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Direito E Economia No Mundo Globalizado.

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Por:   •  24/10/2014  •  1.158 Palavras (5 Páginas)  •  428 Visualizações

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DIREITO E ECONOMIA NUM MUNDO GLOBALIZADO: COOPERAÇÃO OU CONFRONTO?

Armando Castelar Pinheiro* (Rio de Janeiro, julho de 2003)

Texto para discussão IPEA / Introdução

A globalização é um fenômeno que tem economistas e profissionais do direito como

alguns dos seus principais atores, na medida em que é um processo caracterizado pela integração econômica internacional e que, diferentemente do processo de integração do século XIX, é cada vez mais regulamentado e dependente de contratos, contratos e regulamentações que envolvem essencialmente economistas e profissionais do direito.

Dentro de cada país, também, a busca de um modelo econômico capaz de produzir uma integração competitiva na economia mundial tem levado à crescente interação entre o direito e a economia, como refletido no aumento da regulação e no uso mais intenso dos contratos como forma de organizar a produção, viabilizar o financiamento e distribuir os riscos. Em particular, as reformas da década de 1990 — privatização, abertura comercial, desregulamentação e reforma regulatória, na infra-estrutura e no sistema financeiro — deram grande impulso tanto à integração do Brasil na economia mundial como ao volume de regulação e à utilização de contratos.

Há várias formas de pensar a relação entre o direito e a economia no contexto da globalização. Usualmente, e o Brasil não é exceção, economia e direito interagem em torno de temas relativos ao que se convencionou chamar de direito econômico,

envolvendo questões de antidumping, antitrust e comércio internacional. Ainda que

calcada em conceitos e evidências microeconômicas, a abordagem utilizada neste trabalho tem uma preocupação mais macroeconômica. Em particular, o que se faz

aqui é discutir as conseqüências da qualidade das instituições jurídicas para o crescimento econômico de um país.

Instituições estas que variam muito de um país para outro, na sua forma e na sua qualidade, o que, em um mundo globalizado, tem conseqüências relevantes para o desempenho das economias nacionais. Essas diferenças ficam evidentes, por exemplo, em um estudo de Djankov et alii (2001) patrocinado pelo Banco Mundial, e que contou com a participação das associações de escritórios de advocacia Lex Mundi e Lex Africa. Nesse trabalho, os autores cotejam a qualidade dos sistemas legais e judiciais de 109 países, através da análise comparada de dois casos relativamente homogêneos: o despejo de um inquilino e a cobrança de um cheque. Mostra, com uma profusão de indicadores, que mesmo causas tão homogêneas como essas podem ter tratamentos muito diferentes nos vários países, seja em termos da sua regulamentação, seja na prática do judiciário, vale dizer, no seu curso pela justiça. Em particular, o tempo requerido em média para uma definição desses casos e as formas como esses processos correm na justiça, notadamente em termos processuais, podem

variar significativamente de um país para outro. Existem também estudos que analisam empírica e conceitualmente como direito e economia interagem diferentemente nos sistemas de civil e common law, não apenas

mostrando que o primeiro protege mais fracamente os direitos de propriedade privados, mas também avaliando as implicações práticas dessas diferenças para o crescimento e o desenvolvimento econômico dos países. Pode-se citar ainda, como evidência da influência dos sistemas legal e judicial sobre o desempenho de uma

economia, as várias medidas de risco país produzas pelas agências de rating, que incluem uma avaliação das instituições jurídicas do país, e da garantia com que estas provêem aos direitos de propriedade. O rating de risco soberano, por sua vez, influi no custo de captação externa e nas taxas de juros domésticas, e através destas no volume de crédito, no investimento, no crescimento e assim por diante.

É partindo dessa percepção que organizações como o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) preconizam que a reforma do Judiciário

deve ocupar um papel de destaque na nova rodada de reformas que se faz necessária para dotar as economias em desenvolvimento e em transição de instituições que sustentem o bom funcionamento do mercado. De fato, se um bom judiciário é importante para o adequado funcionamento de qualquer economia, ainda mais o é para uma que acaba de passar por reformas como as que foram adotadas no Brasil e na maior parte do mundo não desenvolvido na última década. Isso porque, com a privatização, o fim de monopólios e controles de preços e a abertura comercial muitas transações antes realizadas dentro do aparelho de Estado, ou coordenadas por ele, passaram a ser feitas no mercado. Sem o apoio de um bom judiciário, essas transações podem simplesmente não ocorrer, ou se dar de forma ineficiente, exigindo que as reformas sejam revertidas.

Assim, o Judiciário é uma das instituições fundamentais para o sucesso do novo modelo de desenvolvimento que vem sendo adotado no Brasil e na maior parte da América Latina, pelo seu papel em garantir direitos de propriedade e fazer cumprir contratos. Não é de surpreender, portanto, que, há vários anos, o Congresso Nacional venha discutindo reformas que possam tornar o Judiciário brasileiro mais ágil e eficiente. Não obstante, só recentemente se começou a analisar e compreender as relações entre o funcionamento da justiça e o desempenho da economia, seja em termos dos canais através dos quais esta influi no crescimento, seja em relação às magnitudes envolvidas. Nota-se, assim, que até aqui o debate sobre a reforma do Judiciário ficou restrito, essencialmente, aos operadores do direito — magistrados, advogados, promotores e procuradores — a despeito da importância que ela terá para a economia.

Mas será que, no mundo globalizado do século XXI, a relação entre direito e economia é sempre de colaboração, de unidade de objetivos e percepções, de forma

que a tarefa de melhorar o funcionamento do Judiciário requer apenas esforço e dedicação? Ou há também um campo importante de conflito entre os economistas e

os profissionais do direito, conflito que também contribui para comprometer o desempenho da justiça e é, portanto, contrário aos melhores interesses do país e da sociedade? Na palestra de abertura do Congresso promovido pela Academia Internacional de Direito e Economia, em junho de 2002, seu eminente presidente, o Dr. Arnoldo Wald, mencionava, por exemplo, que o tempo da economia não é o tempo do direito. Mas a diferença entre a economia e o direito, e o sistema de justiça em particular, vai além da questão do tempo ou da questão, que às vezes se menciona, de que a justiça olha mais para trás na tentativa de reconstituir um estado anterior das artes, enquanto a economia olha essencialmente para a frente, tentando prever e “precificar” — para usar um anglicismo que hoje é parte do economês nacional — o futuro. Nesse sentido, é útil refletir sobre uma perspicaz observação do professor George Stigler, da Universidade de Chicago, que nota que:

“Enquanto a eficiência constitui-se no problema fundamental dos

economistas, a justiça é a preocupação que norteia os homens do direito

(...) é profunda a diferença entre uma disciplina que procura explicar a

vida econômica (e, de fato, todo o comportamento racional) e outra que

pretende alcançar a justiça como elemento regulador de todos os aspectos

da conduta humana. Esta diferença significa, basicamente, que o

economista e o jurista vivem em mundos diferentes e falam diferentes

línguas” [Stigler (1992)].

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