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Adolescência

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Por:   •  31/3/2014  •  Seminário  •  2.059 Palavras (9 Páginas)  •  219 Visualizações

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1.9 Adolescência

A Adolescência é um fenômeno composto de elementos biológicos e culturais. A forma como lidamos com ela também pode nos acrescentar elementos para refletir sobre a cultura contemporânea.

Em culturas pré-modernas não há propriamente uma experiência de adolescência, mas rituais de passagem entre a infância e a vida adulta. Aliás, é muito comum que estes rituais contenham atos violentos, nos quais o corpo ganha uma marca ou cicatriz. O sentido geral destes rituais é o da submissão do indivíduo à ordem social e suas leis. Na nossa cultura, desapareceram definições e rituais claros de entrada na vida adulta e também não se admite mais- oficialmente- o uso da violência; mas há quem considere que os trotes sádicos de entrada em faculdade ou o uso de piercings ou tatuagens como forma de aderir a uma “tribo” remetam àquelas práticas antigas.

O adolescente é alguém: a) que teve tempo de assimilar os valores da comunidade (no nosso caso, sucesso financeiro, amoroso, etc.; b) cujo corpo atingiu a maturação corporal (biológica) para realizar tais valores; c) a quem, justamente neste momento, a cultura pede que espere, não o reconhecendo como adulto e capaz de adquirir a autonomia tão valorizada por todos. Trata-se da exigência de uma moratória.

Considere-se a seguinte combinação: um corpo que se transforma rapidamente e gera um turbilhão de excitações; a falta de um lugar claro na cultura, na medida em que não se é nem criança nem adulto; a impossibilidade de se ter sua voz ou autonomia reconhecidas. Não dá outra: a adolescência é um convite à transgressão, como já observado numa passagem anterior deste capítulo.

Neste campo, entra também a discussão sobre o uso de drogas, em busca de prazer imediato e do sentimento de desafio à lei. Sobre esta questão tão discutida, tendo a concordar com a corrente que busca atacar o tráfico e a absurda oferta de drogas em torno de todo ambiente freqüentado por adolescentes; mas penso que demonizar o usuário, expondo-o e reprimindo-o pesadamente reafirma a atitude transgressora, reforçando o uso. Como sabemos, felizmente a enorme maior parte dos usuários eventuais de droga na adolescência abandona seu uso e não se torna viciada.

Acrescente-se agora o barulho. Faz parte da representação do adolescente que ele ouça música em volume alto ou use fones de ouvido; ele obriga os outros a o ouvirem ou se alheia do mundo a sua volta.

Como não consegue reconhecimento social como sujeito autônomo, é muito comum que o adolescente forme “micro sociedades”. Ele busca um grupo de referência, do time esportivo à gangue: neste, ele busca ter seu lugar e ser tratado como igual. Estes grupos proporcionam identidade e sentido de potência: em grupo, é necessário mostrar poder e enfrentar outros grupos e a própria lei da cultura. Faz parte da formação de qualquer grupo identitário a intolerância com relação a quem não é do grupo e mesmo a eleição de um grupo rival, objeto de ataques e desqualificação. Assim, sabe-se que grupos de adolescentes são mais suscetíveis a atos violentos, acidentes de carro por imprudência, etc. A idéia é “fazer grupo para fazer besteira”.

A formação destes grupos sofre uma reação da cultura, que vê neles uma ameaça à sua autoridade. Mas, uma vez mais, estes grupos cumprem o papel de suprir a necessidade de reconhecimento enquanto ele não se dá no universo adulto.

Do lado da nossa cultura, as coisas também se complicam, já que os ideais modernos justamente apontam para o individualismo, liberdade e autonomia. A cultura como um todo e, muito em especial o adolescente, despreza a tradição e valoriza o novo, pelo simples fato de ser novo. Até por isto, considera-se que o adolescente é uma figura típica da Modernidade. O impasse é sério, já que o convívio exige a aderência a regras e rotinas. Mas todo herói, para realizar seus feitos, em determinado momento deve sair das regras e se impor individualmente. Isto caminha até a valorização do fora-da-lei (o outsider), aquele que não se submete à ordem.

Na perspectiva da cultura do narcisismo, também se observa que muitos pais têm se recusado a exercer suas funções de introduzir as crianças nas normas de convívio social. Em outras palavras, como dissemos acima, está mais difícil dizer não e frustrar os filhos em sua vontade de tudo ao mesmo tempo agora. Num movimento progressivo desde a segunda guerra até o fim do golpe militar no Brasil, dizer não e reprimir são coisas feias. Os pais têm medo de perder o amor dos filhos, mais ou menos como um professor pode ter medo de ser mal avaliado pelos alunos. Os pais esperam que os profissionais especialistas que ele pode contratar exerçam suas funções: da babá ao médico, o psicólogo, o professor, etc. Lembro do caso de uma mãe que ligava dias seguidos para a secretaria da ESPM para saber se o filho estava na sala de aula, dizendo que garantir isto era responsabilidade da faculdade.

O resultado disto é uma geração que; ou se torna bem mais careta do que a anterior, buscando referências e limites estáveis na cultura; ou carece de valores mínimos de convívio e tolerância. O sentimento de onipotência destes últimos é extremamente problemático: o limite patológico é dos rapazes de Brasília que queimaram um índio achando que ele era apenas um mendigo...; em doses mais ambulatoriais, estes são nossos alunos folgados, que surgem do nada na última semana de aula se sentindo injustiçados pela reprovação. Eles realmente esperam que assumamos a responsabilidade sobre suas vidas. Definitivamente, é preciso não entrar neste jogo.

O adulto idealiza o adolescente. Ele pode achar isto uma piada por sua própria experiência, mas vê que o adulto desejaria ser como ele. O adulto pode invejar a liberdade do adolescente e esperar dele justamente isto, que a exerça sob a forma de revolta. A cobrança crescente e cada vez mais precoce gera uma grande insegurança e medo de entrar no mundo adulto.

Desta perspectiva, a entrada no mundo adulto - identificada com o ingresso no campo de trabalho - é representado como a perda da liberdade. É idealizado um abismo entre os dois mundos e o sentimento é de despreparo. Uma vez mais, já não bastava isto e se acrescenta o discurso paranóico corrente sobre a concorrência e a urgência de em achar um lugar para si. No PAPO , por exemplo, recebo muitos alunos que criam estratégias de adiamento (quando a moratória é declarada pelo próprio sujeito: “dps”, viagens de intercâmbio, transferência para outros cursos, etc.) e um achatamento de preocupações típicas de formandos:

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