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Expedições com os objetivos da pesquisa de campo

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Por:   •  29/10/2014  •  Pesquisas Acadêmicas  •  2.607 Palavras (11 Páginas)  •  226 Visualizações

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.0 PROBLEMA

Faz-se normalmente referência ao trabalho de campo e à observação participante como se fossem um mesmo assunto. A diferença é simples: a observação participante é o envolvimento direto que o investigador de campo tem com um grupo social que estuda dentro dos parâmetros das próprias normas do grupo; o trabalho de campo é um processo que envolve mais aspetos da conduta social, dentro dos quais o comportamento manifesto é observado. O trabalho de campo procura, no conjunto da informação sobre o presente e o passado, contextualizar as relações sociais que observa; a observação participante é pontual, o trabalho de campo é envolvente. Procurar a fronteira entre dois momentos dum processo de conhecimento é um preciosismo de investigador que quer dizer o seguinte: dos dois, a observação participante é o envolvimento que despe o investigador do seu conhecimento cultural próprio, enquanto veste o do grupo investigado; é o exercício que tenta ultrapassar o etnocentrismo cultural espontâneo com que cada ser humano define o seu estar na vida. O trabalho de campo é o processo de procurar o conhecimento através de vários outros procedimentos, entre os quais está a observação participante. Se o trabalho de campo é historicamente necessário, a observação participante tem uma justificação lógica ligada à estruturação da experiência cultural pelos grupos sociais, Corno Lévi-Strauss (1958) nos lembra, enquanto os conquistadores da América discutiam na Península Ibérica se os indígenas tinham alma ou não — o que era fundamental para declarar a respetiva capacidade ou incapacidade para administrar as suas próprias terras — os indígenas debatiam se os invasores eram deuses ou homens — o que era fundamental para declarar se os serviriam ou se os matariam, Os primeiros discutiam a partir de consultas aos textos sagrados; os segundos, a partir da constatação da conservação ou do apodrecimento dos corpos dos invasores mortos. Ambos observavam, cada um dentro do seu conhecimento, A diferença da observação participante relativamente à investigação de campo consiste em naquela se fazer a consulta dentro das formas de constatar do indígena, deixando os textos para depois. E é disto que vou agora falar.

2. NECESSIDADE HISTÓRICA DA OBSERVAÇÃO PARTICIPANTE

Embora se tenha dito que é a tradição individualista anglo-saxónica que inaugura a prática do trabalho de campo com observação participante, que a escola culturalista americana veio a seguir e que só muito mais tarde os filósofos franceses da sociedade como sistema se debruçaram sobre o terrain, já antes os alemães lá tinham andado (I)• Quer um médico – etnógrafo, Adolf Bastien, tinha inquietamente recorrido e desordenadamente dado conta dos cinco continentes entre 1850 e 1905 (1869), quer Richard Thurnwald, na Melanésia, tinham feito estudos sistemáticos da vida dos selvagens de 1906 a 1909 e de 1913 a 1915 (1910); anteriormente ainda, pelos meados do século XIX, Lewis Morgan tinha morado com os Iroqueses, do que resultou o texto bem conhecido onde o evolucionismo sociológico procura materializar-se: Primitive So-ciety (1877). Mesmo Henri Junod, um pioneiro isolado pela falta de conhecimento da língua local, escreve um tratado comprido e detalhado sobre os Thonga de Moçambique (1912) reestudados, mais tarde, por José Fialho Feliciano, reestudo que o faz doutor em Antropologia Social e autor do livro Antropologia Económica dos Thonga do Sul de Moçambique, Arquivo Histórico de Moçambique-Estudos 12. No entanto, é bom dizer que todos eles não fazem mais do que ver nos povos estudados as suas próprias hipóteses de trabalho em ação. O melhor exemplo é o de Lewis Morgan, que faz transitar as estruturas parentais iroquesas para o território arcaico ao comparar situações históricas diferentes, tais como a Tribo Iroquesa, as Gentes Dakota, a Confederação Azteca, as Gens Gregas e Romanas, após morar com a etnia Iroquesa dos EUA em 1870; por outras palavras, é o talento especulativo aplicado ao relativismo cultural com o objetivo de estudar as próprias formas culturais do investigador e a sua evolução. Quer os estudos de terreno feitos nesta perspetiva — e é de notar as exclamações ao longo do texto de Junod acerca de como estes selvagens não parecem tão selvagens se for observada a sua estrutura de aliança matrimonial, embora quando comem não tenham maneiras —,quer os estudos sobre os Australianos, Maori, Massim, realizados a partir do gabinete de Durkheim (1893-1915), Freud (1913) e Mauss (1923), todos apontam para urna questão: como é que nós éramos quando não éramos o que hoje somos. A especulação evolucionista e positivista do século XIX tinha já produzido os maiores textos do método nas ciências sociais usando, como Marx (1844) e Engels (1884) e o abrangente paradigma freudiano, as tribos à distância, como resposta às especulações moralistas e etnocêntricas de Adam Smith (1776), que procurava substituir o Príncipe pelo Estado, e de John Stuart Mill (1861), que defendia a bondade dos homens nas escolhas individuais entre recursos, como base da riqueza. Uma procura dos elementos da racionalidade europeia feita através do inquérito à sua produção de bens e riqueza, e à de ideias, é a que Max Weber, 1905, sistematiza no seu paradigma de racionalidade religiosa, após o seu trabalho de campo sem observação participante entre os baüen alemães, de onde lhe ocorreu a ideia.

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1 ) A primeira expedição com objetivos de estudo de campo foi a Expedição Etnológica de Cambridge (U. K.) ao Estreito de Torres desde 1898 a 1899. Foi composta por A. C. Haddon, W. H. R. Rivers, C. G. Seligman e C. H. Myers. Posteriormente, vários destes cientistas desenvolveram observações noutros territórios, mediados por informantes: Rivers na Índia (1906) e na Melanésia (1914, a), mediado por A. M. Hocart (1915-1925); Seligman na Melanésia em 1904 e no Ceilão em 1907 (1911). Entretanto, A. R. Radcliffe-Brown, discípulo de Haddon e Rivcrs, estudava os ilhéus de Andaman (Mar da Bengala, S.E. da Ásia) entre 1906 e 1908, cuja monografia só foi publicada em 1922.

Sobre a Observação Participante

O que significa observação participante? Imagino que seja uma expressão muito repetida entre os antropólogos. E tenho a impressão de que ela seja muito importante para a antropologia, por se tratar de uma das suas marcas distintivas (Basham, 1978: 25). O seu significado parece claro. Todavia, tive o privilégio de ter um professor[1] que questionou essa clareza aparente. Pois, para ele, a

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