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Encontro de Professores de Direito Público

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Por:   •  20/11/2013  •  Relatório de pesquisa  •  9.239 Palavras (37 Páginas)  •  266 Visualizações

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IIIº Encontro de Professores de Direito Público

Porto, 30 de Janeiro de 2009

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O princípio (fundamental) da eficiência

1. Um princípio à procura de identidade e de ancoragem

O princípio da eficiência é hoje utilizado de forma acrítica por governantes, legisladores, burocratas e até pelos tribunais, sem que todavia se tenha ainda podido encontrar na doutrina nacional (ou mesmo estrangeira) um estudo sistemático e sustentado sobre o seu sentido útil e efectivo no actual modelo de Estado e de Administração.

Em termos genéricos, o conceito de eficiência designa a característica dos elementos (pessoas, coisas, organizações) que alcançam o melhor resultado (não é apenas uma relação de grandeza, neste caso procurar-se-ia o maior rendimento, mas sim de quantidade/qualidade) com o menor dispêndio de recursos (tempo, trabalho, energia, matérias primas)1. Por essa razão, o seu campo de aplicação privilegiado e a sua ancoragem natural encontra-se nas ciências económicas, no estudo das opções ditadas pela escassez2.

A aplicação do critério da eficiência ao domínio jurídico resultou das teorias da análise económica do direito3, desenvolvidas como resposta à

1 Cf. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa, Lisboa, 2003.

2 Sobre a tensão entre a eficiência e a justiça v. Fernando ARAÚJO, Introdução à economia, 3ª ed. Almedina, Coimbra, 2005, pp. 38-39.

3 As teorias da análise económica do direito têm origem nos EUA, nas propostas de aplicação das teorias económicas de Coase e Calabresi ao domínio jurídico, tendo sido sobretudo aprofundadas por Posner no movimento que ficou conhecido pela expressão law and economics. Sobre a relevância destas teorias na formulação e desenvolvimento

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massificação dos problemas4, fruto da necessidade de “construir” esquemas de resposta legitimadores de uma selecção dos domínios de intervenção e das medidas adoptadas, para além do horizonte da “escolha política”. As propostas de Posner e Hayek centravam-se, fundamentalmente, na apologia da maior eficiência da common law relativamente à code law (direito civil de origem napoleónica, ditado pelo Estado), por representar um modelo “bottom up”, ou seja, um ordenamento construído a partir dos indivíduos5 e dos juízes6, mimetizador das dinâmicas do mercado (com menos atrito, menores custos de transacção), e, nessa medida, capaz de garantir melhor protecção contra o Estado (enfraquecendo o seu poder através da respectiva partilha com a Sociedade) e de alcançar soluções mais justas para os conflitos, uma vez que as normas ineficientes tenderiam a ser afastadas e rejeitadas pelas duas partes7. Já a code law ou civil law, por ser ditada previamente pelo Estado e “amarrar” o

do princípio da eficiência v., por todos, Horst EIDENMÜLLER, Effizienz als Rechtsprinzip, 3ª ed., Mohr Siebeck, Tübingen, 2005.

4 Sobre a recolocação da política no contexto da sociedade de massas assente na relação triangular Estado-grupo-indivíduo v. Rogério SOARES, Direito público e sociedade técnica (reimp.), Tenacitas, Coimbra, 2008, pp. 105ss.

5 A relevância da participação mais directa dos indivíduos na construção de um direito reflexivo tem também sido defendida em importantes trabalhos no campo das ciências sociais, contribuindo de forma efectiva para a mudança de paradigma do papel do Estado na Economia e na Sociedade – v. Anthony GIDDENS, The Constitution of Society (reimp.), Polity Press, Cambridge, 1997, pp. 180ss e Ulrich Beck, Macht und Gegenmacht im globalen Zeitalter, Suhrkamp, Frankfurt am Main, 2009, pp. 347ss. Entre nós, na defesa de um reforço e valorização do papel do cidadão na construção do desenvolvimento da comunidade, por ser ele, no essencial, o motor da sociedade e da optimização do bem-estar – v. VIEIRA DE ANDRADE, «Supletividade do Estado e desenvolvimento», Gaudium et Spes, 1988, pp. 113-124.

6 Para Posner, a pressão exercida sobre os juízes pelos grupos de interesses e a sua vulnerabilidade perante problemas pessoais, a que se associaria o facto de eles não disporem de poder para adoptar soluções redistributivas, conduziria à adopção do critério da eficiência como medida da decisão. Este argumento não singrou entre os defensores da maior eficiência da common law, mas serviu para iniciar o debate sobre a importância do modelo judicial na qualificação económica dos Estados.

7 Para uma perspectiva global destas propostas e da respectiva aplicação no contexto actual v. Paul RUBIN, «Legal systems as frameworks for market exchanges» e ARRUÑADA / ANDONOVA , «Market institutions and judicial rulemaking», in MÉNARD / SHIRLEY, Handbook of new institutional economics, Springer, Heidelberg, 2008, pp. 219-220 e 241-245.

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julgador a essa solução, tenderia, nesta perspectiva, a ser mais ineficiente, e nem a interpretação jurídica permitiria optimizar as decisões dos conflitos.

Não é porém esta a abordagem que escolhemos para o nosso estudo, a perspectiva que aqui nos irá ocupar de forma mais intensa radica, antes, na análise económica do direito público8, um fenómeno que foi inicialmente contestado e até rejeitado com base nos argumentos de que o Estado prossegue fins sociais e não pode adoptar uma filosofia utilitarista e de que a sua organização não se coaduna com soluções de mercado, mas que hoje é de reconhecimento pacífico mesmo entre aqueles que, como nós, não militam nas “hostes do liberalismo ou do neoliberalismo” e se limitam a participar no debate sobre os mecanismos de optimização do bem-estar social, espraiando-se por diferentes perspectivas ou ângulos de análise: plano organizatório, plano funcional e plano do controlo.

A sobreposição de planos e campos de aplicação do princípio da eficiência no âmbito do direito público indicia, desde logo, a sua falta de identidade autónoma, i.e., o facto de não ter sido ainda possível recortar nos sistemas jurídicos continentais o princípio da eficiência como um princípio fundamental de direito público com um conteúdo pré-definido e uma metódica própria de aplicação e de controlo. Este atraso na autonomização

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