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A ÉTICA UTILITARISTA E O CASO DA COROA CONTRA DUDLEY E STEPHENS

Por:   •  22/7/2019  •  Artigo  •  1.789 Palavras (8 Páginas)  •  1.612 Visualizações

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A ÉTICA UTILITARISTA E O CASO DA COROA CONTRA DUDLEY E STEPHENS.

Raíssa Atem de Carvalho Pires1

Resumo: A todo instante o indivíduo se depara com decisões para tomar. Quais as implicações dos atos do indivíduo na sociedade? O presente artigo visa refletir acerca da ótica filosófica da ética utilitarista, analisando o caso concreto da Coroa contra Dudley e Stephens, que envolveu atos de canibalismo. Pode o canibalismo ser aceito em casos extremos ? Podemos relativizar o horror do ato em si em prol da sobrevivência humana ?

Palavras-chave: Bentham. Utilitarismo. Canibalismo. Ética.

Introdução

Diariamente as pessoas tem que tomar decisões e refletir: o que é fazer a coisa certa? Com base em quais princípios éticos devemos tomar nossas decisões? A partir destas indagações, expõe-se o caso Coroa versus Dudley e Stephens, trama que envolve canibalismo e a valorização da existência de alguns em detrimento de outro.

Uma das teorias que justifica o evento é o Utilitarismo, doutrina defendida por Jeremy Bentham, cujo pressuposto básico é que a coisa certa e justa a se fazer é maximizar a felicidade para o maior número de pessoas, e focar na utilidade dos indivíduos.

O presente artigo visa analisar o caso Dudley e Stephens, com base na ética utilitarista, refletindo sobre as motivações e consequências que as atitudes humanas podem ser fundadas. Podemos relativizar o certo ou errado conforme as circunstâncias?

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1 Advogada, Especialista em Direito Público e Direito Privado pela ESMEPI – Escola Superior de Magistratura do Estado do Piauí em convênio com a UFPI – Universidade Federal do Piauí. Especializanda em Direito de Propriedade e Desenvolvimento Sustentável pelo IDP – Instituto Brasiliense de Direito Público. Mestranda em Educação pelo Florida Christian University.

  1. Sobre o caso Coroa contra Dudley e Stephens

Em 1884, houve um naufrágio com o navio Mignonette em que quatro pessoas sobreviveram num bote salva-vidas no Atlântico Sul, a cerca de 1.600 km da costa: Thomas Dudley era o capitão; Edwin Stephens, o primeiro-  oficial; Edmund Brooks, um marinheiro e Richard Parker, um taifeiro de 17 anos.

No bote, eles estavam sem água potável e tinham apenas duas latas de nabos em conserva para se alimentarem. Os dias se passavam e a esperança de resgate tornava-se cada vez mais remota. Nos primeiros dias, alimentaram- se dos nabos, depois, pegaram uma tartaruga e conseguiram sobreviver por mais uns dias. Logo ficaram sem ter o que comer nem beber por oito dias, e Richard Parker, o jovem taifeiro, bebeu água do mar, contrariando as instruções dos companheiros, e ficou muito doente.

Passaram-se dezenove dias, até que o capitão Dudley, sugeriu um sorteio para escolher quem morreria para salvar os outros. Brooks foi contra a proposta, e acabaram não realizando o sorteio.

Entretanto, no dia seguinte, o instinto de sobrevivência e a fome falaram mais alto: Dudley pediu para que Brooks olhasse em outra direção e sinalizou a Stephens que Parker deveria ser morto. Então, Dudley fez uma prece, avisou ao jovem que sua hora havia chegado e apunhalou-o na jugular.

Brooks, apesar de inicialmente ter opinião contrária à proposta inicial também se alimentou do corpo e do sangue do jovem camareiro. Depois do incidente, finalmente foram resgatados por um navio alemão. Ao regressarem à Inglaterra, foram presos e levados a julgamento. Brooks foi testemunha de acusação. Dudley e Stephens foram julgados, confessaram espontaneamente que haviam matado e comido Parker.

Dudley e Stephens alegaram que tinham assassinado Parker por necessidade, argumentando que era melhor que um morresse para que três pudessem sobreviver, e que se ninguém tivesse sido morto provavelmente todos tivessem falecido. Um típico exemplo de aplicação de ética utilitarista. Apesar da situação de necessidade em que os sobreviventes se encontravam, foram condenados pela Justiça inglesa.

O breve relato dos fatos faz pensar: o que faríamos numa situação extrema como essa? Deixando a perspectiva legal de lado, seria moralmente aceitável sacrificar uma vida para manter outras? Há como mensurar o valor de uma vida?

O jovem taifeiro, era candidato natural ao sacrifício, já que morreria de qualquer maneira, por ter bebido água salgada. Ademais, não tinha pais nem dependentes, sua morte não privaria o sustento de ninguém, ao contrário de Dudley e Stephens, que tinham mulher e filhos.

Ao se defender perante o Tribunal, Dudley alegou que o assassinato de Parker salvou a vida de três homens, e que se não tivessem feito, todos teriam sucumbido à fome e à sede. Declarou que procurou maximizar o bem, já que a morte de Parker contribuiu para a sobrevivência dos outros três sobreviventes no bote salva – vidas.

Acrescentou ainda, que a morte do taifeiro foi a de menor impacto perante a sociedade, uma vez que os três sobreviventes tinham mulher e família para sustentar, ao contrário de Parker, que não tinha mulher, nem filhos e era órfão.Logo, Dudley procurou analisar as consequências de seus atos e maximizar o bem ao máximo possível. Seu argumento pode ter sido baseado na teoria consequencialista sobre a moralidade de seus atos.

Após a breve descrição do fato, deve-se analisar: O que faríamos numa situação como essa? De início, é muito fácil repugnar o canibalismo, posto que não é moralmente nem legalmente aceitável a conduta de um ser humano se alimentar de carne de seu semelhante.

Mas o caso descrito ocorreu em situação extrema, onde a fome já desestabilizava as emoções e o instinto de sobrevivência aflorou. Sem analisar a perspectiva legal do fato, é moralmente aceitável que uma pessoa seja sacrificada para a sobrevivência de um grupo? O ato de canibalismo praticado por Dudley e Stephens pode ser moralmente aceitável diante da situação em que se encontravam?

É certo que a necessidade não justifica atos ilegais, mas existe um grau de necessidade que se exonera a culpa? O canibalismo é uma prática moralmente e legalmente reprovável em todas as sociedades do mundo, mas é importante relevar que as regras que permeiam a sociedade são formuladas em abstrato, ou seja, podem surgir novas situações em que as situações previamente legisladas não se encaixem.

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