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Teste para Recursos

Por:   •  21/9/2016  •  Resenha  •  1.250 Palavras (5 Páginas)  •  171 Visualizações

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   Quando começou a escrever ficção, Tolkien tinha como ambição criar "uma mitologia para a Inglaterra". No final das contas, ele conseguiu realizar a algo bem mais grandioso: uma nova mitologia para o mundo inteiro.
 Tolkien era a pessoa certa para a tarefa por causa de sua formação. Como professor na Universidade de Oxford, sua especialidade era a filologia, uma espécie de arqueologia linguística e literária.
   Uma das funções da filologia é entender como as línguas evoluem. As pesquisas filológicas, que começaram a ganhar nome ao longo do século 19, também permitiram outro tipo de arqueologia: o entendimento cada vez maior de línguas e literaturas muito antigas ou quase "perdidas". E foi com isso que ficou tenso para Tolkien. Graças às técnicas filológicas, 0textos antes difíceis, obscuros ou mesmo ilegíveis passaram a ficar mais claros. Isso chamou a atenção para as narrativas antigas que possuem passagens praticamente escondidas para olhos modernos: a Bíblia, os épicos de Homero e - o mais importante para Tolkien - a literatura medieval do norte europeu. Ele descobriu esses textos entre o fim do que hoje seria o ensino médio e o começo da faculdade. Acabou levando nota baixa nas matérias que cursava em Oxford por causa de seu encanto por essas histórias estreladas por guerreiros orgulhosos, mulheres "belas como elfas", anões vingativos e, as vezes, algum dragão e seu tesouro.

A principal característica dessas narrativas medievais que inspiraram Tolkien é o fato de serem poucas as que sobreviveram. No caso da Inglaterra do começo da Idade Média, a história é bemséria. Há um único grande poema épico que chegou até nós - Beowulf, a saga de um guerreiro que enfrenta ogros assassinos e um dragão. Enquanto na Islândia algumas histórias ainda falavam sobre deuses (como Odin e Thor) e criaturas sobrenaturais, porém, nada disso ficou preservado em inglês antigo.

Isso acabou deixando Tolkien com uma sensação de vazio cultural, como ele explicou numa carta que enviou a um editor na tentativa de emplacar um de seus livros. "Desde meus primeiros dias, eu me entristecia com a pobreza de meu próprio e adorado país: ele não tinha histórias suas (ligadas à sua língua e ao seu solo), não da qualidade que eu buscava e achava (como um ingrediente) em lendas de outras terras. Havia lendas gregas e célticas, latinas, germânicas, escandinavas e finlandesas; mas nada inglês, exceto coisas empobrecidas de livros de segunda mão", escreveu ele.

As histórias do rei Arthur e da Távola Redonda não contam pois como Tolkien disse "Sua naturalização [como lendas inglesas] é imperfeita". Sem dúvidas, as lendas arturianas provavelmente tiveram seus começos entre populações celtas, que falavam galês, e que celebravam justamente a luta desses moradores nativos da Grã-Bretanha contra os anglo-saxões - invasores vindos do norte da Alemanha que, na vida real, conquistaram a Grã Bretanha e se tornaram os ancestrais dos ingleses modernos.

Pior, quem realmente popularizou as histórias do rei Arthur foram escritores medievais franceses. E, que aparentemente, foi justamente a influência cultural da França que acabou soterrando as lendas e a literatura dos anglo-saxões depois do ano de 1066, quando Guilherme, o Conquistador invadiu e dominou a Inglaterra. Durante os 300 anos seguintes, a língua e a cultura da elite do país ficaram totalmente afrancesadas, e a memória da cultura anglo-saxã sumiu - a ponto de até pouco tempo atrás haver dúvidas sobre se houve mesmo uma cultura anglo-saxã na ilha.

Mas Tolkien e outros filólogos da época tinham confiança de que ela existiu, sim, um dia, até porque Beowulf e os outros poucos poemas anteriores a 1066 possuíam referências a personagens e histórias que apareciam em textos da Alemanha e da Escandinávia.

Em seu livro “The Road to Middle-earth”, Tom Shippey diz que a ficção de Tolkien é uma tentativa de reconstruir esses cacos num conjunto bem organizado, que fizesse sentido e contasse uma grande história mitológica.Sem dúvidas, é o que o filólogo-escritor parece ter feito, começando com a criação do mundo, no conjunto de textos publicado com o título de “O Silmarillion” após a morte dele. Tolkien nunca conseguiu concluí-lo da maneira que queria, mas não há dúvidas sobre as intenções do autor para a obra. A principal característica do majestoso mito da criação que inicia o livro é a tentativa de casar figuras parecidas com deuses pagãos com a ideia de que existiria um único Deus com D maiúsculo.

Esse Deus, Eru Ilúvatar, no começo era um grupo de seres semelhantes aos anjos bíblicos, mas com um papel bem mais ativo: seriam responsáveis por colocar em prática o plano divino para o Universo e governar a Terra em nome do Criador. É claro que o poder acabaria subindo à cabeça de um desses "vices" cósmicos, que se rebela contra Deus. Trata-se de Melkor, a versão tolkieniana do Diabo. Essa figura satânica foi o mestre de Sauron, o vilão de O Senhor dos Anéis. Um dos motivos pelos quais a saga supera em complexidade todas as demais mitologias é justamente a maneira como autor arquitetou todo o processo de transmissão dessas histórias de uma geração para outra. O primeiro truque que o filólogo usou para isso parece loucura: fingir que ele não escreveu os livros, só os traduziu a partir de manuscritos antigos. O Senhor dos Anéis e O Hobbit seriam, pela lógica tolkieniana, apenas a tradução do "Livro Vermelho do Marco Ocidental", manuscrito que reuniria as memórias dos hobbits Bilbo, Frodo e Sam - J.R.R. realmente afirma isso nos livros. Tolkien sabia muito bem como os manuscritos medievais do mundo real juntam várias versões diferentes do mesmo livro, incluindo coisas como erros de ortografia, modificações feitas de propósito pelos escribas, anotações feitas nas margens etc. O escritor tomou proveito desses detalhes para resolver uma pequena inconsistência entre O Hobbit e O Senhor dos Anéis..

Tolkien conciliou as duas versões no prólogo de O Senhor dos Anéis, dizendo que havia variantes do manuscrito escrito por Bilbo. Algumas cópias preservavam a versão "boazinha" da história - que o hobbit, já influenciado pelo Anel, inventou para afirmar que Gollum teria lhe dado o artefato de livre vontade.

Outro fator importante para a utopia de que os textos da Terra-média são uma mitologia "de verdade", com milhares de anos, e não a criação de um autor único ao longo de algumas décadas, é a maneira dedicada como Tolkien reciclava as próprias histórias. Acontece que as narrativas mais importantes de sua mitologia possuíam inúmeras versões: algumas mais curtas, outras mais longas, às vezes em prosa, outras vezes na forma de poesia (com centenas de versos).

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