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Aristóteles: A ética Como Virtude

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Por:   •  12/5/2014  •  6.984 Palavras (28 Páginas)  •  885 Visualizações

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Aristóteles: ética da imanência

A justiça é a base da sociedade; sua aplicação assegura a ordem na comu¬nidade social, por ser o meio de deter¬minar o que é justo (Aristóteles).

A Ética e a Política de Aristóteles formam o primeiro grande tratado sobre o comportamento das pessoas e da so¬ciedade. Na Ética, Aristóteles escreveu algumas das mais be¬las páginas da história do pensamento; por exemplo, no últi¬mo livro da Ética concluiu que "o intelecto exerce uma ativi¬dade quase divina, é nossa melhor parte e nos aproxima dos deuses" (EN*, 10,7). Mas esta nobilíssima afirmação não é mais importante que esta outra: "o homem é um animal ca¬paz de pensar e de fazer política" (EN, 1,6); isto é, o homem é um ser no qual convivem as realidades biológica, sensitiva, intelectiva e divina. * A abreviatura EN refere-se à obra Ética a Nicômaco, de Aristóteles.

A tarefa primordial da ciência ética consiste em colocar certa harmonia, hierarquia e comando nesta complexi¬dade; tarefa muito difícil que só pode ser cumprida aproximativamente, pois desde o início Aristóteles adverte que as ciências da ética e da política analisam as condutas huma¬nas mutáveis por aproximação e não por definição como na metafísica que é a ciência das coisas imutáveis (EN, 1,5).

Nesta introdução, quero destacar quatro eixos em torno dos quais giram as duas obras de Aristóteles. Primeiro, a ética é natural: emerge da estrutura biológica do ser huma¬no tomado em sua individualidade e sociabilidade. Não é só o indivíduo que é produto da natureza, mas também a socie¬dade. Daí resulta que a melhor definição do homem é esta: "um animal racional e, ao mesmo tempo, um animal políti¬co" (EN, 1,7). Platão afirma claramente que a sociedade é um grande animal.

O segundo eixo flui do primeiro: a ética é finalista. To¬das as escolhas e decisões humanas visam alcançar um fim, produzir um bem e chegar a uma meta. É o que diz o primei¬ro parágrafo da ética: "Toda a arte e toda a investigação as¬sim como toda ação e todo propósito visam a algum bem; por isso foi dito acertadamente que o bem é aquilo que to¬das as coisas visam" (EN, 1,1).

O terceiro eixo é o coração da obra: a ética é racional. Como dissemos acima, a tarefa da ética está em harmonizar os impulsos biológicos, instintivos e sensitivos sob a orienta¬ção da razão, "nossa melhor parte" (EN, 10,7). Nossos impul¬sos biológicos espontâneos ganham qualidade ética quando subordinados ao comando da razão, como veremos adiante.

O quarto eixo afirma a heteronomia da ética. A ética vem de fora, vem da natureza; o homem não escolhe nem decide ser ético; ele nasce ético porque, sendo animal inteli¬gente, todos os seus atos são, de algum modo, deliberados, escolhidos e decididos racionalmente. Somos o único ani¬mal que, por natureza, decide seus atos tanto para p bem quanto para o mal. Mas, sendo biologicamente ético, não quer dizer que faça ações éticas automaticamente; as ações serão éticas quando decididas pela liberdade: "Nem por na¬tureza nem contrariamente à natureza a virtude moral é en¬gendrada em nós, mas a natureza nos dá a capacidade de re¬cebê-la e esta capacidade se aperfeiçoa com o hábito" (EN, 11,1). Então somos apenas potencialmente éticos por consti¬tuição natural, biológica.

Estes quatro eixos atravessaram os séculos sem contes¬tação. Em torno deles giraram quase todos os tratados de ética com apenas algumas variantes. Só na idade moderna foram criticados com argumentos convincentes; por exem¬plo, Kant ignorou a ética heterônoma e naturalista, biologista e propôs brilhantemente a ética autônoma, decidida pela razão. T. Hobbes, J. Locke e J.J. Rousseau colocaram as bases da política não mais na natureza humana, mas no contrato social: são os homens que, pela liberdade, decidem viver em sociedade e não nossa natureza biológica.

I - Contexto metafísico da ética

Na constelação das obras de Aristóteles, a ética faz parte do elenco das ciências práticas que, para ele, são hierarquica¬mente inferiores às ciências teóricas. Estas se referem ao co-nhecimento certo dos primeiros princípios das coisas e que não podem mudar; aquelas tratam das condutas e das metas que cada homem e a sociedade desejam alcançar e que sem¬pre podem mudar; é "a filosofia das coisas humanas", na bela expressão de Aristóteles. A ética comporta dois momentos convergentes: a ética da formação do homem virtuoso e de caráter e a política que trata do cidadão, da origem da sociedade e do seu governo.

Portanto, a ética encontra na política sua plena realização: ela forma o indivíduo para que se torne bom cidadão Diz Aristóteles: "É certo que o bem é desejável mesmo quan¬do diz respeito só a uma pessoa, porém é mais belo e mais divino quando se refere a um povo e às cidades" (EN, 1,2). Portanto, a política é a ciência arquitetônica que define "que ciências são necessárias na polis e quais cada um deva aprender e até que ponto" (EN, 1,2).

Mas "a filosofia das coisas humanas", como saber práti¬co, subordina-se ao saber teórico, à metafísica. Isto é, a ética e a política encontram sua raiz profunda na constituição ontológica do homem.

Os gregos entenderam o ser humano como produto da physis, como todos os outros seres naturais. Nele aparece a suprema manifestação da physis como logos e ethos (Lima Vaz, 1988: 11). Portanto, para Aristóteles, o homem é um animal que pensa e descreve a ordem dos seres naturais e entende a estrutura ontológica de cada um (logos); ele é também um animal ético-político (ethos), que só se realiza na convivência social (Pol., 1,1). Explicitemos o profundo conteúdo destas afirmações.

Segundo Aristóteles, o homem surge da physis graças à atuação de princípios e de causas; aqueles são: matéria e forma, ato e potência, essência e existência e substância e acidentes; e estas são quatro: material, formal, eficiente e fi¬nal (Fís., 11,7; Met., 1,3 e VIII, 4; Geração dos animais, 1,1). São princípios ou postulados dialéticos, pares opostos entre si e são a origem de todas as realidades sublunares.

Portanto, também o homem é um composto de matéria e forma. A matéria é o princípio "negativo", o caos e a desor¬dem, segundo Platão, e princípio de indeterminação e de in-definição, segundo Aristóteles. Enfim, a matéria é o pólo ne¬gativo das realidades, um "quase nada", segundo Agostinho.

Exatamente o contrário acontece na forma que é o prin¬cípio positivo da ordem, da determinação e da especifica¬ção;

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