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O ENSAIO SOBRE DISCURSO CAPITALISTA E VIOLÊNCIA

Por:   •  26/5/2021  •  Ensaio  •  1.456 Palavras (6 Páginas)  •  102 Visualizações

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ENSAIO SOBRE DISCURSO CAPITALISTA E VIOLÊNCIA: Ônibus 184 e Psicanálise

 

O fenômeno da violência é característico no reino animal e pode ser observado desde as espécies mais primitivas até as que possuem habilidades racionais e cognitivas mais complexas, como é o caso dos seres humanos. No entanto, no que se refere aos demais animais, entendemos que não há sadismo em suas ações violentas visto que os mesmos, de modo instintivo, matam para comer, diferente do homem que tem a dimensão do sadismo presente (JÚNIOR; BESSET, 2010). Em linhas gerais, a prática sadista pode ser compreendida como prazer ou satisfação com a dor alheia. Todavia, para entender os aspectos da violência e, especificamente, da violência urbana, precisamos analisar essa temática também de um ponto de vista antropológico e sociológico e, além disso, temos como objetivo compreender de que forma o capitalismo se incorpora e contribui como elemento que se relaciona com esse fenômeno.

Júnior e Besset (2010) apresentam uma definição de violência a partir do “exercício de poder ou de uma força sobre o outro, contra sua vontade e sem seu consentimento”. No Brasil, esse é um assunto recorrente e sempre está estampado nos jornais ou em manchetes dos noticiários e mídias sensacionalistas. De acordo com o relatório, publicado em 2019, do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (2019), o Brasil foi apontado, em 2017, como o segundo país mais violento da América do Sul e essa classificação usou como referência as informações sobre as taxas de homicídio no país.  

Para além das notícias e dos dados estatísticos, é interessante buscar saber como se dá a construção dessa violência e entender quais elementos estão por trás desse fenômeno. No ano de 2002 foi lançado o documentário brasileiro chamado Ônibus 174, dirigido por José Padilha e nessa película é possível enxergarmos os fatores que permeiam a violência urbana. O documentário nos faz a exposição de uma realidade bruta, rompendo com a ficção simbólica que dá um sentido humano para nossos atos. O que poderia ser “apenas” um assalto, se torna a exposição da história de vida de alguém que sofreu inúmeras violências. O fenômeno da violência urbana é mostrado além do que está explícito, da ação do assalto e sequestro em si, mas de toda uma história de um rapaz permeada por muita crueldade. As situações vivenciadas por Mancha fazem parte, e são foco principal, do contexto que o leva até aquele momento de revolta exposta. A vida de Sandro é permeada por inúmeras violências, racismo, desigualdade social, pobreza, miséria, assassinato, dentre outros. Isso se mostra em articulação com a subjetividade dessa época, onde, tem se exposto cada vez mais a satisfação pulsional da sociedade com os atos violentos, onde eles anseiam pelo gozo da espetacularização, da exposição e naturalização da violência. Toda essa especulação cinematográfica é uma exposição do que Bispo ([201-]), chama de gozo obsceno, onde as pessoas desejam vislumbrar todo o processo violento que era exposto nas imagens do assalto e que ansiavam por um resultado ainda mais violento, a morte de Sandro.

Na atualidade, a violência é alimentada por um discurso capitalista e racista. O sistema capitalista retroalimenta a desigualdade social, tendo em vista que, baseia-se no princípio da competição, um sistema meritocrático que parte de um lugar desigual, onde uma pequena parcela da população já está à frente nessa corrida, onde Montaño (2012) fala que “não é a escassez que gera a pobreza, mas a abundância (concentrada a riqueza em poucas mãos) que gera desigualdade e pauperização absoluta e relativa”. O racismo é um meio utilizado para inferiorizar uma parcela da população, “atribuindo desigualdades sociais, culturais, políticas, psicológicas, à "raça" e, portanto, legitimando as diferenças sociais a partir de supostas diferenças biológicas” (ZAMORA, 2012). Isso faz com que, aqueles que compõem essa raça, sejam inferiorizados e, consequentemente, não tenham as mesmas

possibilidades.  

A união entre o discurso competitivo capitalista e o racismo, fomenta a violência. Ocorre um processo de exclusão, marginalização e invisibilização de parte da população. Essas pessoas invisibilizadas são vistas como um mal social, um sujeito que poderia ser inexistente e logo se torna aquele ao qual todos os recalques são projetados. Há uma reprodução da violência desde a exclusão da população negra, que os impossibilita o acesso a determinados espaços e os restringe a poucas possibilidades, assim como uma construção do negro como alguém desagradável, inaceitável e, portanto, não necessário existir e passível de ser tudo de ruim e um corpo que pode ser morto.

Em cada uma dessas dimensões [imaginário, simbólico e real] apontamos a dupla valência que a morte violenta adquire para a subjetividade e para o laço social. Por um lado, trata-se de uma experiência catastrófica de desagregação, mas, por outro, a morte se inscreve como um elemento constituinte da relação do sujeito com a cultura. No campo do imaginário, o enfrentamento da morte é, paradoxalmente, o horizonte que permite ao sujeito o reconhecimento perante o outro nas relações conflitivas de rivalidade (BISPO, [201-]).

Podemos aqui usar a definição de Homo-sacer, dada por Agamben (2010 apud BISPO, [201-]), como aquele que só é incluído no laço social por sua exclusão, como é o caso do Sandro. Ao se considerar a desigualdade social enquanto resultado de uma estruturação política onde interesses econômicos de parte da população se sobrepõem às necessidades sociais de uma minoria negligenciada, evidencia-se uma hierarquia social e o desacesso à direitos básicos torna-se ferramenta para marginalização desses sujeitos (BOCK, 2016). Isso significa que polarizações raciais, étnicas, sexuais, econômicas, entre outras, tanto podem configurar a materialidade de cor, sexo, gênero, e classe social daqueles mais propícios a serem atingidos por ela, quanto atuam em espiral: “todo processo violento, ao ser efetivado, tende a se autonomizar em relação às suas causas imediatas, isto é, tende a produzir ainda mais violência, atuando de forma cíclica” (AMARAL, 2007; MARTINS; JUNIOR, 2018).

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