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A Essência dos Dez Mandamentos

Por:   •  4/6/2019  •  Resenha  •  1.550 Palavras (7 Páginas)  •  194 Visualizações

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As personagens de Ingmar Bergman quando não nos constrangem, tratam de nos aterrorizar. Talvez isso se dê pela densidade de consciência que ele impregna suas personagens. Sua obsessão em inserir gestos pontuais, cortes, elipses e close-ups do rosto, são recursos particulares da obra bergmaniana. Além do discurso que mais parecem de micro monólogos, vertidos a sua maneira para o cinema. A subjetividade na obra de Bergman instala-se em toda articulação discursiva, e se conecta com a composição da fotografia, urdida de significados polissêmicos. Bergman desenvolve a gramática das imagens para tratar de sentimentos e ideias.

Ao ler o livro O ovo da Serpente (tradução de Per Johns) e assistir a película, pude fazer algumas comparações da tessitura textual com a materialidade fílmica. Fica claro que Bergman consegue ter o poder de sintetizar a sua própria linguagem literária com a linguagem cinematográfica. Porquanto, surpreende-nos pensar que a obra literária em nada diminui a transposição para a película, é antes um registro que se complementa e ganha materialidade visual. Ainda assim, posso dizer que são duas obras distintas, pois, Bergman nos faz crer que já tinha tudo projetado como verdade em seu mundo imagístico.

Sua experiência na misancene teatral é transubstancial de modo único para à atmosfera do cinema. A construção de suas imagens quando excedia o poder de síntese produziam formas polifônicas carregadas de reflexões estética. Um gênio!

Sintetizar pensamentos e sentimentos articulados a partir de construções de cenas que despretensiosamente não manipulam ou direcionam o olhar de quem as assistem. Pelo contrário, apenas liberta o espectador para encontrar aquilo que não está dado, deixando à mercê do interpretante poder revelar a intersubjetividade de suas personagens. Aquilo que não está visível na cena subentende-se que somente o inconsciente poderá desanuviar as avantesmas presentes na obra bergmaniana. É preciso ser empático para não se tornar impermeável, pois sua arte é uma obra aberta. Bergman mantem em segredo aquilo que não pode ser dito em palavras. Assim como na vida existem coisas para as quais não existem palavras para dar significado, Bergman as diz no cinema. São segredos inauditos, porém compreendidos, ainda que não consigamos decodificar por completo, pois não há a manipulação do olhar do espectador. Cabe-nos codificar e decodificar o que Bergman quer que compreendamos. Está tudo lá! Basta deixar absorver a gama específica de sentimentos e expressões, e mergulhar no seu universo obcecado em dissecar o drama humano.

Em toda sua obra as personagens precisam tomar decisão sobre algo, uma tarefa extremamente problemática para a modernidade niilista. Talvez seja essa a tarefa mais árdua das personagens de Bergman, as quais tem aversão em arriscar confrontar as incertezas da vida imbuídas por dramas psicológicos que carregam em si a consciência existencial e ontológica do próprio ser. São abordadas em suas obras questões entranhadas em como a mortalidade, a solidão, a angustia, o desespero e a fé.

A obra O ovo da serpente ambientada na Alemanha anos antes da ascensão de Adolf Hitler ao poder, aborda-nos de maneira minuciosa, como as personagens vão revelando o quebra-cabeça de acontecimentos que se estenderão mais tarde nos experimentos dos Campos de Concentração em Auschwitz. A intriga do livro consegue nos mantem em total tensão do início ao fim. Todavia, os experimentos macabros que Bergman tem a nos revelar, não é em si o grosso da obra, e aqui, farei um breve esboço do que podemos compreender do genial Ingmar Bergman.

Já no primeiro capítulo, podemos vislumbrar a construção da ambientação sensorial em que Bergman nos introduz de forma bastante objetiva, porém nada confortável. A história inicia de forma sutil e bastante sensorial.

|“É tarde da noite, Abel Rolsemberg, um artista de circo, numa noite de novembro de 1923, em que um vento cortante sopra. Abel Rolsemberg encontra-se embriagado. Correndo contra o vento, deseja chegar em seus aposentos e descansar, mas não sem antes contemplar na sala de jantar do segundo andar, uma festa familiar onde se ouvem gritos, risadas e músicas. Um cheiro forte, mas incomum, se espalha por todo o andar. Ele se desloca para o aposento, onde sente novos odores pelo corredor, agora o cheiro de fumaça e de chão de terra. Procura com dificuldade o buraco da chave. Entra no quarto. A luz do teto está acesa. É uma lâmpada de fraca intensidade sob um quebra-luz de porcelana com uma fímbria de contas. O irmão de Abel, Max, está sentado na cama desfeita. Ele deu um tiro em si mesmo, através da boca. A parte posterior de sua cabeça foi feita em pedaços. A cama e a parede estão coalhadas de sangue e miolos. Ele Está inclinado para trás, com os olhos semicerrados e a boca aberta. Continua segurando a pistola militar, bem apertada. O barulho e a música erguem-se da sala de jantar abaixo.”|

Sutilmente, Bergman parece ampliar o campo sensorial de Abel Rosemberg, mesmo em estado de embriagues. Percebe-se no decorrer do livro, que Abel se encontra apático com o que lhe ocorre, a não ser quando se entregar aos vícios mais corriqueiros: álcool, tabaco e sexo.

Posto isto não por acaso, farei algumas modéstias divagações em que aspiro compreender melhor o universo bergaminiano. E, se possível for, enriquecer nossa analise sobre a obra em pauta.

Há na obra de Bergman, e não é novidade, uma forte relação com o filósofo Soeren Kierkegaard, o qual, embora tenha um século de vida de diferença de Ingmar Bergman, contudo, parece ter forte influenciada na obra do dramaturgo e cineasta.

Para Kierkegaard, o ser humano é um ser profundamente relacional e por isso, deve tomar decisões concretas, o que lhe é uma tarefa um tanto problemática.

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