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D. PAULO EVARISTO ARNS E SUA LUTA PELOS DIREITOS HUMANOS NO BRASIL DURANTE A DITADURA (1964-1984): UM ESTUDO DE BIOÉTICA

Por:   •  20/8/2018  •  Artigo  •  6.122 Palavras (25 Páginas)  •  251 Visualizações

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D. PAULO EVARISTO ARNS E SUA LUTA PELOS DIREITOS

HUMANOS NO BRASIL DURANTE A DITADURA 19641984: UM ESTUDO DE BIOÉTICA

ANTONIO CARLOS RIBEIRO 1

RESUMO

Após a deposição do Presidente João Goulart com o Golpe Militar no Brasil no ano de 1964, o Estado brasileiro ficou sob o comando as Forças Armadas. Através de Atos Institucionais, o governo militar, sob a égide da Doutrina de Segurança Nacional no cenário geopolítico da Guerra Fria, capitaneado pelo grupo dos Linhas-duras inicia o período mais repressor do Regime Militar concebido como Anos de Chumbo. No cenário eclesial, a Igreja Católica realiza o Concílio Vaticano II, abrindo para os problemas do mundo moderno e assiste a gênese da Teologia da Libertação como proposta teórica de tendência marxista para responder aos desafios de caráter social, principalmente a exclusão e a desigualdade sociais. Neste contexto, destaca-se a atuação de Dom Paulo Evaristo Cardeal Arns à frente da Arquidiocese de São Paulo numa fase da história do Brasil em que os Direitos Humanos eram vilipendiados pelas arbitrariedades do Regime Militar. A conjuntura na época em que a sociedade civil estava silenciada, d. Paulo se apresenta como uma das poucas a vozes opositoras ao Regime, rompendo a diplomacia que durante anos marcou a relação Estado-Igreja, aderindo à assistência por quem ansiava por justiça. Assim, d. Paulo articula uma série de execuções visando defender os mais vulneráveis nesta conjuntura através da criação da Comissão Justiça e Paz de São Paulo, a Operação Periferia, a visita aos presídios com suspeita de tortura, denúncias aos abusos dos militares, entre outras atividades que iam além de seu papel religioso, demonstrando um profundo senso de humanidade. Destarte, esse trabalho se propõe a refletir elementos de caráter bioético na atuação de d. Paulo como precursor de ideais bioéticos que, na sociedade contemporânea, estão sedimentados como valores e direitos: a liberdade de expressão e pensamento, o debate democrático, rejeição à violência instituída, o respeito aos Direitos Humanos e a dignidade da pessoa humana. A abordagem de reflexão bioética a partir da atuação de um agente histórico reveste-se de certa novidade diante da tradição principialista, proveniente, sobretudo, dos Estados Unidos e Europa, com predomínio de pesquisas e produções relativas aos direitos dos pacientes e ao universo da medicina. Contudo, como crítica a essa tradição, bioeticistas provenientes da América Latina apresentam a chamada Bioética Social, cuja abordagem volta-se para os problemas sociais e, igualmente, para a crítica à agressão aos Direitos Humanos. Esta abordagem de bioética latino-americana apresentaria mais fundamentos para a relevância científica de como se processou, ao longo dos anos na história recente do país, a construção de leis e de consciência mais sensível às bases da Bioética em sua essência, como respeito ao ser humano, autonomia e dignidade. O legado de D. Paulo como um dos responsáveis por essa realidade é digno de um olhar atento com critérios de pesquisa científica para resgatar a memória de personalidades que corroboraram para a consolidação do Estado Democrático de Direito no Brasil.

Palavras-Chave: Dom Paulo Arns. Direitos Humanos. Bioética Social.

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  1. Mestre em Bioética pelo Centro Universitário São Camilo (2013). Especialista em Bioética e Pastoral da Saúde no Centro Universitário São Camilo (2011). Especialista em História, Sociedade e Cultura pela PUC- SP (zooq). Bacharel em Teologia pela Faculdade Dehoniana (zo1¢) e possui Licenciatura em Filosofia pela PUC-PR (1999). Doutorando em Bioética pelo Centro Universitário São Camilo como bolsista da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo. E-mail: acr-expert@uol.com.br


INTRODUÇÃO

Segundo Skidmore (1988, p. 83)2, após a deposição do Presidente João Goulart, o Brasil ficou sob o poder dos militares com apoio de diversos setores da sociedade, Meios de Comunicação, a OAB e a alta hierarquia da Igreja Católica. Os militares, influenciados pelos americanos com a “National War College” e sob a égide da Doutrina de Segurança Nacional, criaram todo um aparato ideológico a fim de reprimir a liberdade democrática. Tais instru- mentos foram a Escola Superior de Guerra, surgida anos antes do Golpe Militar, o Instituto de Pesquisa e Estudos Sociais e posteriormente o Serviço Nacional de Informações, esses últimos dirigidos pelo General Golbery Couto e Silva, cuja finalidade era propagar a menta- lidade de que quando

[...] ameaçada a ‘segurauça’, está justißcado o sacrifício do Bem-Estar que, por esteusão, é o sacrifício também da liberdade, das garautias coustituciouais, dos direitos da pessoa humaua.(...) se referia aos povos ameaçados por um iuimigo esteruo, euquauto para Golbery o iuimigo era iuteruo, deveudo ser procurado eutre o povo brasileiro. (ARQUIDIOCESE DE SÃO PAULO, 1985, p.70)3

O clima de bipolaridade no contexto geopolítico mundial serviu de pano de fundo para justificar uma série de Atos Institucionais - 17 ao todo - a fim de criar condições de governa- bilidade durante o Regime Ditatorial. Com “a forte ênfase do governo no anticomunismo”, e a proximidade histórica das Forças Armadas com os Estados Unidos, alinhou-se o novo governo com o Bloco Capitalista liderado pelos americanos (SKIDMORE, 1988, p. 67)4. Com

este contexto se tem notícia do fim das diversas manifestações culturais, sociais, políticas e

artísticas que oferecessem algum risco, segundo os critérios dos censores.

Com a promulgação do Ato Institucional Nº 5, editado em 13 de Dezembro de 1968, pelo Presidente Costa e Silva, seria inaugurada uma nova fase na Ditadura Militar Brasileira, em que o grupo dos chamados Liuhas-duras tomaram espaço no poder político objetivan- do maior “controle executivo e militar sobre o governo e os cidadãos” (SKIDMORE, 1988,

p. 166).5 Como fruto desse AI e dos demais vindouros, tem-se o fechamento do Congresso

Nacional, censura a qualquer crítica ao poder estabelecido e a mídia “colocada sob a super-

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  1. SKIDMORE, Thomas E. Brasil: de Castelo a Tancredo, 1964-1985. Tradução Mario Salviano Silva. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988, p. 63.
  2. Arquidiocese de São Paulo. Projeto Brasil Nunca Mais. Petrópolis, RJ: Vozes, 1985, p.70.
  3. SKIDMORE, Thomas E. Brasil: de Castelo a Tancredo, 1964-1985. p.67.

5 Ibid, p.166.


visão dos tribunais militares” (SKIDMORE, 1988, p. 167).6 Uma enorme lista com políticos e intelectuais foi providenciada a fim de expurgá-los, além da suspeição de futuras eleições. A guerrilha armada, tida como oposição clandestina, seria o único modo de manifestar alguma crítica ao governo, surgiu inspirada no triunfo de Fidel Castro (SKIDMORE, 1988, p. 171).7 Neste cenário é fundada em São Paulo a OBAN (Operação Bandeirantes), em julho de 1969, para representar uma coordenação de “ação maciça de repressão à onda de violência” ligada à Presidência da República8. Houve a centralizaçãodos organismos truculentos con- tra os considerados subversivos levando a cabo as determinações do AI 5, com a criação de uma polícia política dentro do próprio Exército, entre as ruas Tomás Carvalhal e Tutóia, com apoio do Governador do Estado Roberto de Abreu Sodré, o Prefeito Paulo Maluf, inúmeros empresários e jornais como a Folha de São Paulo. Tratava-se da “maior das mobilizações

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