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Serviço social

Por:   •  24/8/2015  •  Pesquisas Acadêmicas  •  2.715 Palavras (11 Páginas)  •  181 Visualizações

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No âmbito da atenção básica (AB), a integralidade, a longitudinalidade, a coordenação do cuidado e o potencial para ser o primeiro ponto de contato com os usuários são atributos explorados na produção científica e reconhecidos em normativas oficiais. Outras atribuições, especialmente aquelas fruto da interface da AB com os demais níveis de atenção também são importantes de serem identificadas. A monografia buscou identificar nas políticas nacionais de saúde as atribuições da AB para o atendimento às urgências, com ênfase na segunda metade dos anos 2000. Procurou-se compreender como a produção normativa relacionada às políticas de urgência repercutem na AB, e os desdobramentos para a gestão e organização desses serviços em âmbito local. O percurso metodológico orientou-se pelo campo da análise de políticas, privilegiando o aspecto formal e temporal das normativas. Foram levantadas, aproximadamente, 19 portarias e documentos relacionados à política de urgência e de AB. Além disso, foram feitas entrevistas semi-estruturadas com gestores da AB de quatro municípios da região Metropolitana I do estado do Rio de Janeiro. A análise documental evidenciou as influências das políticas específicas de urgências na conformação da política de atenção básica. No entanto, a implantação dessas diretrizes configura-se como desafios para a gestão local, tendo em vista a necessidade de transformação do modelo assistencial vigente, o financiamento, a adequação de estrutura física e a aquisição de insumos adequados para manejo das urgências nas unidades de atenção básica. A temática sugere que há uma inflexão na política nacional de AB que merece ser aprofundada em outras pesquisas.

  1. Apresentação O presente trabalho é requisito para obtenção do título de Especialista em Gestão da Atenção Básica (AB) pela Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP/ FIOCRUZ). A especialização nos colocou imersos em conceitos, práticas e políticas que perpassam o campo da AB, o que nos permite dizer que não é tarefa simples tentar delimitar, mesmo que em linhas gerais, o papel da atenção básica no contexto do Sistema Único de Saúde (SUS). Tão complexo quanto isso é optar pelo nome atenção básica ou atenção primária. Essas não são decisões inocentes, mas, a priori adotaremos que ambos os termos são análogos, conforme orienta a Política Nacional de Atenção Básica (Brasil, 2011a). Considera-se que a equivalência entre os termos não nos atrapalha a compreender o objeto de interesse deste trabalho: o papel da atenção básica no atendimento às urgências. A intenção de estudar este tema surgiu a partir da participação na pesquisa multicêntrica intitulada “Rede de atenção às urgências e emergências: avaliação da implantação e desempenho das Unidades de Pronto Atendimento (UPA)”1 . O contato com as discussões sobre a rede de urgência e emergência (RUE) me provocou no sentido de procurar compreender as seguintes questões: quais as atribuições definidas para a AB nas diretrizes nacionais relacionadas às urgências? De que modo essas diretrizes repercutem nas políticas de atenção básica? Além disso, quais suas possíveis implicações para a gestão e organização dos serviços de AB em âmbito local? O objetivo geral desse estudo é identificar as atribuições da AB no atendimento às urgências expressas nas políticas nacionais de saúde delineadas, principalmente, a partir da segunda metade dos anos 2000. Procurou-se compreender de que modo a produção normativa relacionada à políticas específicas (atenção às urgências) repercutem na AB, e quais seus possíveis desdobramentos para a gestão e organização desses serviços em âmbito local. 1Apesquisa, de caráter multicêntrico, e financiada pelo Ministério da Saúde (SAS/MS) e Conselho Nacional dos Secretários de Saúde (CONASS), encontra-se em fase de elaboração do relatório final. O objetivo geral da pesquisa foi avaliar os fatores que favorecem e dificultam o desempenho das UPA, com foco na resolubilidade e na constituição e governança das redes de atenção às urgências e emergências. A coordenação geral do estudo foi do Prof. Nelson Ibañez (Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo), e, no âmbito do estado do Rio de Janeiro, a pesquisa de campo foi coordenada pela Profa. Luciana Dias (ENSP-FIOCRUZ). Minha participação se deu enquanto auxiliar de pesquisa de campo, dando suporte às entrevistas com os profissionais das UPA e gestores da AB, em municípios da região Metropolitana I (Metro I). 10 Estamos chamando de urgência as demandas que, diferentemente da emergência, se apresentam com potencial risco de vida mas não de forma iminente, necessitando, por sua vez, de atendimento imediato. No entanto, de acordo com Rocha (2005), a literatura médica não é muito clara quanto à diferença entre os termos, uma vez que não define de forma precisa as situações ou casos em que cada termo se aplica, podendo um caso urgente se tornar emergência ou o contrário. A autora enfatiza que se para o profissional de saúde a diferenciação é complexa, para o usuário essa distinção parte, na maioria das vezes, da percepção quanto às suas necessidades, pautadas por situações e experiências de vida diversas. Nesse sentido, ao procurar atendimento o usuário se direciona para aquele serviço que julga oferecer o cuidado mais adequado e oportuno, independentemente da classificação médica de urgência, emergência ou demanda ambulatorial. Na atenção básica as demandas podem ser programadas (agendadas) em conformidade com as linhas de cuidado, ou espontâneas, quando em decorrência de algum imprevisto ou manifestação de doença que leve o usuário a procurar atendimento, sem agendamento prévio. Nesse caso, as demandas podem ser de urgência clínica, expressar questões psicossociais ou simplesmente denotarem que aquele foi o momento oportuno para o usuário procurar o serviço. Postula-se que a recente reorganização da atenção básica por meio da Estratégia Saúde da Família não tornou mais fácil identificar quais as responsabilidades deste nível de atenção no atendimento de demandas que fogem ao preconizado nas ações programáticas voltadas para grupos de risco. No que tange à especificidade da atenção às urgências, esse exercício torna-se mais complicado e por isso, necessário. Acreditamos que este estudo, mesmo que exploratório, poderá contribuir para o conhecimento de um processo que denota ser inicial no âmbito da atenção básica, sugerindo mudanças na política nacional de saúde. Esta monografia está estruturada em capítulos. No primeiro capítulo discutem-se as atribuições e desafios postos à atenção básica no atendimento às demandas espontâneas e urgências a partir da revisão da literatura sobre o tema. O segundo capítulo apresenta os passos dados para a construção metodológica deste trabalho, destacando-se as escolhas realizadas, entre elas as que tivemos sucesso e as que precisaram ser corrigidas. 11 Os capítulos três, quatro e cinco reúnem os resultados alcançados por meio dos caminhos adotados na pesquisa empírica. No capítulo três, tratamos dos achados relacionados aos aspectos da atenção básica encontrados nas normativas sobre o sistema de urgência. Já o capítulo quatro, demonstra os conteúdos sobre o atendimento das urgências encontrados nos documentos federais sobre a atenção básica. O quinto capítulo, elaborado a partir da análise de entrevistas com gestores, traz as estratégias e desafios enfrentados pela gestão local para implantar ou garantir o atendimento das urgências na AB. Por fim, na discussão, sintetizam-se as reflexões promovidas ao longo da monografia, abordando aspectos que denotam a influência das normativas relacionadas à urgência nas políticas de AB, bem como as lacunas e novas hipóteses que podem inspirar outros estudos.

Capítulo I - Atribuições e desafios para o atendimento às urgências na atenção básica: um recorte a partir da literatura A atenção básica se diferencia dos outros níveis assistenciais por quatro atributos essenciais: preferência para ser o primeiro ponto de contato do indivíduo com o sistema de saúde, longitudinalidade, integralidade e a coordenação do cuidado dentro do sistema de saúde. E ainda que se constitua como um primeiro nível de atenção tem um papel de organização, integração das redes de atenção à saúde e da promoção, prevenção e recuperação da saúde (Starfield, 2002). Segundo as diretrizes do Decreto nº 7508 de 2011, a atenção básica é um dos componentes das Redes de Atenção à Saúde (RAS). O decreto define como portas de entrada às ações e aos serviços de saúde nas RAS: a atenção básica; a atenção de urgências e emergências; a atenção psicossocial e os serviços especiais de acesso aberto. Para contribuir com a consolidação e funcionamento da lógica de redes, a normativa expressa que a AB deve ser resolutiva, coordenar o cuidado e ordenar as redes (Brasil, 2011b). Além das atribuições enfatizadas pelos estudiosos e reafirmada recentemente com a regulamentação da Lei Orgânica nº. 8080/90, como poderíamos apontar a função da atenção básica na atenção às urgências? Que atribuições ou desafios a literatura elenca para o papel da atenção básica no atendimento desse tipo de demanda? De acordo com Dourado (2013), há clareza que a atenção básica deve mediar e ou ofertar o acesso às ações e serviços da rede de atenção das condições crônicas e para o atendimento dos casos agudos e crônicos agudizados menos complexos. No entanto, mesmo com diversificada produção normativa acerca do sistema de atenção às urgências no Brasil e a crescente valorização da atenção básica, não é possível evidenciar a incorporação do atendimento às urgências de baixa complexidade neste nível. Isso causa graves reflexos nos demais pontos de atenção, facilmente identificado com a superlotação das urgências com demandas de baixa gravidade. Carret (2009, apud Machado, Salvador e O’Dwyer, 2011) enfatiza que o acesso inadequado dos usuários aos serviços de urgência acarretam danos para os pacientes graves e os não graves, uma vez que estes perdem a possibilidade de continuidade do cuidado e aqueles correm maior risco de vida dado que a agilidade do atendimento tem impacto 13 considerável para o manejo da urgência/emergência. As autoras chamam atenção que o acesso à atenção básica ameniza a sobrecarga das urgências e emergências desde que seja garantido o atendimento das urgências em tempo e modo oportuno. Partindo do outro extremo, Barros (2007) buscou compreender, a partir de um estudo de caso, os motivos que faziam com que um serviço de emergência permanecesse sobrecarregado mesmo com a elevada cobertura de equipes de Saúde da Família. Dentre os elementos identificados para a população insistir em acessar a emergência, antes mesmo de terem consultado seu médico de família, podem ser citados: 1) a incapacidade da unidade básica de saúde (UBS) acolher em tempo hábil a demanda dos usuário, ou seja, a UBS somente realizava atendimentos agendados e as demandas espontâneas eram orientadas a procurar a unidade em outro dia ou o hospital; 2) dentre os usuários prevalecia a crença de que o médico generalista não conseguiria dar conta de suas demandas; 3) a UBS ainda não havia conseguido dissolver a dicotomia entre atendimentos x promoção da saúde, procedimentos x cuidado; ações individuais x coletivas. Em acréscimo, a autora aponta que o processo de trabalho na UBS observada se dava de forma fragmentada e dispersa entre a equipe multiprofissional, o que dificultava o adequado acolhimento, vínculo e responsabilização com os usuários de modo a conquistar a confiança e os estimular a buscar a UBF quando necessitassem. Outra pesquisa, realizada em 10 grandes centros urbanos, buscou compreender as mudanças no modelo de atenção à saúde introduzidas a partir da implantação do Programa Saúde da Família. Identificou-se que uma baixa proporção de usuários procurou a UBS de referência em episódio de doença, mesmo em casos de baixa gravidade; a maior parte dos serviços procurados foram os de urgência. Além disso, demonstrou-se que dentre as inovações no modelo o que predominou foi a incorporação das práticas extramuros - visitas domiciliares e reuniões comunitárias. No entanto, permanecia como desafio a oferta da integralidade e o equilíbrio adequado entre atividades clínicas e de saúde coletiva, ou seja, o foco excessivo em atividades para grupos de risco e a oferta programada dificultavam o atendimento das demandas individuais por assistência. Esses fatores são apontados como barreiras ao acesso e para o estabelecimento da unidade de atenção básica como porta de entrada ao sistema (Escorelet al, 2002). 14 Considerando a participação dos profissionais na constituição dos modelos assistenciais, Guérvas (2006) destaca que os médicos generalistas são profissionais polivalentes, responsáveis por dar resposta à cem por cento das demandas de seus usuários e por conseguir resolver sozinhos, sem encaminhamentos, noventa por cento das mesmas. Acrescenta que é fundamental para o fortalecimento da atenção básica, que os generalistas se percebam e assumam essa característica polivalente, inerente à essa especialidade. Para atingir isso, o autor recomenda ser preciso investir na formação profissional, remuneração justa, proporcionar reconhecimento social, bem como selar a função de reguladores que os generalistas devem exercer sobre o sistema. Além de estimular atitudes de compromisso e responsabilidade profissional, pessoal, humana e científica com os pacientes e a comunidade. O contrário disso transforma os pacientes em consumidores desorientados inseridos numa atenção fragmentada, pouco resolutiva e com altos custos. Estes apontamentos são consonantes às lacunas e desafios frutos da reordenação da saúde pública a partir do século XXI. Arantes e Viana (2011), em estudo sobre o ideário que constitui a história dos Centros de Saúde, apontam que no Brasil, até a implantação do Serviço Especial de Saúde Pública (SESP), predominava nos serviços de saúde a separação entre medicina preventiva e medicina curativa. A convivência entre ambas as práticas no mesmo estabelecimento de saúde era tida como um equívoco, uma vez que as práticas preventivas teriam maior impacto na saúde pública. No entanto, como destacam os autores, essa disputa traria efeitos tanto para os médicos como para população: Apesar de bem intencionada, esta atitude provocou um certo desinteresse entre os médicos, pelo seu caráter exclusivamente preventivo, e criou reações desfavoráveis na parcela da população que, destituída de recursos e insuficientemente esclarecida, procurava os postos de saúde para solução de seus males, ali recebendo conselhos e vacinas em vez de tratamento para suas enfermidades (Penido, 1958, apud Arantes e Viana, 2011. p. 1143). O que se nota com o levantamento dos estudos apresentados é que há necessidade de aumentar a resolutividade da AB no manejo dos casos de urgência, dado que a falta desse atendimento pode repercutir negativamente sobre os demais níveis e causar danos aos pacientes. 15 Capítulo II - O percurso metodológico do estudo A análise de uma política pública abarca tanto o lado institucional e o enunciado oficial, quanto permite identificar a correlação de forças e os arranjos sociais que constituem tal processo. Afinal, uma política formal extrapola os limites governamentais ao ser inserida numa realidade concreta, que envolve sujeitos históricos e o jogo de poder estabelecido (Baptista e Mattos, 2011). Atenta a isso, pode-se considerar que a construção deste trabalho buscou seguir os caminhos propostos no campo da análise de políticas. E como uma primeira aproximação com este campo, realizou-se uma incursão que privilegiasse o aspecto formal da política, identificando as influências e as mudanças nas políticas ao longo do período estudado. O percurso realizado por Castro (2009) em sua pesquisa sobre a condução da política de atenção básica pelo ente federal, foi uma das inspirações para adotar na monografia a estratégia de analisar portarias federais procurando corresponder aos objetivos propostos no estudo. O ponto de partida foi a definição de descritores que serviriam como filtros para a pesquisa no site Saúde Legis, um concentrador oficial dos atos normativos do Sistema Único de Saúde (SUS) provenientes da esfera federal. Inicialmente, os descritores utilizados foram: “atenção às urgências”; “demanda espontânea”, “primeiro atendimento às urgências”, “demandas de urgência”; “atendimento em tempo e modos oportunos”; “livre demanda” e “urgência na atenção básica”. Com isso, procurou-se rastrear as portarias cujo conteúdo estivesse mais próximo ao tema das urgências na atenção básica. No entanto, não tivemos sucesso com essa estratégia, uma vez que o portal Saúde Legis não identificou com afinco os descritores utilizados, não permitindo a seleção das normativas adequadas aos propósitos do estudo, com exceção do descritor “atenção às urgências”. A alternativa cogitada foi lançar mão de descritores abrangentes, como “rede de urgência e emergência”, mas o quantitativo de normas encontradas (aproximadamente 33 mil) mostrou-se inviável por fugir da pretensão do estudo. Além disso, a leitura das primeiras 500 portarias demonstrou que o conteúdo na maioria das vezes não estava relacionado ao descritor, denotando que o filtro não havia funcionado. 16 A solução encontrada foi dividir a busca em dois momentos: 1º) identificar as normas estruturantes para a condução da Rede de Atenção às Urgências que contivessem aspectos relacionados à atenção básica e 2º) fazer o inverso, identificar nos documentos centrais para a atenção básica os conteúdos relacionados ao atendimento das urgências nesse nível de atenção. O quadro a seguir apresenta o conjunto dos documentos levantados:

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