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EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO "Veja 2009"

Por:   •  29/5/2015  •  Resenha  •  2.708 Palavras (11 Páginas)  •  239 Visualizações

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Resenha: EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO

Durante sua primeira e única visita aos EUA, entre abril a julho de 1876, o imperador dom Pedro II registrou em seu diário um feito que lhe chamou a atenção: o trem que ligava New York a São Francisco completa o percurso “em 84 horas e 26 minutos”. Três dias e meio, apenas. No Brasil de 1876, a estrada de ferro, mas movimentada, cuja extensão era um fração da ferrovia americana, fazia a ligação entre as plantações de café e os portos do Rio de Janeiro e Santos. Uma equivalente a New York-São Francisco no Brasil deveria ligar o Porto Alegre a Fortaleza - e ainda faltaria chão. Por que os EUA, que estão comemoravam o primeiro centenário de sua independência, já tinham trens rasgando o país do Atlântico ao Pacifico, enquanto no Brasil a maioria das viagens era mesmo feita em lombo de mula. A questão que apresentou ao imperador estava no seu nascedouro e, de lá para cá, ficou ainda mais pertinente e intrigante: por que os EUA, que largaram atrás de tantos países da América Latina, inclusive do Brasil, conseguiram tamanho sucesso, enquanto a maioria da população da América Latina só agora começa a experimentar a vida em padrões pouco acima da linha da pobreza?  Por que o grande irmão do norte se notabilizou por dois séculos de estabilidade politica e social, enquanto s países do sul do Rio Grande tiveram sua historia entrecortada por golpes de estado e experimentalismos econômicos, resultando em nível de desigualdade obsceno que só rivaliza com o da África?

Quem der as respostas definitivas terá achado o Santo Graal do progresso material e social. Enquanto isso não acontece, as explicações para o fosso vão ficando cada vez mais refinadas. Uma delas aparece no livro do economista Bruce Scott, da Universidade de Harvard, lançado em novembro de 2009, pela editora Springer-Verlag, de Heidelberg, na Alemanha. Enquanto os EUA se deu o surgimento simultâneo da democracia e do capitalismo, a América Latina teve relação conflituosa com esses conceitos, nunca corretamente entendidos por seus lideres.

“A América Latina sofre de falta de capitalismo, e não de capital”. O economista afirma que o capital, nacional ou estrangeiro, só ruma para um país quando se sente protegido por um conjunto de instituições. É por essa razão, completa ele, que não funcionou o que parecia ser a bala magica contra a miséria na região, a famosa proposta do peruano Hernando de Soto, apresentada no livro O Mistério do Capital.  De Soto dizia que a regularização dos lotes e casebres das camadas mais pobres da população permitiria seu uso como garantia de empréstimos bancários e despejaria bilhões de dólares na economia formal. Não foi o que aconteceu nos países onde a experiência de Soto foi tentada. O que deu errado? A precariedade institucional. Sem garantias explicitas de, em caso de calote, recuperarem o empréstimo concedido ou o imóvel financiado, os bancos não entraram na dança. Mais desanimador ainda para eles era recorrer à Justiça. As sentenças demoravam, na melhor das hipóteses, oito meses e, pior, oito anos. Ou seja, sem regras o capitalismo não existe.

“A recuperação do valor de um bem é, em ultima instancia, um teste sobre a saúde das instituições capitalistas”, diz Scott. “E essas instituições formam um sistema de economia politica, não apenas de mercado.” Eis uma novidade, sobretudo vinda de um economista: quando se trata de promover desenvolvimento capitalista, a politica é superior ao mercado. É na politica que se definem as regras do jogo, cabendo ao mercado atuar dentro dessa moldura. Quanto mais democrático for o regime, mas chance terá de criar instituições saudáveis. Com a crise financeira mundial deixando patente a necessidade de mais regulação do que preconizava a era Reagan, parece obvio afirmar que a politica tem um papel a cumprir, mas nem sempre foi assim. O mercado dizia-se, trazia em sim mesmo os germes do seu próprio aperfeiçoamento.  A abordagem de Scott inspira-se na corrente mais em voga para explicar o fosso econômico que separa o norte e o sul das Américas.

O institucionalismo sustenta que as regras e normas, econômicas e politicas, formais e informais, então na base do desenvolvimento de uma sociedade. Nos EUA desde os primórdios da colonização inglesa, as instituições, que são resultado de negociação politicas, protegem a propriedade privada, zelam pelo respeito aos contratos e leis, garantem o funcionamento impessoal da Justiça, estimulam a prestação de serviços públicos, com hospitais e escolas, para a maioria da coletividade, e não apena para a elite.

No começo da colonização, a América Latina era mais rica e tinha sociedades mais complexas que a América do Norte. O Brasil era terra e clima promissores, já tinha vida e clima comercial, com o pau-brasil e depois com o açúcar, mercadoria altamente valorizada na época, enquanto as tentativas de colonização nos EUA eram um fracasso atrás do outro. Nos primeiros 250 anos de colonização europeia, a América ibérica teve alguma vantagem sobre a América Inglesa. Nos 250 anos seguintes, período em que as colônias viraram países independentes e republicanos, o jogo inverteu-se brutalmente. A renda per capita dos americanos e canadenses disparou. De acordo com as contas do cientista politico Francis Fukuyama, o calendário do fosso foi o seguinte:

- Até cerca de 1800, o norte e o sul das Américas evoluíram de modo mais ou menos semelhante.

- De 1820 a 1870, período que concentrou as guerras de independência, a América Latina encolheu 0,5% ao ano.

- De 1870 a 1970, com uma interrupção durante a depressão dos anos 30, a América Latina cresceu até mais do que os EUA, mas num ritmo longe de cobrir a liderança.

- De 1970 até agora, os EUA voltaram a crescer mais que os vizinhos do sul, aprofundando o fosso.

- Em 2001, a renda per capita americana superava U$ 27.000,00. A latino-americana não chegava a U$ 6.000,00.

O Brasil avançou em muitos aspectos, mas ainda é “a eterna promessa de futuro”, ora como celeiro do mundo, ora como potencia verde, ora com etanol, ora com pré-sal, sempre o país em busca de cumprir o vaticínio da aurora redentora. O México progrediu, recuou e voltou a progredir, e ainda duela para superar a frase imortal de Porfírio Diaz: “Pobre México, tão perto dos EUA e tão longe de Deus” A Argentina fez pior. Já sendo mais rica que a Suíça, andou para traz. Buenos Aires, cuja prosperidade pregressa deixou rastro nas avenidas e cafés, nos teatros e na onipresença da arquitetura neoclássica, transformou-se melancolicamente no que o escritor André Malraux chamou de “capital de um império que nunca existiu”. No inicio do século XIX, com a dianteira americana se alargando, atribuiu-se o atraso latino-americano ao trauma da conquista colonial, brutal e sangrenta. Em seguida, apareceu à tese da inferioridade cultural e religiosa dos ibéricos católicos em relação aos anglo-saxões protestantes, o que não levava em conta o contraste entre o sul e o norte do EUA. Do inicio do século XX em diante, a esquerda dizia que o atraso era produto do imperialismo americano, e não atentava para o Canadá, que, ilhado pelo império, se a tese estivesse certa, não deveria então ser a potencia que já era e segue sendo.

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