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Arquitetura e Choque Cultural: São Petersburgo contra a Okhta Centre Tower

Por:   •  27/1/2018  •  Artigo  •  1.844 Palavras (8 Páginas)  •  304 Visualizações

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO

ARQUITETURA E URBANISMO

ALINE DE SOUZA SILVA SILVEIRA

Arquitetura e Choque Cultural: São Petersburgo contra a Okhta Centre Tower

São Petersburgo é uma cidade russa localizada às margens do rio Neva, na entrada do golfo da Finlândia, no mar Báltico. Foi fundada em 1703, durante a Guerra do Norte  e foi capital do país nos períodos de 1712 a 1728 e de 1732 a 1918. A cidade tem cerca de 4,8 milhões de habitantes (estimativa de 2010), sendo a segunda maior da Rússia e territorialmente a quarta maior da Europa. Ela ostenta o título de Patrimônio Mundial da UNESCO desde 1990 e é listada como uma área de 36 complexos de arquitetura histórica e cerca de 4000 monumentos históricos e culturais. É construída sobre mais de 100 ilhas, possuindo atualmente 342 pontes em diferentes estilos arquitetônicos e períodos. Com o objetivo de manter os prédios históricos como os pontos de destaque da silhueta de São Petersburgo, a legislação local admite a altura de 48 metros como a máxima permitida para novos prédios no centro.

No final de 2006, a Gazprom, empresa russa de gás natural e petróleo, e as autoridades locais de São Petersburgo anunciaram a construção de uma nova sede da estatal avaliada em US$ 2 bilhões, que incluía além de com museus, biblioteca, instalações desportivas e de lazer, e uma sala de concertos, a Okhta Centre Tower, uma torre com aproximadamente 400 metros de altura e design de uma chama oscilante feita em vidro, concebida para ser o prédio mais alto da Europa e transformar São Petersburgo em uma “cidade do novo mundo”. Tal sede seria construída em uma área industrial desativada no vale de Okhta, as margens do Rio Neva em frente a catedral Esmolna, com a ambição de se tornar um novo símbolo de São Petersburgo. O projeto foi feito pela RJMJ, uma empresa de arquitetura britânica.

A sede deveria ser concluída até 2016, porém encontrou uma forte oposição vinda dos cidadãos, de partidos políticos, ONGs russas, arquitetos, jornalistas, celebridades e da UNESCO; causando uma batalha que foi travada nos tribunais, nos meios de comunicação, e nas ruas.

A discussão se desenvolve devido ao tamanho exagerado da torre principal. Os opositores acreditam que uma construção desta dimensão afetaria seriamente o bem conservado centro histórico da cidade, marcado por sua horizontalidade. Até mesmo a UNESCO pediu para que a Rússia suspendesse a construção no centro pois ela “poderia afetar o valor universal excepcional do centro histórico de São Petersburgo e grupos relacionados de monumentos”. A organização avisou que o edifício colocaria a cidade na lista de patrimonio mundial em perigo de extinção no ano de 2010.

Representantes do Museu Hermitage da Rússia e da União dos Arquitetos de São Petersburgo se manifestaram contra o centro de negócios. A maioria dos habitantes de São Petersburgo também se opôs ao projeto. Uma  pesquisa de opinião pública realizada pelo Centro EKOM , uma organização não-governamental que promove os direitos civis na Rússia, mostrou que 66 % dos moradores de São Petersburgo se opunha ao projeto.

Os ativistas do movimento cidade viva estavam convencidos de que o projeto da Gazprom estava violando a lei, além de ignorar a opinião pública.

A coordenadora do movimento Cidade Viva, Julia Minutina, defende que :

"Os edifícios não devem ser mais altos do que 100 metros  perto do centro da cidade. O Centro Okhta afetaria negativamente os panoramas clássicos de São Petersburgo. Assim que um desenvolvedor quebra as regras , os outros vão seguir o exemplo. Pode levar à anarquia -planeamento da cidade "

Foi argumentado também que o ambiente arquitetonico-histórico de são Petersburgo seria como um organismo vivo com código genético próprio e o arranha-céus seria como um câncer gigante destruindo o organismo vivo.
Houve um protesto com cerca de 3000 manifestantes e em uma reunião na prefeitura, após quatro horas de debate acalorado sobre a torre ; guardas de segurança confiscaram bombas de gás lacrimogêneo , facas e soqueiras da multidão - um sinal de que a controvérsia poderia até mesmo levar à violência.
A empresa e os arquitetos responsáveis pelo projeto defendem por sua vez que o projeto não está em desacordo com qualquer lugar histórico e que daria um novo ponto de vista para ver a cidade. De acordo com a Gazprom, grandes nações e grandes corporações constroem grandes torres.

O arquiteto chefe do projeto, Philipp Nikandrov acredita que "a UNESCO não só deve proteger o patrimônio mundial existente, mas também concordar com a criação de novo património mundial".
Toda a discussão acontece principalmente pelo fato de que a opinião pública foi desconsiderada pela Gazprom, seus arquitetos e o governante. Os vários anos de protestos levaram a mudança da sede, mas esta ainda será construida, tendo agora uma área ainda maior e dando a sua torre principal uma altura de 500 metros.

O homem vê o mundo ao seu redor através de sua cultura, qualificando-as através dos conceitos concebidos em seu próprio meio. Por este motivo quando entra em contato com pessoas de origem diferente há o estranhamento de ambas as partes, o que é conhecido tende a ser julgado de maneira boa e o desconhecido tende a ser julgado de modo ruim*. Como Laraia(1986) diz

“O fato de que o homem vê o mundo através de sua cultura tem como consequência a propensão em considerar o seu modo de vida como o mais correto e o mais natural. Tal tendência, denominada etnocentrismo, é responsável em seus casos extremos pela ocorrência de numerosos conflitos sociais.”

A situação que se desenvolve em torno da construção da Okhta Centre Tower trata-se de um choque cultural entre a empresa, os governantes russos e a população de São Petersburgo. Neste caso o estranhamento se deve ao fato dos responsáveis pela torre terem ignorado a opinião dos habitantes do local. Os arquitetos da RJMJ planejaram o design da torre de acordo com a história da cidade, desejando que ela se adequasse a esta história. Existe toda uma concepção por trás do projeto, no entanto, a visão deles não era a mesma que a da população e sem a opinião destes o projeto causou toda uma série de conflitos. Este exemplo pode se repetir por diversas vezes quando trabalhamos com pessoas de sociedades diferentes, mas também pode acontecer quando lidamos com pessoas de nossa própria sociedade. Tendo em vista que “O fato de dois indivíduos pertencerem à mesma sociedade não significa que estejam mais próximos do que se fossem de sociedades diferentes, porém aproximados por preferência, gostos, idiossincrasias” (VELHO, 1978)

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