TrabalhosGratuitos.com - Trabalhos, Monografias, Artigos, Exames, Resumos de livros, Dissertações
Pesquisar

A Dignidade da pessoa humana e a ordem jurídica

Por:   •  8/4/2018  •  Trabalho acadêmico  •  9.883 Palavras (40 Páginas)  •  358 Visualizações

Página 1 de 40

Direitos Humanos / Aula 1 - A dignidade da pessoa humana e a ordem jurídica

do próprio Estado e da ordem jurídica. Em seguida, discutiremos sua problemática conceitual, destacando a

A dignidade da pessoa humana: considerações gerais

Vejamos, a seguir, um trecho do famoso poema “Morte e Vida Severina”, de João Cabral de Mello Neto:

No famoso poema, João Cabral de Mello Neto conta a história de Severino, um retirante do interior da Paraíba que foge da seca, em direção a Recife, no litoral de Pernambuco. Lá, Severino acredita que terá uma vida melhor, com melhores condições.

Esse trecho reproduzido se refere ao final da viagem de Severino, já chegando em Recife. Mas, ainda assim, mesmo estando na capital pernambucana, Severino encontra morte e pobreza, da mesma maneira que via no interior do sertão. Decepcionado e desiludido, o trecho reproduzido sugere ao leitor que Severino irá se suicidar para dar fim a sua sina.

Esse sonho desfeito de Severino, escrito pelos idos dos anos 50 do século passado, ainda se mostra atual. Traduzido para o mundo do Direito, traz os desafios que a dignidade humana (ou sua falta ou desrespeito) coloca para as sociedades contemporâneas, e em especial a brasileira.

A dignidade da pessoa humana tem sido considerada por muitas áreas do saber humano, tais como a Filosofia, a Ética, a Política e o Direito, como o ponto central de construção de todo o ordenamento jurídico e do próprio Estado.

Ela é vista até mesmo com um valor suprajurídico, isto é, para além do Direito e da Constituição, já que seria a dignidade um valor ínsito do ser humano. E, desta maneira, a dignidade trata diretamente da essência do ser humano. É, portanto, esse seu caráter supraconstitucional que permite, inclusive, que possamos sustentar sua efetividade independentemente da sua positivação (isto é, seu reconhecimento pelo direito, através de uma norma jurídica, quer seja ela lei ou mesmo uma norma constitucional).
Se pensarmos, por exemplo, nos dramas humanos da atualidade, como entre tantos outros, a questão dos refugiados de guerra ou a fome nos países africanos, salta aos olhos a crise humanitária que vivenciamos e destacamos a importância da valorização e proteção da dignidade humana como bússola para enfrentarmos essas calamidades que assolam o mundo.

Assim, falar de dignidade humana é falar do outro, é falar de direitos, é falar de democracia, é falar de cidadania.

Para as sociedades atuais, a dignidade da pessoa humana coloca uma série de desafios a serem enfrentados, assegurando a todas as pessoas uma vida decente: com respeito, igualdade e liberdade, com acesso aos bens necessários para a realização do projeto de vida de cada um e que leve, enfim, à felicidade. Assim, a dignidade se articula com a própria possibilidade de existir com decência no mundo para nele viver em plenitude.

No entanto, a vida em sociedade é marcada por desigualdades materiais e carências sociais, pois, ainda que expresso de forma simplista, há mais pessoas do que bens disponíveis, isto é, não é possível o acesso igual de todos a todos os recursos disponíveis: aí se coloca o dilema da dignidade humana.

A construção histórica da dignidade humana

A ideia de dignidade humana não é uma invenção do século XX. Os estudiosos do tema apontam que, já na Antiguidade Grega, havia um movimento de valorização da pessoa humana. Também entre os orientais a pessoa humana tinha seu destaque. Confúcio, partidário de uma ideia de aperfeiçoamento do ser, em detrimento da caridade pura, já pregava “ame a todos sem distinção”. Posteriormente, com o advento do Cristianismo, a figura do ser humano, à imagem e semelhança de Deus, inspirava uma relação de reconhecimento de si no outro. O fundamento da dignidade morava no divino.

Saltando no tempo, é com o Iluminismo que, no Ocidente, a dignidade da pessoa humana passa a derivar da razão, daí decorrendo a criação de vários documentos emblemáticos para o marco do respeito à dignidade humana, como por exemplo, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, resultado da Revolução Francesa.

Fonte: Le Salon de Mme Geoffrin - Anicet-Gabriel Lemonnier. https://www.histoire-image.org/sites/default/salon-geoffrinf.jpg

Kant, na famosa obra "Fundamentação da Metafísica dos Costumes" sustentava que as pessoas deveriam ser tratadas como um fim em si mesmas, e não como um meio (objetos). O filósofo assim dizia:

[pic 1]

São as noções de Kant que fixaram as bases da compreensão moderna da dignidade humana fixando sua relação com os direitos humanos e que até hoje se colocam como, de certa forma, pertinentes.

Há duas dimensões do pensamento kantiano que merecem destaque:

A ideia de finalidade, isto é, o homem, por ser dotado de razão, é um fim em si mesmo.

A ideia de autonomia, isto é, a vontade humana deve estar direcionada para o dever de estabelecer parâmetros de moralidade que sirvam para todos, inclusive para ela mesma, não porque se busca uma vantagem futura, mas sim porque esta é a dignidade do ser dotado de razão.

A problemática conceitual e sua relação com os direitos humanos

Em uma postagem, de março de 2015, no Blog JOTA, Daniel Sarmento, diz que:


“uma rápida pesquisa no site do STF mostra que, sob a égide da Constituição de 1988, o princípio da dignidade da pessoa humana foi explicitamente invocado em nada menos que 260 acórdãos, 2.298 decisões monocráticas, 79 decisões da Presidência, 9 questões de ordem e 3 repercussões gerais. Os temas abordados pelas decisões são os mais variados, indo da vedação de denúncias criminais genéricas à união homoafetiva; da impossibilidade de realização compulsória do exame de DNA ao aborto de fetos anencéfalos; das políticas de ação afirmativa à criminalização da violência doméstica”.

Desses dados apresentados, logo pensamos:

Veremos que há um esforço doutrinário no sentido de responder nossos questionamentos, embora sem que possamos ter uma definição fechada, com todos os seus elementos determinados.

Um conceito de dignidade humana: desafios

A dignidade humana é uma daquelas expressões chamadas de polissêmicas. Isto quer dizer que ela é portadora de muitos sentidos diferentes, sendo um desafio estabelecer um sentido único para a mesma.

Assim, dignidade humana quer (e pode) dizer respeito a muitas coisas diversas, em razão do sentido que lhe é atribuído e dos interesses que se busca preservar ou defender quando a ela recorremos.

...

Baixar como (para membros premium)  txt (67.9 Kb)   pdf (1.3 Mb)   docx (1.4 Mb)  
Continuar por mais 39 páginas »
Disponível apenas no TrabalhosGratuitos.com