TrabalhosGratuitos.com - Trabalhos, Monografias, Artigos, Exames, Resumos de livros, Dissertações
Pesquisar

Resenha A Sociedade Contra o Estado Pierre Clastres

Por:   •  23/11/2018  •  Resenha  •  1.729 Palavras (7 Páginas)  •  474 Visualizações

Página 1 de 7

CLASTRES, Pierre.  A sociedade contra o Estado: investigações de antropologia política. Porto: Edições Afrontamento, 1975. p. 5-45.

 Os capítulos resenhados são Copérnico e os selvagens e Troca e poder: filosofia da chefia índia, respectivamente capítulos 1 e 2 do livro A sociedade contra o Estado de Pierre Clastres. Nestes capítulos o autor apresenta a ideia de que as sociedades índias não devem ser analisadas pela ausência de poder ou economia segundo os moldes das sociedades atuais, mas sim em seus próprios termos e faz uma filosofia política das sociedades tribais, através da chefia índia.

No capítulo Copérnico e os selvagens o autor discorre sobre que para criar uma unidade entre as tantas as sociedades arcaicas, seguindo as clássicas propostas da antropologia, elas são analisadas “sobre o maior ou menor grau quantidade de poder político que cada um entre elas oferece a observação, podendo esta quantidade tender para o zero.” (CLASTRES, 1975, p. 8) Para Clastres, assim como o caracterizar o que é arcaico pela ausência de escrita e pela economia de subsistência gera um juízo de valor, um preconceito, o mesmo acontece com o poder político nestas sociedades.

Ao passo que a cultura ocidental reduz o poder à relação de comando-obediência, sendo ela sua essência, “Se a redução não é possível, e porque nos encontramos aquém do politico: a ausência da relação comando-obediência acarreta ipsofacto a ausência do poder politico”. (CLASTRES, 1975, p.14) Segundo o autor, a causa disto seria o etnocentrismo, que não permite que as diferenças subsistam cada uma por si, é sempre preciso compará-las com algo familiar; este é um obstáculo que está sempre presente na investigação antropológica. Portanto para Clastres, “Decidir que certas culturas são desprovidas de poder político porque nada oferecem de comparável ao que a nossa apresenta não é uma proposta científica: antes denota, no fim de contas, uma pobreza evidente do conceito” (CLASTRES, 1975, p.15).

Como prova dessa “pobreza de conceito”, o autor salienta que, tirando algumas exceções, na América todas as sociedades índias são dirigidas por chefes, líderes que não possuem poder como o que é designado em outras sociedades, “onde o politico se determina como campo fora de toda a coerção e de toda a violência, fora de toda a subordinação hierárquica, onde, numa palavra, não se processa nenhuma relação de comando-obediência.” (CLASTRES, 1975, p.10).

Para Clastres, além do etnocentrismo, outro problema da antropologia é que existe em sua investigação um evolucionismo. De acordo com o autor, há uma “velha convicção ocidental” de que há uma continuidade entre as diferentes formas de poder, “[...] de que a história possui um sentido único, que as sociedades sem poder são a imagem do que já não somos e que a nossa cultura e para elas a imagem do que é necessário ser.” (CLASTRES, 1975, p. 16).

Entretanto, para o autor, todas as sociedades, arcaicas ou não, são políticas. Por isso, Clastres defende que não se pode dividir as sociedades em: com poder e sem poder; mas sim dividir o poder em dois modelos principais: poder coercivo e poder não coercivo. Portanto o poder coercivo é um modelo de poder, mas não é o verdadeiro, simplesmente é um caso particular presentes em certas culturas, como a ocidental. Outra questão levantada pelo autor é que mesmo nas sociedades em que a instituição política está ausente, o político está presente. Ao contrário das reflexões de Nietzsche citadas pelo autor no começo do texto, o poder político não é uma necessidade inerente a natureza humana; mas sim intrínseco a vida social. Deste modo, “Pode pensar-se o politico sem a violência, não se pode pensar o social sem o politico: noutros termos, não existem sociedades sem poder.” (CLASTRES, 1975, p.21).

Tanto a teoria de Marx, onde o poder político só existe onde há conflitos sociais, quanto à teoria de Durkheim, onde o poder político pressupunha uma a diferenciação social, não são satisfatoriamente explicativas, pois ambas as teorias não correspondem aos sistemas políticos de outras culturas. Por isso, para Clastres, é preciso existir no estudo das sociedades uma revolução copérnica. Para esta revolução seria necessário uma inversão completa das perspectivas, retirar a cultura ocidental do centro da análise; só assim se pode fazer um discurso adequado sobre as sociedades arcaicas, “adequado ao seu ser e não ao ser da nossa”; isso é o que parece demonstrar amplamente a antropologia política. Clastres cita como sendo o caminho dessa “conversão” a obra de Claude Lévi-Strauss, que foi “um pensamento do nosso tempo que soube tomar a sério o dos selvagens” (CLASTRES, 1975, p.24).

No capítulo Troca e poder: filosofia da chefia índia o autor propõe o exercício do que foi proposto no capítulo anterior, de libertar-se de uma visão etnocêntrica e evolucionista e analisar as sociedades índia em seus próprios termos. Para isso, o autor cita Lowie que ao analisar o chefe indígena, isolou três propriedades essenciais do líder índio, o que possibilita adotar como condição necessária do poder em algumas regiões da América do Sul. “1º - O chefe é um fazedor de paz; e a instância moderadora do grupo, tal como atesta a divisão frequente do poder em civil e militar. 2º - Tem de ser generoso como os seus bens, e não pode permitir-se sob pena de se desautorizar, repelir os incessantes pedidos dos seus administrados. 3º - Apenas um bom orador pode aceder à chefia.” (CLASTRES, 1975, p. 27) Além dos três traços essenciais da chefia referenciados por Lowie, em grande parte da área sul-americana, uma característica pode ser acrescentada: a poligamia. Quase sempre privilégio exclusivo do chefe, a poligamia está fortemente unida com a instituição política do poder.

Porém Clastres impõe uma distinção entre o primeiro destes critérios (fazedor da paz) e os outros três. Estes últimos revelam um conjunto de “prestações e contraprestações” pelas quais se mantém a estabilidade entre a estrutura social e a instituição política: o chefe exerce um direito sobre um grande número de mulheres do grupo; em compensação, o grupo está no seu direito de exigir do seu líder generosidade nos bens e talento oratório. Consequentemente, segundo o autor, não se pode pensar em uma ideia de troca das mulheres do grupo contra os bens e as palavras do chefe, deve-se examinar o movimento de cada sinal segundo o seu circuito próprio, o que leva a descobrir que nesse movimento há uma “dimensão negativa”, a vinculação que há entre eles serve justamente para negar uma relação de troca.

...

Baixar como (para membros premium)  txt (10.7 Kb)   pdf (110.9 Kb)   docx (14.1 Kb)  
Continuar por mais 6 páginas »
Disponível apenas no TrabalhosGratuitos.com