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UMA ANÁLISE LITERÁRIA DO CONTO “A TERCEIRA MARGEM DO RIO”

Por:   •  30/7/2015  •  Artigo  •  8.007 Palavras (33 Páginas)  •  420 Visualizações

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DER NARRENKAHN OU A CANOA DOS LOUCOS:

UMA ANÁLISE LITERÁRIA DO CONTO “A TERCEIRA MARGEM DO RIO” DE JOÃO GUIMARÃES ROSA

Alessandro Daros Vieira Mestrando em Estudos Literários, Universidade Federal do Espírito Santo

Resumo: Buscamos, nesta pesquisa, edificar congruências entre “A terceira margem do rio” de Guimarães Rosa, e um corpus teórico composto de escritos dos filósofos Foucault, Heidegger e Lima Vaz. Compreender a especificidade, no conto, dos pares de opostos: Loucura-Sanidade, Normal-Patológico, Normal-Anormal e lobrigar as noções de gesto, preocupação, público, pertença doutrinária, transgressão e transmissão, dentre outras.

Resumen: Buscamos, en esta pesquisa, observar las contingencias entre el conto "A terceira margem do rio", del escritor brasileño Guimarães Rosa y un corpus teorico compuesto de escritos de los filosofos Foucault, Heidegger y Lima Vaz. Comprender la especificidad, en el conto dicho, de los pares de oposición: Locura-Sanidad, Normal-Patológico, Normal-Anormal y casar las nociones de gestual, preocupación, pueblo, pertenença doctrinária, transgreción y la transmición, dentre otras.

  1. Intróito

Este trabalho consiste numa análise do conto “A terceira margem do rio” de João Guimarães Rosa, presente em seu livro Primeiras Estórias, e se propunha, inicialmente, sopesar a narrativa roseana pela via de uma teoria peculiar, uma arqueologia do saber psiquiátrico inscrita na “Casa dos loucos” de Michel Foucault (1998, p. 113-128). Sua abordagem sinalizaria, então, um tempo antigo em que surgem um conhecimento específico acerca da loucura e sua “imprescindível” terapêutica, sendo sua morada, seu espaço de habitação, o hospital, o asilo.

Sem dúvida, o texto de Foucault descreverá alguns eventos que  poderão ser relacionados ao conto, ou, a que o autor da narrativa, em sua construção, poderá ter aludido. Entretanto, este texto inicial não bastou, a nosso ver, a uma possível analogia com o conto. Parece-nos que esta relação poderia ser mais bem alcançada com outros textos também de Michel Foucault, sendo prioritária a interface com o texto A ordem do discurso.

Por outro lado, ainda que abordássemos o conto desde a perspectiva histórica de M. Foucault faltar-nos-ia um elemento fundamental para a edificação analítica que aqui   se


pretende erguer. Este elemento figura dentre outros no corpus teórico produzido por Martin Heidegger em seu livro Ser e tempo: o ser-próprio e a estranheza que este causa, em seu vigor, ao impessoal, ao público. Bem como a preocupação, uma das derivações da “cura” (Sorge), étimo utilizado no “§26” de Ser e Tempo por Heidegger para melhor interpretar o movimento e as relações do fenômeno da pre-sença (Da-sein) (HEIDEGGER, 1999, p. 164-183).

Estabelecido o pano de fundo desde o qual nos pronunciávamos, devemos, pois,  passar à análise. Neste sentido, devemos iniciar por indicar as duas frentes de trabalho que queríamos, à época, aprofundar. A primeira faz referência ao lugar temporal do “antes de ser louco” e de sua posterior transubstanciação no fenômeno “loucura”; à construção teórico-social de uma doença: a loucura como doença mental; da elaboração de uma oposição vigente, ainda no presente, entre o normal e o patológico, tendo o segundo, o patológico, sido absorvido pela lógica social hegemônica da a-normalidade.

A segunda frente de trabalho indica e compõe junto à figura do “pai”, personagem do conto, a relação de estranhamento que este causa às personagens circundantes – representação literária do ambiente social – provocado pela assunção de seu destino próprio e intransferível, quando em relação com o discurso moderno, portanto corrente e hegemônico, da alteridade em seu olhar judicativo. Olhar que ajuíza ações e discursos de outrem, e que se valida na manutenção da ordem social constituída e vigente. Por ocasião da construção deste segundo momento da presente tarefa, passaremos necessariamente pela diferenciação entre o discurso falado e o discurso silencioso do gesto, uma referência explícita ao modo privilegiado de comunicação assumido pelo pai na narrativa. Neste sentido lançaremos mão do pensamento de Heidegger novamente, em outro momento de exposição de suas idéias, qual seja, o seminário realizado a 11 e 14 de maio de 1965 na residência de Medard Boss, psiquiatra alemão, em Zollikon, editado e publicado posteriormente, por este, como Seminários de Zollikon. (HEIDEGGER, 2001, p. 112).

Por conclusão, é nosso desejo realizar uma conjunção entre as duas frentes anteriormente descritas, realizando assim uma espécie de dialética, um movimento que consiste na ultrapassagem dos movimentos anteriores, conservando, porém, o melhor de tese  e  antítese  demonstradas,  suprassumindo-as.  Assim,  por  ocasião  do movimento


final, deveremos ter elementos suficientes para afirmar que o discurso ou a práxis do louco é da ordem de uma “naturalidade” que se submete ao saber específico1 que lhe é vinculado e que transmuta este modo de linguagem, não hegemônica, em “loucura”, excluindo-a socialmente. Esta exclusão “naturalizada” se conforma então, enquanto discurso, no dizer público e impessoal, no senso comum. De outro modo, como práxis, exclui-se a loucura trancafiando-a no espaço asilar, o que não parece ser aqui o caso

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