficiência econômica do trabalho livre e, talvez, do desejo de evitar a criação de uma indústria têxtil concorrente baseada no trabalho forçado no sul dos Estados Unidos, eram sobretudo razões morais e ideológicas que motivavam a campanha antiescravista britânica. P. 21

O Congresso de Viena (1814-15) representou o ponto alto da cruzada britânica contra a escravidão. Na ocasião, os ingleses impuseram às demais potências europeias o princípio da interdição do tráfico e, desde então, os navios britânicos passaram a interceptar embarcações suspeitas para forçar a aplicação desse princípio. Na África, a associação antiescravista fundada por Wilberforce em 1823 promove uma campanha tenaz contra os mercadores árabes e africanos que forneciam cativos para o tráfico marítimo clandestino. P. 21-22

Em 1833 foi declarado o fim da escravidão nas colônias britânicas, libertando de um só golpe cerda de 800 mil cativos. O parlamento de Londres votou a concessão de uma indenização total de 20 milhões de libras esterlinas, destinada a compensar os proprietários de escravos. No Cabo, a decisão representava a liberdade para cerca de 35mil nativos. Os proprietários bôeres receberam um total algo superior a um milhão de libras a título de indenização. Para muitos, a abolição representou a ruína e, para todos, pesados prejuízos econômicos. Porém, acima de tudo, desabava um estilo de vida e uma organização de produção material baseados na expropriação da terra e do trabalho dos nativos e na ausência de controles governamentais, regulamentos ou taxações. P. 22

A abolição da escravidão rompeu definitivamente os elos que ainda ligavam os colonos bôeres ao território britânico do Cabo. Em setembro de 1834 começava uma série quase ininterrupta de partidas em massa rumo às terras interiores. Milhares de colonos abandonavam as suas propriedades e dirigiam-se para os platôs distantes, habitados apenas pelas tribos bantos. Estava se iniciando o Grand Trek (Trek Principal). P. 22

O Grand Trek não foi um raio no céu limpo. Já que os treks existiam desde os primeiros tempos e tinham se constituído no fundamento da ocupação das terras baixas do litoral e mesmo dos tabuleiros um pouco mais distantes em cotas superiores a 500 metros. De fato, os treks tinham se intensificado desde o estabelecimento da soberania britânica sobre o Cabo, propiciando o povoamento bôer das terras a leste do rio Great Fish e ocasionando novas guerras cafres que se desenrolaram entre 1811 e 1835. P. 22

Contudo, o Grand Trek se distingue de todas as migrações anteriores pelo seu caráter massivo e pelo conteúdo de ruptura com a dominação britânica. Os treks precedentes haviam formado um tapete de povoamento contínuo, limitado por uma fronteira de colonização que avançava lentamente par ao interior sem perder o contato com as zonas antigas situadas nos arredores do Cabo. Entre 1834 e 1838 os trekers irromperam em locais distantes, nos platôs do nordeste, dispersando-se e disseminando focos autônomos de povoamento. Assim delineava-se  o que seria o território da atual República Sul-Africana. P. 22-23

As partidas do Trek eram cenas quase épicas. Dezenas de carros de bois, ladeados por cavaleiros que tangiam os rebanhos, levavam as mulheres e crianças. Cada grupo seguia atrás de um líder religioso, reconhecido por todos e consciente da sua missão. No espírito daqueles colonos protestantes africanizados, o Trek refazia a epopeia bíblica do Êxodo e tinha por fim o encontro da Terra Prometida. P. 23

O Grand Trek moldou duradouramente o caráter cultural e as atitudes diante do mundo da sociedade branca sul-africana. Ato de revolta romântica contra o futuro, negação da modernidade e do progresso, ele reafirmou a especificidade do grupo social europeu e protestante transplantado para a África tropical. Isolando-se do processo evolutivo geral, os trekers recusavam o entorno técnico e ideológico, atirando-se à aventura de reproduzir indefinidamente as suas próprias formas arcaicas de organizar o trabalho e interpretar o mundo.  MAGNOLI, p.23

Os trekers, em sua grande maioria , partiam das áreas costeiras a oriente do Cabo, nas proximidades de Port Elizabeth. Vencendo as escarpas, atingiam os altos platôs, em cotas superiores a 1.000 metros, dominados pela vegetação de campos e savanas pobres. A maioria deles atravessou o rio Orange e fixou núcleos de povoamento. Muitos foram ainda mais longe, ultrapassaram o rio Vaal e seguiram na direção das nascentes do Limpopo e dos Olifants. Alguns infletiam para o leste e desceram os montes Drakensberg, estabelecendo-se no Natal. MAGNOLI, p.23

A marcha dos grupos bôers levou-os para as terras dos bantos. A fixação dos núcleos de povoamento realizou-se mediante compromissos ou conflitos com os chefes tribais. Os zulus, a mais numerosa nação banto, sustentaram uma resistência encarniçada à progressão dos colonos, derrotando-os impiedosamente em vários encontros sangrentos. Em dezembro de 1838, porém, o líder bôer André Pretorius exterminou mais de 3 mil guerreiros africanos na batalha de Blood River, destruindo a capacidade de combate dos zulus. MAGNOLI, p.23

O Grand Trek originou expedições menores nas décadas seguintes, através das quais novas famílias juntavam-se aos pioneiros. Esse movimento de colonização gerou o aparecimento de numerosos ambientes novos e dispersos de fixação. O seu resultado foi a fundação das repúblicas bôeres do Transvaal e do Orange e de uma efêmera organização republicana autônoma no Natal, em torno de Pietermaritzburgo. Com o Trek o território da África austral se fragmentava em quatro unidades políticas distintas: o Cabo, o Natal, o Estado Livre de Orange e a Repúblic do Transvaal. MAGNOLI, p.23-24

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