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O Direito de Vizinhança

Por:   •  13/4/2022  •  Trabalho acadêmico  •  7.046 Palavras (29 Páginas)  •  71 Visualizações

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DIREITOS DE VIZINHANÇA[1]

6.1. Introdução

No estudo da propriedade remanesce, ainda, a abordagem acerca dos direitos de vizinhança. Mesmo no período áureo das codificações, informadas pelo individualismo exacerbado – época da concepção da propriedade como direito absoluto -, os direitos de vizinhança representavam imposição de condutas de modo a viabilizar a conciliação dos interesses dos vizinhos no segmento das limitações ao direito de propriedade. Como já lecionava San Tiago Dantas, “os imóveis são divididos convencionalmente pelo homem e, entre os diversos fragmentos do solo a que emprestamos individualidade, a natureza estabelece uma continuidade indestrutível”[2], daí a razão pela qual ocorre repercussão dos atos praticados por determinado proprietário quanto aos imóveis adjacentes e próximos.

No campo das limitações impostas ao direito de propriedade, as codificações sempre incluíram sob o título “direitos de vizinhança” as restrições que tolhem o proprietário do pleno exercício de suas faculdades dominicais, impondo-lhe certas condutas (comissivas ou omissivas) tendentes à conciliação dos respectivos interesses aos dos vizinhos. Sob a inspiração dos princípios da lealdade e da boa-fé nas relações humanas, o uso da propriedade está sujeito à compatibilização dos interesses dos vizinhos, permitindo regular convivência.

Devido à possibilidade de surgimento de conflitos que pudessem resultar da proximidade dos terrenos e dos prédios, pensou-se num mecanismo de harmonização de tais interesses. As normas sobre direitos de vizinhança são compostas de princípios e regras que ordenam não somente a abstenção da prática de certos atos por vizinhos, como também de outros que implicam a sujeição do proprietário a uma invasão de sua órbita dominial[3].

Há o interesse social de harmonização dos interesses particulares dos proprietários vizinhos[4]. Em matéria de terminologia, a noção jurídica de ‘vizinhança’ é mais ampla do que a acepção comum do referido termo[5]. Consideram-se prédios vizinhos aqueles que podem sofrer repercussão de atos praticados em prédios próximos ou que com estes possam ter vínculos jurídicos[6]. O exemplo do proprietário que, no exercício do direito de propriedade, deposite dejetos químicos em um rio, ocasionando prejuízos em vários terrenos – mesmo não contíguos ao seu – diante da contaminação das águas, é clara hipótese de conflito de vizinhança[7].

São requisitos para a configuração do conflito de vizinhança: a) ato do possuidor de um imóvel que repercuta em outro; b) prejuízo ou incômodo sofrido pelo possuidor do prédio vizinho em consequência do ato; c) vínculo de conexão entre o ato e o prejuízo (ou incômodo). Um ato do proprietário de um prédio repercute no prédio vizinho, causando prejuízo ou incômodo.

Direitos de vizinhança são aqueles que a lei estatui em razão do fato “vizinhança”. Para realizar estudo a seu respeito, é importante a referência quanto à necessidade de construir a teoria das situações jurídicas de vizinhança com base em um modelo de forte aderência aos casos concretos diante da multiplicidade e variedade de hipóteses[8].

É procedente a observação da doutrina no sentido de que a melhor expressão é situações jurídicas vicinais – e não direitos de vizinhança -, eis que há complexo de situações jurídicas de um sujeito, ativas ou passivas, que decorrem da relação intersubjetiva constituída pelo fato de serem proprietários ou possuidores de prédios em proximidade suficiente que o exercício de atividades em um deles pode repercutir no aproveitamento que se faça do outro[9]. Contudo, a práxis culminou em legitimar a expressão ‘direitos de vizinhança’ que foi adotada no Código Civil, daí tal expressão ser ainda utilizada.

Na contemporaneidade, em razão da trajetória da relativização do direito de propriedade, outros institutos a ele relacionados também sofreram importantes alterações como é caso dos direitos de vizinhança. Em razão do crescimento das cidades e a busca de se garantir qualidade de vida e bem estar social, além do resguardo ao interesse público, a noção conceitual dos direitos de vizinhança foi consideravelmente alargado e adaptado às novas necessidades sociais[10]. A construção de hospitais, escolas, shopping centers, estádios, parques de diversão, praças, entre outras, gera conseqüências não apenas para os proprietários de imóveis contíguos, mas também para todos os demais proprietários que, de algum modo, sentem as alterações urbanas decorrentes dos referidos empreendimentos ou áreas de lazer[11].

6.2. Natureza jurídica

Há divergência doutrinária a respeito da natureza jurídica dos direitos de vizinhança: são eles servidões legais ou limitações legais ao direito de propriedade?

No Direito brasileiro, prevaleceu a orientação consoante a qual os direitos de vizinhança são limitações legais ao direito de propriedade, sendo a proibição imposta em razão de interesse geral, apresentando cunho de reciprocidade.

A reciprocidade não existe na servidão, como será oportunamente analisado. O direito de servidão gera aumento da utilidade do prédio dominante e diminuição de direito para o prédio serviente.

Alguns direitos de vizinhança criam direitos pessoais enquanto as servidões consistem necessariamente em direitos reais[12]. Os direitos de vizinhança são criações da lei e, por isso, representam imposições (e não liberalidade), sendo as normas de ordem pública. As servidões podem ser criadas a partir da autonomia privada, e representam, como regra, liberalidade do dono do prédio serviente. Finalmente, os direitos de vizinhança não visam aumentar a utilidade do prédio, diversamente das servidões, objetivando apenas assegurar a coexistência pacífica entre os vizinhos.

Há, contudo, uma tendência de considerar os direitos de vizinhança modalidades de obrigações que se caracterizam pela aderência à coisa imóvel[13].

É oportuna a referência aos princípios identificados pela doutrina que informam toda a sistemática dos direitos de vizinhança: a) o princípio da coexistência dos direitos; b) o princípio da supremacia do interesse público. O primeiro fundamenta o estatuto da vizinhança comum, enquanto o segundo, o estatuto da vizinhança industrial[14].  

6.3. Características

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