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A regra da lei e algumas das suas instalações

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Por:   •  26/9/2014  •  Tese  •  1.166 Palavras (5 Páginas)  •  163 Visualizações

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bjetiva-se com este despretensioso estudo passar em revista alguns dos vários aspectos da concepção patrimonial-liberalista, que, vitoriosa na Revolução Francesa, deu tom à maioria dos diplomas substanciais da época, a exemplo do que se passou com o Código Civil brasileiro editado em 1916.

Mais que isso, pretende-se pôr em realce a mudança de perspectiva, que, à luz de transformações sócio-ideológicas advindas, fez proliferar um sem-número de estatutos e microssistemas comprometidos com a valorização dos atributos da socialidade e da solidariedade. Nessa direção encontram-se, verbi gratia, a Constituição Federal de 1988 e o Código Civil cuja vigência está programada para janeiro do ano vindouro.

Sob essas inspirações serão considerados os vetores e coordenadas do sistema nacional positivado, bem como as metas, objetivos e fundamentos da República Federativa do Brasil, aos quais se submete toda e qualquer atividade exegética dos textos e diplomas hierarquicamente inferiores, como é o caso das leis materiais civis.

Entretanto, impende alertar - até para que as propostas metodológicas anunciadas há pouco não venham a caracterizar suposta propaganda enganosa - que esta empreitada não se reveste de qualquer propósito inovador, muito menos exauriente. Destina-se, unicamente, a abrir oportunidade para a consideração e ponderação dos valores teóricos da nossa ordem substantiva e, mais propriamente, do nosso Novo Código Civil.

2. A ordem jurídica e algumas de suas premissas

Embora o homem deva continuar sendo o centro da atenção, até porque feito à imagem e semelhança de Deus, não deve mais ser concebido segundo o individualismo - quase egoístico - que impregnou a codificação napoleônica e, de resto, os vários diplomas à época promulgados, como o brasileiro de 1916. Contrariamente, há de ser visto e entendido como submetido ao dever de solidariedade social. A individualidade, pois, tem valor e peso na direta proporção de sua eficácia construtiva e da conveniência ao todo, à coletividade, visto que a liberdade individual tem sua medida na impossibilidade de seus interesses atentarem contra o bem-estar do grupo, travestindo-se em indesejado individualismo.

Com efeito, a consciência das transformações havidas em nossa sociedade impõe a releitura dos institutos e categorias jurídicas, hodiernamente, não mais sob os ares do individualismo e patrimonialismo de antão, mas segundo o compromisso ético a que todos estão submetidos, que é o de construir uma sociedade mais digna e justa, fazendo com que os fundamentos e princípios básicos (1) da República saiam do papel.

2.1 A suma divisio e seu desprestígio

Apesar de mantida na doutrina a clássica dicotomia do Direito, em público e privado, conforme se infere da maioria dos manuais, apenas pode ser conservada para fins metodológicos e didáticos, com vistas a facilitar aos iniciantes a compreensão da teia jurídica a partir de uma visualização global. Efetivamente, o ordenamento tem de ser um todo harmônico e congruente, de normas e preceitos, razão pela qual a partição, classificação ou setorização, se levada a extremos, implica riscos à unicidade e harmonia do sistema.

Logo, a divisio mantida na maioria dos manuais sucumbe às substanciais alterações axiológicas que assolaram - e assolam - a sociedade contemporânea, muitas delas fruto de transformações socioculturais verificadas a partir do segundo quartel do século XX, como de há muito enfatizou Michel Miaille (1988, p. 151-152). Sincronizada com essa advertência, a ordem jurídica teve de abrir espaço às mudanças, à socialização, à publicização do Direito Privado, pondo em xeque a dual classificação, numa tendência de aproximação ou imbricação do público e do privado (Tepedino, Maria, p.21-32).

Mas não se trata apenas de junção das duas categorias. A nova maneira de ver e compreender os fenômenos sociojurídicos(2) fez ver outra categoria, um terceiro gênero (Ascensão, 1994, p. 266), denominado de interesse social, relevante e supra-individual. Nessa esteira estão as questões de Família, do Trabalho, da Habitação, de Consumo etc., que sofreram significativas mutações com o intervencionismo estatal na esfera individual das pessoas, dando ensejo a estatutos ou leis de nova tessitura, como as alusivas a locações prediais para moradia; parcelamento do solo urbano; construção em condomínios; fornecimento etc.

O Diploma Consumerista,(3) por exemplo, deixou claro terem as normas natureza pública, de interesse social (art. 1o). Foi por isso que conferiu ao Ministério Público atribuições para defendê-las, em juízo ou fora dele (arts. 3o, 5º, II, 51, § 4º, 82, I, 92, 97 e 98). Também assim se pôs a Carta Política de 1988 (arts. 5o, XXXII, 129, III, 1127, 129, IX, 170, V e 48 do ADTC). A par de outros instrumentos de viabilização da política nacional de defesa dos consumidores,(4) disponibilizou-se a via da ação civil pública. Ora, tanto os interesses difusos quanto os coletivos e os individuais homogêneos,(5) devido a sua configuração metaindividual, são tidos como sociais, tão relevantes quanto os individuais indisponíveis, públicos, da ordem jurídica e do regime democrático, realçados pelo texto constitucional.(6)

Então, hoje são três os grupos de direito ou de interesse: a) público; b) privado e c) social, todos como partes sincronizadas de um mesmo todo, mas cada uma com suas particularidades.

2.2 Realidade, conceitos e valores cambiantes

O Direito não nasce do nada. Brota das realidades do mundo dos fatos, as quais se impõem mesmo contra os códigos, ainda que muitos relutem em aceitar a sua natural força motriz. De tal sorte, o Direito precisa de "maiores aberturas" sociais, como advertiu Piero Perlingieri (1997, p. 1-2).

Infere-se daí que realidade e conceito estão umbilicalmente ligados, coerentemente aparelhados. Do contrário, seriam funestas as conseqüências, e imensas as possibilidades de falência ou de imprestabilidade do complexo normativo. Como o suporte fático (Tatbestand ou fattispecie) é espaço-temporalmente variável, a revisão dos conceitos (normas) tem de seguir na mesma proporção. Daí porque a historicidade e relatividade são influenciadores do fenômeno jurídico, como acentuam Justen Filho(1987, p. 36) e Edson Fachin (2000, p. 186)

Impossível pensar o Direito como algo pronto e acabado (tal qual supunham os modelos analíticoconceitualista e positivista). Ao contrário, tem de ser visto como um sistema em construção, móvel, aberto, permeável e sensível à natural evolução dos fatos e às constantes mutações axiológicas. Aí a imprescindibilidade de se considerar a realidade social contemporânea na edição da norma e, sobretudo, a vigente. Somente assim se poderão compreender seus porquês e objetivos, com vistas a empreender a mais coerente e adequada interpretação, ou até mesmo a eventual substituição do preceito. Afinal, o divórcio desses dois planos causa na consciência popular aquilo que a doutrina designou de revolta entre os fatos e os códigos (Peluso, 1993, p. 28), capaz de pôr em xeque a legitimidade (efetiva) destes, e de comprometer a eficácia da ordem jurídica.

2.3 O tridimensionalismo do fenômeno jurídico

Segundo adverte Miguel Reale, Direito não é só norma (como pregava Kelsen), nem só valor (como se pensava à luz do Direito natural). É "uma integração normativa de fatos segundo valores" (1994, p. 119). Sua idéia (a do Direito como realidade trivalente ou tridimensional), doutrinariamente foi exposta pela vez primeira nos idos de 1940, por meio da sua obra Fundamentos do Direito (Reale, 1998). Em 1953, com a publicação de sua Filosofia do Direito (Reale, 1990), os três elementos foram, além de relacionados entre si, imbricados segundo a dialética, numa "dinamicidade integrante e convergente" (Reale, 1994, p. 119).

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