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Filosofia AV2

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Por:   •  9/6/2014  •  2.654 Palavras (11 Páginas)  •  724 Visualizações

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A CRISE NO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO

INTRODUÇÃO

O presente trabalho analisa as características do Sistema Penitenciário Brasileiro, no qual é repleto de mazelas, analisando sob a visão de Ética Deontológica (Jeremy Bentham-1834), sobre as decisões dos indivíduos, entre o que é moralmente necessário e serve para nortear, e o que realmente deve ser feito. Os efeitos inerentes à natureza do cárcere aglutinam-se às deficiências estruturais dos estabelecimentos penais, à superlotação, à ociosidade e inúmeros outros, que constituem óbice à ressocialização do condenado. Procurou-se demonstrar quais são os efeitos reais, contrários à regeneração, que o sistema imprime no preso e quais as consequências para a sociedade como um todo. É tarefa impossível ressocializar alguém retirando-o do meio social, e jogando-o em meio a outros criminosos. As condições precárias em que é desenvolvida a pena no cárcere, configuram ofensa a um dos principais direitos do homem que não é atingido pela condenação, a dignidade da pessoa humana. A superlotação dos presídios impede a aplicação de um tratamento reeducativo eficiente ante a falta de estrutura para atendimento a todos, e dessa forma não se atende à individualização da pena. Portanto a pena privativa de liberdade não reeduca, não ressocializa e não propicia a reintegração do ex-condenado, além de não cumprir a função intimidativa, pois o que impera na comunidade criminosa é o sentimento de impunidade. E nesse sentido o ordenamento jurídico brasileiro tem progredido com a despenalização de várias infrações, permitindo que sejam as penas privativas de liberdade substituídas por restritivas de direito, que demonstram ser muito mais pedagógicas. Os resultados são a sensível redução dos índices de criminalidade e reincidência.

I. A INEFICIÊNCIA

A Lei de Execução Penal contém princípios e regras que se destinam a desenvolver um tratamento que proporcione a devida ressocialização do preso. A ressocialização do preso é consistente na modificação de seu comportamento, para que esse seja adequado aos parâmetros comuns e não nocivos à sociedade. Para que isso ocorra deve ocorrer primeiramente à modificação dos valores pessoais do sujeito, pois como pressuposto do comportamento humano, existem os valores. Por isso o processo de ressocialização deve estar voltado a reverter os valores negativos e nocivos em valores positivos e benéficos para a sociedade.

Para que seja alcançado o objetivo de ressocialização é fundamental que se busque a humanização dos valores pessoais do preso, e para isso o ambiente carcerário deve oferecer experiências que sejam propícias a essa tarefa.

O fracasso da prisão não se deve exclusivamente ao não cumprimento das normas de execução penal, ou seja, aglutinam-se outros fatores que são ínsitos à própria natureza da prisão.

Nesse entendimento afirma o insigne Evandro Lins e Silva (1991) apud César Barros Leal (2001, p. 65) que:

[...] é de conhecimento geral que a cadeia perverte, deforma, avilta e embrutece. É uma fábrica de reincidência, é uma universidade às avessas, onde se diploma o profissional do crime. A prisão, essa monstruosa opção, perpetua-se ante a impossibilidade da maioria como uma forma ancestral de castigo. Positivamente, jamais se viu alguém sair do cárcere melhor do que quando entrou.

Partindo do princípio da Ética Deontológica, o sistema carcerário respeitando a base do “Código de Ética” pessoa, tais espécies de penas que substituem as privativas de liberdade, com previsão no ordenamento jurídico brasileiro, representam o melhor remédio na busca da ressocialização, já que não retiram o condenado do seu meio social, oportunizando-lhe maiores chances de se ressocializar, além disso, não é onerosa para o Estado.

Se atentarmo-nos aos alarmantes índices de reincidência, percebemos a falácia que é a pena privativa de liberdade quanto à sua finalidade ressocializadora e reintegradora. Ao invés de reeducar o delinquente, o sistema prisional deprecia a personalidade do preso, reforçando seus valores negativos. As condições as quais o preso é submetido dentro do cárcere são fatores que aliados aos sentimentos de rejeição e indiferença da sociedade e do Estado são determinantes para que retorne ao crime. Marcado pelo estigma da prisão e desamparado pelas autoridades, permanece marginalizado no meio social, excluído das oportunidades de trabalho, e não tendo melhores opções volta a delinquir.

Em primeiro lugar, deve ser considerado que a prisão segrega, dissociando o preso da comunidade livre e ao mesmo tempo remete-o ao convívio com outros indivíduos anti-sociais. Assim, Antônio Garcia-Pablos de Molina (1979) apud Cezar Roberto Bitencourt (1993, p.143) afirma que:

“A pena não ressocializa, mas estigmatiza, que não limpa, mas macula como tantas vezes se tem lembrado aos expiacionistas; que é mais difícil ressocializar uma pessoa que sofreu uma pena do que outra que não teve essa amarga experiência; que a sociedade não pergunta por que uma pessoa esteve em estabelecimento penitenciário, mas tão somente se lá esteve ou não.”

Distante da comunidade não há como ser ressocializado, pois perde a capacidade de adquirir hábitos sociais comuns, permanecendo excluído mesmo após o cumprimento da pena.

II. A COMUNIDADE E O SEU PAPEL NA RESSOCIALIZAÇÃO DOS PRESOS

É cediço que o ex-preso fica marcado pelo estigma da pena, o que representa ínfimas possibilidades de reintegração social, ante o preconceito que impregna a sociedade.

O Estado, de forma clara, tem demonstrado a sua incapacidade em gerir por si só o sistema penitenciário. A exposição de motivos da Lei de Execução Penal, em seu item 24 expressa a necessidade da participação comunitária na busca da solução das questões que envolvem o sistema: “Nenhum programa destinado a enfrentar os problemas referentes ao delito, ao delinquente e à pena se completariam sem o indispensável e contínuo apoio comunitário”. Além disso, a Lei de Execução Pena, no seu artigo 4º, determina que: “O Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da pena e da medida de segurança.”.

Destaca-se uma iniciativa de origem não estatal destinada a obtenção de melhores resultados na busca de humanização e efetividade na ressocialização do preso.

Trata-se do método APAC (Associação de Proteção e Assistência aos Condenados), que teve início em 1974 no presídio de Humaitá com uma entidade jurídica composta por quinze membros, que evangelizavam e apoiavam moralmente os presos na época. Ficaram responsáveis pela administração do estabelecimento, e iniciaram um trabalho de recuperação por meio da valorização da pessoa humana, com vista à proteção da sociedade e promoção da justiça.

A associação dispensou os funcionários da penitenciária e passou a ministrar seu programa com o auxílio comunitário, sendo que o Estado ficou isento de qualquer ônus (arcando unicamente com alimentação, luz e água). O programa consistia na progressividade de regime, dessa forma o preso, que passa a ser denominado de recuperando, aos poucos lhe vai sendo concedido maior acesso à vida livre, até o dia em que teria apenas que se apresentar diariamente à prisão.

Na verdade o que a associação fez foi simplesmente colocar em prática aquilo que a lei preceitua, ou seja, individualizou o tratamento, ofereceu as devidas assistências que a lei determina (material, psicológica, médica, odontológica, jurídica e educacional), e fundamentou-se na religião como meio de propiciar as devidas alterações no preso afim de que volte a ser reintegrado na sociedade. Como forma de demonstrar seu progresso o preso deveria ajudar o companheiro de pena, sendo que foram aplicados os regimes no próprio estabelecimento de forma a não distanciar o preso de sua família no período de sua condenação, e com o acompanhamento de voluntários.

A APAC é um claro exemplo de que a o empenho da comunidade é de extrema importância para a ressocialização, diante do contexto em que se desenvolve a pena privativa de liberdade em nossas prisões. Ações bem planejadas e de boa vontade só tendem a oferecer bons resultados.

III. O PAPEL DAS PENAS ALTERNATIVAS COMO INSTRUMENTO DE MAIOR INEFICÁCIA NO CARÁTER REEDUCATIVO DA SANÇÃO PENAL

Situação de fato é a ineficiência do caráter regenerador da instituição prisional. As condições as quais os presos são submetidos no cárcere inviabilizam o tratamento reeducativo em função de ressocializar para futura reintegração em sociedade. Aliás, a prisão além de não desempenhar o papel de instituição de regeneração não consegue alcançar a intimidação.

A realidade é que a prisão não oferece um tratamento adequado ao preso e a construção e manutenção de estabelecimentos prisionais oneram de forma significativa os cofres públicos, recursos estes que seriam de maior proveito se aplicados em outros setores sociais como escolas, hospitais, centros comunitários etc. Ademais o convívio com toda a sorte de criminosos contumazes afetas substancialmente a personalidade daquele que originariamente seria passível de recuperação, transformando-o num criminoso em potencial. Além disso, a vida em cárcere é determinante para o surgimento das organizações criminosas.

Nesse cenário é que surge a busca por medidas alternativas à prisão que possam ser de maior proveito no aspecto ressocializador da pena.

A ONU, por meio da Proclamação Universal dos Direitos do Homem procurou o reconhecimento da dignidade da pessoa humana. A Resolução nº 16, elaborada no Sétimo Congresso das Nações Unidas para a Prevenção e Tratamento dos Delinquentes, deixa claro a necessidade de se reduzir o número de presos, e a substituição da prisão por medidas alternativas na busca da reinserção em sociedade. A Lei 7.209/84 introduziu no Código Penal Brasileiro as penas: “alternativas a privativa de liberdade, representando um grande avanço para o sistema penal, pois não pune indivíduos primários que cometeram delitos de diminuto dano social, não mancham a sua imagem perante a comunidade (estigmatização), além de possuir grande força preventiva, pois atinge o interesse econômico do condenado e o distancia temporariamente das atividades as quais se comportou inadequadamente de forma perigosa.”

Essa nova perspectiva no direcionamento das políticas criminais é de tamanha importância que a Exposição de motivos do Código Penal no capítulo denominado “Das Penas” item 26, declara:

“Uma política pública criminal orientada no sentido de proteger a sociedade terá de restringir a pena privativa de liberdade aos casos de reconhecida necessidade, como meio eficaz de impedir a ação criminógena cada vez maior do cárcere. Esta filosofia importa obviamente na busca de sanções outras para delinqüentes sem periculosidade ou autores de crimes menos graves. Não se trata de combater ou condenar a pena privativa de liberdade com resposta penal básica ao delito. Tal como no Brasil, a pena de prisão se encontra no âmago dos sistemas penais de todo o mundo. O que por ora se discute é a sua limitação aos casos de reconhecida necessidade.”

IV. DA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO A COMUNIDADE

Todas as modalidades de penas restritivas de direito aplicadas alternativamente em nosso sistema penal são importantíssimas, no entanto, por representar a prestação de serviços à comunidade a medida de melhor eficiência na contenção da reincidência, será enfatizada no presente trabalho.

A prestação de serviços a comunidade tem aplicação em inúmeros países como a Inglaterra, Luxemburgo, Holanda, Polônia, França, Portugal, Alemanha, Brasil, Argentina, Peru, Colômbia, etc. Segundo César Barros Leal as vantagens que a prestação de serviços à comunidade oferece são inúmeras, (2001, p.216):

[...] não causa estigma; evita impunidade; representa um ônus inexpressivo para o Estado; a sociedade a vê com bons olhos, até mesmo porque o trabalho é produtivo e reverte em seu benefício; reduz o déficit de vagas no sistema carcerário, afastando o condenado do ambiente nocivo da prisão, mantendo-o no seio da família e da comunidade; propicia ao prestador o exercício de um mister em que se acha habilitado; diminui, comprovadamente, os índices de reincidência; oferece chances de emprego (muitos permanecem no trabalho mesmo após o cumprimento da pena); e por fim, auxilia a instituição conveniada, que tem acesso a um serviço, por vezes especializado, sem nenhuma despesa.

A prestação de serviços à comunidade possui caráter eminentemente pedagógico, permitindo ao apenado refletir sobre sua conduta desviante. Não é segregativa, não mancha a imagem, não onera os cofres públicos, e em muitos casos, representa o primeiro contato com uma atividade laboral a ser realizada futuramente pelo sujeito, após o cumprimento de sua pena.

Essa modalidade de pena restritiva de direito foi inserida no ordenamento jurídico pela Lei 7.209/84 e 7.210/84, sendo elevada a categoria de norma constitucional pelo artigo 5º, XLVI, ao prevê-la como espécie de pena aplicável. O Juizado Especial Criminal (Lei 9099/95) autoriza sua aplicação ao ser realizada a transação (artigo 76, § 4º). O Código Penal esclarece em que consiste a pena de prestação de serviços à comunidade em seu artigo 46:

“A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas é aplicável às condenações superiores a 6 (seis) meses de privação de liberdade.

§1º A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas consiste

na atribuição de tarefas gratuitas ao condenado;

§2º A prestação de serviços à comunidade dar-se-á em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais.

§3º As tarefas a que se refere o par. 1º serão atribuídas conforme as aptidões do condenado, devendo ser cumpridas à razão de 1 (uma) hora de tarefa por dia de condenação, fixadas de modo a não prejudicar a jornada de trabalho.

§4º Se a pena substituída for superior a 1 (um) ano, é facultado ao condenado cumprir a pena substitutiva em menor tempo (art.55), nunca inferior à metade da pena privativa de liberdade fixada.”

Por ser uma das modalidades de pena restritiva de direito, devem ser atendidos os requisitos do artigo 44, do Código Penal para a substituição da privativa de liberdade, quais sejam: a primariedade do réu em crime doloso; condenação à pena privativa de liberdade não superior a quatro anos, desde que o crime não seja cometido com violência ou grave ameaça a pessoa; se o crime cometido for de natureza culposa independe a quantidade da pena privativa de liberdade que foi imposta; e o juiz considerar que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias em que o fato ocorreu, indicam que a substituição se faz suficiente.

CONCLUSÃO

É evidente que a pena privativa de liberdade encontra-se em crise, o sistema prisional sucumbiu, pois não é capaz de cumprir a sua principal função, que seria a regeneração do condenado para torná-lo apto ao convívio em sociedade livre.

A prisão tem se mostrado antagônica em seu caráter ressocializador, atuando como instrumento de potencialização de criminosos, o que robustece significativamente os índices de criminalidade e reincidência fora dos muros da penitenciária.

As causas dessa lamentável situação são várias, sendo as mais graves a superlotação do sistema, a ociosidade, a falta de atividades educacionais e oferecimento de trabalho ao condenado, as péssimas condições de salubridade a que os presos são submetidos, o que propicia o surgimento de várias doenças, a promiscuidade, a corrupção e despreparo dos profissionais envolvidos no tratamento penitenciário.

Podem ainda ser citados outros fatores que não condizem com o escopo reeducador da pena, como a prisionização, fenômeno psicológico inerente à prisão, que imprime no condenado a cultura do cárcere, dessocializando-o, e ao término de sua pena será jogado na sociedade, podemos concluir que dificilmente irá se readaptar a ela. Somam-se o estigma da pena, o preconceito social e o desamparo estatal, e dessa forma o egresso não consegue reintegrar-se no meio livre, sendo inevitável o seu retorno ao crime.

A Lei de Execuções Penais, não obstante ser considerada uma das mais a vançadas do mundo, não é colocada em prática, este fato é devido à falta de direcionamento dos devidos recursos à execução penal.

É nesse contexto que surgem como solução, ou pelo menos, como forma de atenuar o problema as penas alternativas em substituição à pena privativa de liberdade, essa sendo cabível apenas aos crimes de maior gravidade, por se apresentar como medida ineficaz em termos de reeducar o delinquente.

BIBLIOGRAFIA

ADORNO, Sérgio. Sistema penitenciário no Brasil – problemas e desafios. São Paulo: Revista USP, março-abril-maio, 1991.

ALBERGARIA, Jason. Manual de Direito Penitenciário. Rio de Janeiro: Editora Aide, 1993.

ARAÚJO JÚNIOR, João Marcelo. A privatização dos presídios. São Paulo: Editora RT, 1995.

AUTOR DESCONHECIDO, Estatuto do CPP, http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2006/05/353333.shtml - 15/05/2006 às 18h17min . (data de acesso 27/10/08)

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