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O Poder das Instituições Médicas, a Episiotomia e o Machismo

Por:   •  8/5/2017  •  Trabalho acadêmico  •  3.740 Palavras (15 Páginas)  •  187 Visualizações

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O Poder das Instituições Médicas, a Episiotomia e o Machismo

“Se eu fosse mulher já teria, sei lá, pegado em armas, porque é muita violência...

Ela vai pra maternidade, ou lhe fazem um corte na barriga, desnecessário na maioria das vezes, ou no períneo. De todo jeito alguém vai atacá- la com uma faca.”

A. Atallah, Centro Cochrane do Brasil

O depoimento do Dr. Álvaro Nagib Atallah, diretor do Centro Cochrane do

Brasil descreve a violência a que é submetida a gestante brasileira, tanto em forma de

cesariana “obrigatória”, como na “cesariana vaginal”, como muitas chamam, pela

cicatriz que guardam. O uso rotineiro da prática é desaconselhado, mas mesmo com

todas as evidências contrárias, a episiotomia está incluída no pacote de assistência ao

parto do SUS, Sistema Único de Saúde, como parte do atendimento padrão. A pratica

também é amplamente utilizada nos pouquíssimos partos normais feitos na rede

particular.

Segundo o artigo “O corte por cima e o corte por baixo: o abuso de cesáreas e

episiotomias em São Paulo” elaborado pela médica e professora, Simone Diniz, e pela

professora adjunta do Departamento de Ciências Sociais da PUC-MG, Alessandra

Chacham; a prática da episiotomia vem sendo usada desde o começo do século XX

para facilitar, em tese, o nascimento do bebê. Desde meados da década de 1980, há

evidência suficiente para que seja banida da rotina e utilizada apenas em casos

necessários - em que haja evidência de sofrimento fetal ou materno - o que ocorre,

segundo a própria Organização Mundial de Saúde, entre 15% e 30% dos partos, ou

menos. No Brasil, a taxa de utilização em partos normais chegou a alcançar

proporções astronômicas em 1995/96, 94,2%. Uma última pesquisa, em 2014 indica

que a taxa caiu para 53,5%.

O corte desnecessário expõe as mulheres a maiores

riscos como: dor perineal, edema, maior risco de infecção, hematoma e dispareunia

(dor na relação sexual). A OMS recomenda que a taxa da utilização da prática não

exceda os 10%. Outros dados alarmantes no Brasil, que se incluem no mesmo

problema abordado neste trabalho, são a altíssima incidência de cesarianas – 88% na

rede privada e 46% na rede pública, segundo esses dados – e apenas 5% dos partos

sendo naturais. A episiotomia é usada muitas vezes até como método de coerção,

para as gestantes optem por cesariana. Em 1999, a prática foi classificada pelo

médico norte americano, Marsden Wagner, como “mutilação genital feminina”.

No artigo “O corte por cima e o corte por baixo” já citado, de acordo com um

relatório do Ministério da Saúde, em 2003, no Brasil, 96,5% dos nascimentos

aconteciam em hospitais. Essa mudança, em cem anos, do parto caseiro para o parto

hospitalar é muito importante de ser observada, pois seu aumento considerável

transformou hoje o parto hospitalar no que as autoras se referem como “linha

obstetrícia de montagem”. Principalmente em hospitais do Sistema Único de Saúde,

onde não existem leitos suficientes à disposição de grávidas em trabalho de parto, os

profissionais de saúde, para melhor aproveitamento de horário, induzem o parto via

hormônios, causando na maioria das vezes mais dores as parturientes, que acabam

optando por uma cesárea, mesmo que após a realização do parto cirúrgico a paciente

mantenha o leito ocupado por 72 horas e a episiotomia custe em torno de 134 milhões

de dólares anuais para a saúde, no Brasil.

Após as recomendações da OMS e outros órgãos, a incidência da episiotomia

tem caído ao redor do mundo, porém, na América Latina esse número distoa. No

Brasil, principalmente, esse altíssimo índice de práticas invasivas não pode ser visto

apenas como uma questão de saúde, não se pode deixar de incluir o problema como

questão racial e de classe social. Apenas 30% das mulheres brasileiras tem acesso a

hospitais privados e a planos de saúde - muitas vezes nem estas são respeitadas em

suas decisões, podendo apenas entrar com processos contra instituições ou profissionais após algum tipo de abuso obstétrico.

As outras 70%, em sua maioria negra, jovem e de classe com menor poder aquisitivo, sequer tem acesso à

informações importantes.

Liliane Gusmão, blogueira feminista, atribui essa violência à

desinformação e à postura passiva a que as mulheres são levadas a ter frente a

classe médica, detentora da informação, privando-as de seus direitos, de serem bem

tratadas e escutadas em seus desejos e escolhas em um momento tão vulnerável

como o parto. Como aponta sua pesquisa, a negra, pobre e jovem é aquela que mais

sofre de violência obstétrica.

Para que melhor possamos compreender essa relação

...

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