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Literatura De Cordel

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Por:   •  11/4/2013  •  2.072 Palavras (9 Páginas)  •  1.221 Visualizações

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Uma classificação exata é um dos primeiros passos da descrição científica. Da exatidão da classificação depende a exatidão do estudo ulterior. Todavia, posto que a classificação tenha o seu lugar na base de todo estudo, ela própria deve ser o resultado de um exame preliminar aprofundado. Ora, é justamente o inverso que podemos observar: a maioria dos pesquisadores começa pela classificação, introduzindo-a de fora no corpus quando, de fato, deveriam deduzi-la a partir deste."

Logo em seguida, submete as diferentes propostas de classificação por temas ou assuntos a uma crítica simultaneamente severa e esclarecedora, onde fica ressaltado, por um lado, que o princípio de permutabilidade - segundo o qual partes constitutivas de uma história podem ser transpostas para outras histórias - constitui uma das características das narrativas populares; e que, por outro lado, nenhum princípio rigoroso preside à escolha dos elementos dominantes de uma história que permita a sua classificação num ciclo temático. Além disso, o assunto ou tema não constitui uma unidade elementar, mas um complexo; ele não é constante, mas variável; e tomá-lo como ponto de partida no estudo das narrativas populares é praticamente impossível. Assim, levando em conta esses aspectos ou princípios básicos, força é reconhecer que tais classificações, tão caras à nossa tradição letrada quando se trata de aplicá-las às manifestações da cultura popular, sempre alteram a natureza do material estudado.

A historiadora francesa, Geneviève Bollème, que dedicou vários anos de pesquisa ao exame do acervo da littérature de colportage (literatura popular em livretos, mui semelhante à nossa sob certos aspectos) - a conhecida Bibliothèque Bleue de Troyes - , numa de suas obras sobre o assunto, observa que a classificação por temas, variando segundo os autores, «vai de treze a vinte e seis gêneros!»; e propõe sua própria tipologia por ordem de importância das categorias:

(I) assuntos religiosos;

(II) histórias romanceadas;

(III) "atualidades"; e

(IV) facécias.

Além disso, ela sublinha o fato que essa classificação só é válida para o fundo disponível em meados do século XVIII, e que, analisado esse material noutros períodos, as variações são evidentes. Conclui dizendo que tal ordenamento temático foi por ela tentado inúmeras vezes, porém lhe pareceu necessário a ele renunciar.

Ora, se - conforme termina afirmando a historiadora - esse tipo de classificação é praticamente impossível no caso dessa literatura constituída por um corpus mais ou menos fixo e cuja produção estancou historica- mente há mais de um século, que dizer então de nossa Literatura de Cordel, que mantém ainda certo alento e transformação pelo menos nalguns poucos focos criativos? Além do mais, todas as classificações temáticas tentadas para a nossa Literatura de Cordel jamais chegaram a abarcar seu corpus inteiro, mas apenas o acervo que cada autor logrou coletar ou examinar, não indo em geral além de algumas centenas de folhetos; o que, reconheçamos, é muito pouco face às exigências da tarefa e constitui assim muito mais um viés introduzido pelas preferências do pesquisador. Mesmo se conseguíssemos juntar todas as coleções disponíveis, o fundo assim constituído não passaria de uma simples parcela de seu corpus total. Entretanto, não reside nessa dificuldade a questão fundamental.

Em excelente artigo sobre nossa Literatura de Cordel, Paul Zumtor, conhecido especialista em poética medieval, acredita poder reduzir todas as classificações propostas até o presente a um esquema geral que comporta dois grandes conjuntos temáticos:

"as diversas classificações que têm sido propostas, dessa literatura, distinguem nela essencialmente dois grupos de textos: um, com dominante ética, cujas narrativas têm por finalidade declarada expor graças e desgraças, méritos ou deméritos, desta ou daquela personagem típica, ou de uma categoria social, por vezes de uma região ou de certa cidade; o outro, com dominante heróica, narra as aventuras de indivíduos históricos ou legendários (do Presidente Kubitschek ao Boi Misterioso) com cujo destino o conjunto dos leitores ou ouvintes é virtualmente convidado a identificar-se."

Mas, como é fácil de verificar, trata-se de evidente simplificação - cujas subdivisões apontadas pelo autor revelam já a sua pouca pertinência - dos variados caminhos percorridos pelo imaginário popular nessa particular forma de expressão simbólica, simplificação que não faz avançar em quase nada o nosso conhecimento da matéria. E tudo retorna ao questionamento inicial.

* * *

Portanto, é chegado o momento de indagar: que é de fato que caracteriza tais classificações?

Todas elas pretendem propor um esboço de análise temática da Literatura de Cordel, e supõem, com alguma "inocência", que os temas identificados se dão por si mesmos. E o que é mais estranho: todos eles se inserem em "ciclos"! Ora, que está subentendido na afirmação da existência de "ciclos temáticos" tais como: maravilhoso, fantástico, heróico, demônio logrado, amor e fidelidade, etc.? Certamente, eles definem muito menos o conteúdo dessa literatura popular do que o olhar que sobre ela esparrama o erudito. Por outro lado, quase todas essas classificações utilizam, explícita ou implicitamente, o conceito de ciclo de uma maneira que me parece pouco adequada. Na verdade, esse conceito define melhor uma série de obras, de uma época, de uma ou mais literaturas, girando em torno de um mesmo tema ou personagem, o que constitui assim a sua legenda. Além disso, ele tem sido utilizado de preferência para caracterizar especificamente a novelística medieval (e mais particularmente ainda as novelas de cavalaria), em seus três ciclos fundamentais: o bretão ou arturiano, o carolíngio e o clássico. Usá-lo, porém, para boa parte dos produtos da Literatura de Cordel é evidentemente uma incongruência, pois assuntos como os que vêm narrados, por exemplo, em folhetos chamados «de circunstância, de acontecido ou de época», por definição, não circunscrevem um tema único ou central.

Finalmente, atravessa todas essas classificações certa dose de a-historicidade, já que pressupõem a Literatura de Cordel como corpus acabado e fixo; portanto, sem uma seqüência temporal significativa decorrente de mutações socioculturais abrangentes

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