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Palavras Chave: caboclo–tabu – candomblé

Por:   •  10/12/2018  •  Trabalho acadêmico  •  2.065 Palavras (9 Páginas)  •  184 Visualizações

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Não São o que te disseram

Thalles Carvalho Sena de Miranda, Eduardo Vinicius Moraes[1]

Palavras Chave: caboclo–tabu – candomblé

Tratar de religiões afro brasileiras, é ainda hoje considerado por muitos um tema tabu, isso acarreta uma serie de problemas a serem considerados, dentre eles a ignorância a cerca do que realmente são essas religiões, o que elas representam e quais são suas práticas. A falta de conhecimento sobre as crenças e práticas de matriz africana permitiu que a demonização destas, habitasse por muito tempo o imaginário da maior parte dos brasileiros. Essa demonização se deve principalmente a forte perseguição da igreja católica a essas práticas, a disseminação de contos sobre as entidades africanas serem demônios e sobre os adeptos selarem pactos em seitas[2] macabras fez com que muitas pessoas até mesmo sentissem medo de se quer buscar a compreensão sobre determinado culto. Esse pensamento ainda persiste em dias atuais, a ponto de que é deveras comum ver-se pessoas de religião protestante frequentar cultos católicos para entender determinados elementos ou vice-versa, porem a ideia de conhecer o funcionamento de um terreiro por exemplo ainda causa medo a maioria das pessoas.

O artificio utilizado pelo cristianismo, de demonização das religiões pagãs, é eficaz quando torna o simples ato de discutir sobre essas crenças uma blasfêmia. Segundo Freud (1913) em seu livro totem e tabu, esse tabu tem sempre essa dualidade entre o sagrado e o profano, e serve para proteger o totem, a quebra desse tabu está sempre associada a doenças, pragas e situações prejudiciais. Tendo como exemplo essa ideia de totem e tabu apontada por Freud, o cristianismo assume o papel de totem, enquanto as religiões pagãs tornam-se o tabu, isso faz com que o contato com esse “assunto proibido” ou maldito, representaria a quebra do tabu ocasionando ao indivíduo infrator[3] as mais variadas formas de castigo e situações adversas.

A autora Emmanuelle Kadya Tall, aborda em seu texto o papel do caboclo no candomblé baiano diversos aspectos sobre essa entidade ancestral tão cultuada por uns e temida por outros. Ela retrata a origem do culto ao caboclo e o motivo de sua dualidade (meio humano, meio divino), além de apontar aspectos como a teimosia , sua relação com as matas, seu papel de mensageiro em alguns casos e ainda traz explicações sobre a hierarquia do panteão de algumas religiões africanas, apontando os motivos e em quais casos o caboclo assume um papel central nos cultos. Vale ainda ressaltar a importância da elucidação feita pela autora sobre determinadas nuances dessas religiões, que muitas vezes são alvos de explicações generalistas[4].

O caboclo, segundo Kadya, é uma entidade intermediadora entre o divino e o humano, uma figura ligada a terra que fora outrora humana e agora habita o plano metafisico, assume um papel de ancestralidade, porem que não descende do continente africano e sim ao território brasileiro além de ter sido o primeiro dono da terra, e por isso é respeitado. Quando escravos de várias etnias diferentes eram trazidos e misturados no Brasil, perdiam parte de suas práticas e crenças, outras se misturavam. O fato é que, esses povos acabaram aprendendo muito com indígenas que já habitavam a terra, principalmente no uso de plantas e conhecimento da flora local, o que possibilitou a continuidade de alguns ritos, e isso fez com que alguns desses indígenas, considerados primeiros donos da terra fossem futuramente cultuados como caboclos, porém, com as palavras da própria Emmanuelle Kadya Tall (2012. P.82) “reduzir a figura do caboclo ao índio primordial seria falso. De fato, o termo genérico de caboclo agrupa todas as figuras ancestrais que não são de origem negro-africana”. A autora mostra que nas religiões africanas é muito comum o respeito aos ancestrais, porem o culto a muitas destas entidades ancestrais mais longínquas (como os Orixás por exemplo) não atravessou o Atlântico, e isso contribui para que a figura dos caboclos representasse essa nova ancestralidade, uma vez que o culto das religiões afro brasileiras fora trazido pelos escravos de maneira trágica e como mostra a autora, o escravo por si só, era um indivíduo sem direito a ancestralidade ou laços parentais.

Segundo o texto, na maioria das casas de Candomblé, há o culto aos caboclos, por mais que as práticas se tornem distintas em alguns pontos, de acordo com o contexto. A exceção mostrada, exemplifica uma única mãe de santo da nação Jeje, que se recusava a cultuar os caboclos sob o pretexto de sua casa ser de origem excepcionalmente africana. Em algumas casas acontece justamente o contrário, os caboclos por conta de seu aspecto divino, são trazidos mais ao centro dos ritos, ao passo em que as divindades maiores de ancestralidade africana são cultuadas apenas por respeito, mas são consideradas mais distantes. O culto aos caboclos chegou a ser malvisto até mesmo dentro do próprio candomblé, por conta de sua posição inferior no panteão, sua ancestralidade não africana e principalmente por seus aspectos humanizados como vicio em cigarro e bebidas, além de exigência de práticas com restos mortais (como é exemplificado no próprio texto).

Dentro do candomblé não há uma ortopraxia[5], ou seja, os costumes e tradições existem e são passados adiante, porém não de forma uniforme e imutável, isso se deve a vários fatores, dentre eles as varias nações existentes no contexto principalmente baiano. Essas nações surgem quando os escravos das mais variadas etnias são trazidos para o Brasil e dispostos aleatoriamente no território de forma que se unem para assim serem mais fortes, e ainda manter vivo uma serie de costumes, idiomas, práticas, religiões e etc., basicamente uma forma de resistência. Porem com o fim da escravidão, essas nações acabam perdendo seu motivo de existência, e tornam-se gradativamente identidades religiosas. Durante o período de reconstrução africana, segundo a autora, não era de bom tom misturar as divindades, buscavam as raízes de seu continente e os caboclos não eram originados da África, mas conforme as nações se constroem nessa perspectiva religiosa, os caboclos vão conseguir seu espaço. Outro fator que faz com que o candomblé não seja praticado uniformemente, é a própria presença das entidades nos cultos. Durante seus rituais as entidades podem vir ao mundo físico por meio da incorporação, falar pela boca do hospedeiro e dizer suas próprias vontades, diferentemente da ortodoxia cristã, na qual os adeptos estão, na maioria das vezes, presos a interpretações de escrituras e/ou fatos subjetivos. Vale ainda ressaltar a predominância da oralidade como forma de disseminação das religiões afro brasileiras, o que gera várias mudanças em suas práticas de acordo com a região onde se encontra, porem não significa dizer que essas alterações, tornam menos validas as vertentes variantes, muito pelo contrário, apenas reafirma a sua multiplicidade e sua capacidade de adaptação nos mais diversos contextos.

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