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A Reforma da Assistência Psiquiátrica

Por:   •  2/7/2017  •  Resenha  •  6.634 Palavras (27 Páginas)  •  302 Visualizações

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Reforma Psiquiátrica

          A Reforma da Assistência Psiquiátrica brasileira é um processo histórico, de caráter político, social e econômico, que engloba transformações culturais, mudança no paradigma do cuidado e vem tornando válido juridicamente as conquistas no Campo da Saúde Mental (Gonçalves e Sena, 2001; Alves e Guljor, 2004). Compreendida como um conjunto de transformações de práticas, saberes, valores culturais e sociais, é no cotidiano da vida das instituições, dos serviços e das relações interpessoais que o processo da Reforma da Assistência Psiquiátrica avança, marcado por tensões, impasses, conflitos e desafios (Brasil, 2005).

         A Reforma no Brasil data pouco mais de trinta anos, surge a partir da conjuntura da redemocratização (Tenório, 2002) e, segundo Amarante (1995a).

         Na segunda metade da década de 1970 emergem as críticas à ineficiência da assistência pública em saúde e ao caráter privatista da política de saúde (Tenório, 2001b). Surgem denúncias, reivindicações e críticas feitas por ‘bolsistas’ profissionais que atuavam em hospitais da Divisão Nacional de Saúde Mental do Ministério da Saúde situado no Rio de Janeiro. Esse movimento de denúncias, que parecia restrito ao Rio de Janeiro, tem repercussão nacional, sendo a questão divulgada e debatida na imprensa e no interior de entidades expressivas da sociedade civil, pois a violência das instituições psiquiátricas “é entendida dentro da violência cometida contra os presos políticos, os trabalhadores, enfim, os cidadãos de toda espécie” (Amarante, 1995a, p.90).

          Para Amarante (1995b), o Movimento de Trabalhadores em Saúde Mental é o primeiro movimento em saúde com a participação popular, passando a ser identificado como um movimento de luta popular no campo da saúde mental. Esse movimento tinha como objetivo representar um espaço de luta não institucional, um local de debate e encaminhamento de propostas comprometidas com as mudanças do modelo de assistência psiquiátrica vigente no país.

           Delgado (1992b) sinaliza três eventos políticos que delimitaram os contornos desse movimento de inflexão com crítica à mercantilização da loucura e ao obstáculo representado pelo modelo hospitalocêntrico: V Congresso Brasileiro de Psiquiatria em 1978, o I Congresso Brasileiro de Trabalhadores de Saúde Mental em 1979 e o III Congresso Mineiro de Psiquiatria em 1979, que teve a presença de Franco Basaglia e Robert Castel. Importante salientar que esses acontecimentos tiveram início em um momento de transição política, de articulação da sociedade civil que passava por um regime de Ditadura Militar.

            O Movimento de Luta Antimanicomial apontou como premissa fundamental a reorganização dos serviços e práticas de saúde mental. Em 1988, é promulgada a nova Constituição da República do Brasil, que “considerou a saúde um direito de todos, sendo dever do Estado assegurar o acesso universal e igualitário às medidas e serviços destinados à promoção, proteção e recuperação da saúde (artigo 196)” (Desviat, 1999, p.145). Esses acontecimentos marcam o início da trajetória de desconstruir no cotidiano das instituições e da sociedade as formas de lidar com o transtorno mental (Tenório, 2002).

             A Reforma Psiquiátrica brasileira apresenta como diretriz a desinstitucionalização que não significa apenas desospitalização, mas desconstrução, superação de um modelo centrado no tratamento da doença, buscando criar possibilidades para que os sujeitos ‘em’ sofrimento psíquico possam enfrentar os desafios na superação da exclusão em que vivem (Nogueira, 2007; Amarante, 1995b).

            Em 06 de abril de 2001, foi aprovada a Lei 10.216, conhecida como Lei da Reforma Psiquiátrica, que apresenta como objetivos prioritários a reorientação e substituição progressiva do modelo hospitalocêntrico e a afirmação da compatibilidade entre cidadania do ‘louco’ e tratamento, tendo como norte ético a autonomia possível dos pacientes e familiares (Carvalho, 2001; Delgado, 2001).

             A Lei 10.216, relaciona o direito das pessoas com transtornos mentais, reforçando a inclusão social delas, estabelecendo uma diretriz não asilar para o funcionamento público e o ordenamento jurídico da assistência psiquiátrica brasileira. Em seu artigo 5º, a Lei coloca que deve haver elaboração de “política específica de alta planejada e reabilitação psicossocial assistida” para “o paciente há longo tempo institucionalizado” e para as situações de “grave dependência institucional”.

            Para Tenório (2002), a criação de alternativas consistentes e a desconstrução do circuito manicômio-dependente são as duas variáveis de que depende a progressiva extinção dos manicômios no Brasil. Em 2002, teve início à avaliação dos hospitais psiquiátricos por meio do Programa Nacional de Avaliação dos Serviços Hospitalares (PNASH), pela Portaria GM 251. Esse programa estabelece diretrizes e normas para a assistência hospitalar em psiquiatria, com o objetivo de reestruturá-la e buscar uma nova configuração formada por hospitais. E em 2004 é instituída pelas Portarias GM nº 52 e 53 o Programa Anual de Reestruturação da Assistência nos Hospitais Psiquiátricos no SUS (PRH), que tem como estratégia uma progressiva redução dos leitos nos hospitais psiquiátricos. O processo de desinstitucionalização teve um forte impulso com a implantação dessas portarias, permitindo que um grande número de leitos, inadequados às exigências mínimas de qualidade assistencial e respeito aos direitos humanos, fosse retirado do sistema, contudo, sem acarretar desassistência para a população (Brasil, 2005).

              A questão crucial da desinstitucionalização está na progressiva devolução à comunidade da responsabilidade em relação aos seus doentes e seus conflitos, substituindo uma psiquiatria centrada no hospital por uma psiquiatria sustentada em dispositivos diversificados, abertos e de natureza comunitária ou territorial (Tenório, 2002; Delgado, 1992). A desinstitucionalização é um processo técnico, administrativo, jurídico, legislativo ou político, e “acima de tudo, um processo ético, de reconhecimento de uma prática que introduz novos sujeitos de direitos e novos direitos para os sujeitos” (Amarante, 1995b, p.494), construindo possibilidades concretas de sociabilidade.

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