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História Pós-política

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Por:   •  31/8/2014  •  Tese  •  2.348 Palavras (10 Páginas)  •  230 Visualizações

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Aprendi nesses anos de Revista de História que é (quase) impossível escrever sobre política (ou de um tema relativamente delicado) sem que sejamos imediatamente acusados de reaças tucanos ou petralhas comunistas. Faz parte desse universo interativo castigar autores com comentários agressivos que muitas vezes acreditam estar desvendando a intenção obscura do texto. Como se não bastasse a crença juvenil de que discordar, por definição, é sinônimo de inteligência, ainda acham que toda gama de posicionamentos ou opiniões esteja restrita a dois campos simbólicos opostos.

É verdade que a grande maioria dos comentários raivosos vem daquela categoria especial de leitor: os que não passam do subtítulo. Ainda assim, essa hostilidade testemunhada em nossas páginas é apenas um dos sintomas de uma espécie de alergia ao debate franco. Algo que tem feito da esfera pública no Brasil um espaço cada vez mais subordinado ao enfrentamento bipolar entre dois extremos formalmente associados aos dois principais partidos do país. Como se toda e qualquer posição fosse, obrigatoriamente, a favor de um ou do outro. Se menciono gastos exagerados dos grandes eventos no país, a Revista é imediatamente acusada de estar infiltrada por interesses de oposição ao governo. Por outro lado, não foram poucas as vezes que, pela associação do nome de uma instituição pública, também fomos acusados de participar de algum aparelhamento político-partidário.

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De qualquer forma, importa menos o fato de alguns de nossos leitores ainda estarem indecisos quanto ao que nos acusar. O mais relevante (pelo menos pra mim) é essa ilusão de que temos que escolher entre dois lados claramente definidos em um campo de batalha que só pode ser descrito como lamentável. Digo lamentável porque – e isso não é grande novidade – ambos os lados da "crítica" se irmanam numa grande monocultura ideológica. Afinal, o grande resultado dessa picuinha tem sido a permanência dos dois partidos como grandes protagonistas no cenário eleitoral.

Antes que alguém resolva ter um surto de criatividade e me acuse de estar defendendo uma terceira força, alguma espécie de caminho do meio, quero deixar claro que o ponto aqui é outro: o significado sobre o que é fazer política hoje. A questão é imensa, mas talvez seja relevante colocar em evidencia essa dicotomia supostamente entre direita e esquerda, entre PSDB e PT, tendo como pano de fundo a imperícia de ambos em lidar com protestos e movimentos sociais.

A ambiguidade de protestar

Poderíamos listar sem muita dificuldade os principais pontos em comum entre os dois polos. Pontos, que na sua grande maioria, incluiriam quase todos os demais partidos. Gostaria de chamar atenção para um em particular. Algo que ficou explícito depois da grande onda de protestos de 2013: a ideia de que a mudança política desejada pelo país deve se manifestar sempre e exclusivamente nas urnas. Somos uma sociedade democrática, com imprensa livre e eleições diretas. Portanto, dizem alguns, se alguém deseja que as coisas mudem de figura, que aprendam a votar de forma consciente.

Esse tipo de afirmação se encaixa maravilhosamente bem em comerciais do TSE e em certos discursos vazios sobre o exercício pleno da cidadania. Infelizmente, diz muito pouco sobre o próprio sentido do que seria esse voto consciente. Trata-se de pesquisar sobre o passado sujo do seu candidato? Escolher aquele que melhor defende seu bairro, cidade ou profissão? Optar pelo velho conceito de vontade geral, tal como dizia Rousseau, isso é, aquele que você julga representar melhor o interesse coletivo? (E quem determina que interesse é esse?) De qualquer forma, quando os protestos começaram a minguar e os políticos puderam, finalmente, parar de dar explicações ou acenar bandeiras fajutas de reforma política, imprensa, partidos e, claro, boa parte da nossa população politicamente-muito-consciente se juntaram em coro pregando a primazia das urnas.

A grande imprensa, sempre ambígua, ficou entre a tentação de explorar o fenômeno e o medo de pôr em risco seus compromissos particulares. Um jornal importante de São Paulo, por exemplo, só levou a sério os protestos depois que uma de suas repórteres foi ferida no olho, como muitos outros anônimos. Daí pra frente os ânimos se exaltaram e ficou difícil esconder a reação desproporcional das polícias. Foi quando jornais e canais de televisão, ainda que desconfiados, encararam o fato como inédito e começaram a produzir manchetes e discursos celebrando as manifestações como comprovação da nossa imensa capacidade de mobilização. Até certo ponto. Ou melhor, até que, num alívio coletivo contra violência do seu dia adia, a multidão desordenada se voltou contra alvos simbólicos. O maior deles, a Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, foi cercada e alvejada com coquetéis molotov.

"Em vez de de conduzir um debate público sobre a falta de representatividade, reforma politica, serviços públicos precários ou a absurda desigualdade social, coube aos formadores de opinião o papel de transformar manifestantes em vândalos profissionais".

Infelizmente, isso faz parte de insurreições urbanas. Em lugares onde esse tipo de fenômeno acontece com uma frequência significativamente maior do que no Brasil (o que não é muito difícil), cria-se um debate público em busca de soluções coletivas mais complexas do que simplesmente mandar a polícia descer o pau. Foi assim em Londres, em 2011, e Paris, em 2005. Na capital inglesa, um quarteirão inteiro foi destruído. Na francesa, 9.000 carros foram apedrejados e entre 20 e 40 veículos eram incendiados a cada noite de protesto. Em ambos os casos, de um modo geral, imprensa e sociedade civil, ainda que resistentes à violência urbana, partiram para uma discussão que incluía as razões de um descontentamento crescente das populações residentes nas regiões onde isso ocorrera. Por aqui, bastaram algumas vitrines de banco quebradas para que o discurso da ordem e da nossa falsa tradição pacifista invertessem o jogo.

Esqueçam essa distribuição de renda obscena, o cartel do transporte público, a estrutura política obsoleta, a violência policial. Quem não

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