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NÃO SE APRENDE SEM ESTUDAR

Tese: NÃO SE APRENDE SEM ESTUDAR. Pesquise 860.000+ trabalhos acadêmicos

Por:   •  13/10/2013  •  Tese  •  5.159 Palavras (21 Páginas)  •  376 Visualizações

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“ESTUDAR NÃO É TER AULAS”

Estudar

Por Pedro Demo

O estudo bem feito sempre resulta em autoria, o que retira do interesse procedimentos de cópia, transmissão, aquisição. Estudar bem não combina com receber conteúdos simplificados, abreviados, resumidos, via aula, de tal sorte que a tarefa que ainda resta para o aluno seria copiar e reproduzir. Em suma, nem escola, nem universidade descobriram propriamente o que é estudar.

Meu objetivo é questionar a maneira como, em geral, se estuda entre nós, sem pesquisa, sem elaboração, sem leitura sistemática, sem desconstrução e reconstrução. Na escola e na universidade, estudar é o que menos se faz, gastando-se o tempo inteiro com aulas e provas. Não que estas não caibam, mas são eventos supletivos, como regra apenas reprodutivos.

Entendo por estudar a dedicação sistemática à reconstrução do conhecimento, na condição de sujeito capaz de interpretar com autonomia, desconstruindo e reconstruindo. O estudo bem feito sempre resulta em autoria, o que retira do interesse procedimentos de cópia, transmissão, aquisição. Estudar bem não combina com receber conteúdos simplificados, abreviados, resumidos, via aula, de tal sorte que a tarefa que ainda resta para o aluno seria copiar e reproduzir. Em suma, nem escola, nem universidade descobriram propriamente o que é estudar.

Em sociedades que prezam mais o conhecimento como fundamento imprescindível da autonomia do indivíduo e da sociedade, bem como da economia (Gorz, 2005), estudar vincula-se bem menos a procedimentos instrucionistas, realçando-se tendencialmente a dedicação reconstrutiva sistemática. Sabemos que os professores não gostam de estudar (Unesco, 2004), não porque não saberiam apreciar o estudo, mas por conta de uma história longa contrária a este tipo de trabalho intelectual: foram formados em instituições instrucionistas, muito distanciadas da pesquisa e da elaboração própria; conviveram com professores que não estudavam, apenas davam aula; foram avaliados sempre pela prova reprodutiva; e agora possuem um diploma, que, supostamente, os dispensaria de estudar, já que estudar é coisa de aluno! Invariavelmente, quando os professores recebem horas de estudo na semana, dificilmente as aproveitam para estudar, em parte porque, assoberbados com afazeres, precisam do tempo para outras coisas, em parte porque nunca aprenderam a estudar, em parte porque consideram estudo qualquer coisa.

1. NÃO SE APRENDE SEM ESTUDAR

Entre nós, aprender coincide com ter aula, e assim está exarado na LDB, quando se estatuíram os 200 dias letivos. Confundiu-se, toscamente, aula com aprendizagem, reproduzindo um dos estereótipos mais fúteis em nossa sociedade, não só no professor, mas igualmente nos pais: estes medem a aprendizagem de seus filhos pelas aulas e se irritam quando, por qualquer razão, não há aula. Estamos agora introduzindo o nono ano no ensino fundamental, sob a mesma alegação: se os alunos tiverem mais aulas, vão aprender mais. Pode não ocorrer e isto insinuam dados do Saeb (2004), surpreendente e ironicamente (Demo, 2004), como se observa na Tabela 1.

Anos 1995 1997 1999 2001 2003

4a série EF 188,3 186,5 170,7 165,1 169,4

Língua Portuguesa 8a série EF 256,1 250,0 232,9 235,2 232,0

3a série EM 290,0 283,9 266,6 262,3 266,7

4a série EF 190,6 190,8 181,0 176,3 177,1

Matemática 8a série EF 253,2 250,0 246,4 243,4 245,0

3a série EM 281,9 288,7 280,3 276,7 278,7

Tabela 1. Média de desempenho em Língua Portuguesa e Matemática - SAEB Brasil - 1995-2003. (Fonte: Saeb, 2004. EF = Ensino Fundamental; EM = Ensino Médio.)

Esta série histórica de cinco pontos no tempo sugere que o rendimento escolar está decaindo desde 1995, tendo ocorrido uma recuperação tímida e ambígua em 2003. De todos os modos, as cifras de 2003 continuam muito abaixo daquelas de 1995. Em 1997 foram introduzidos os 200 dias letivos e no lapso entre 1997 e 1999 nota-se a maior queda, em especial com referência à língua portuguesa: na 4ª série, a queda foi de 15,8 pontos, na 8ª série de 17,1 pontos e na 3ª série do ensino médio de 17,3; em matemática a queda foi bem menor: de 9,8 pontos na 4ª série, de 3,6 pontos na 8ª série e de 8,4 pontos na 3ª série do ensino médio. Embora não se possa atribuir esta queda ao aumento de aulas pura e simplesmente, porque pode ter ocorrido por outros fatores também, é no mínimo curioso que a introdução dos 200 dias letivos não acarretou qualquer efeito benéfico à aprendizagem. A mensagem mais insinuante da Tabela é que, continuando a fazer o que fazemos hoje na sala de aula, vamos ladeira abaixo. Estudar não é ter aula.

Esta mesma insinuação se apresenta, quando consideramos os estágios de desempenho para 2003, conforme a Tabela 2. Rendimento “adequado” é da ordem da exceção, tão diminutas são as respectivas cifras, sem falar na mais baixa: apenas 3% dos alunos brasileiros teriam tido desempenho adequado em matemática na 8ª série.

Estágios Muito crítico Crítico Intermediário Adequado

4ª série EF – L. Port. 18,7 36,7 39,7 4,8

4ª série EF – Matem. 11,5 40,1 41,9 6,4

8ª série EF – L. Port. 4,8 22,0 63,8 9,3

8ª série EF – Matem. 7,3 49,8 39,7 3,3

3ª série EM – L. Port. 3,9 34,7 55,2 6,2

3ª série EM – Matem. 6,5 62,3 24,3 6,9

Tabela 2. Proporção de estudantes em estágios de construção de competências em língua portuguesa e matemática – Brasil – 2003. (Fonte: Saeb, 2004. EF = Ensino Fundamental; EM = Ensino Médio)

Por volta de 20% dos alunos estavam na 4ª série em língua portuguesa e não sabiam quase nada (estágio

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