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Educação escolar brasileira em produção

Seminário: Educação escolar brasileira em produção. Pesquise 860.000+ trabalhos acadêmicos

Por:   •  24/11/2014  •  Seminário  •  3.140 Palavras (13 Páginas)  •  260 Visualizações

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A educação escolar brasileira em produção

Há muito se ressalta, no Brasil, a importância de discussões que abordem a educação escolar para além das suas determinações mais diretas, que emanariam da própria política educacional, em sentido estrito. Não se quer dizer, com isso, que os estudos mais focados sobre política educacional tenham um valor menor, mas apenas alertar para a insuficiência dessa delimitação para a compreensão, em profundidade, das particularidades assumidas pela educação escolar ante os modos de configuração das relações econômicas, políticas e culturais, em um dado contexto histórico e territorial. Essas são, afinal, as relações que produzem as formas concretas de educação escolar com as quais nos deparamos. Por isso, no plano da investigação, da análise e da exposição, não podem ficar limitadas a tópicos meramente introdutórios; precisam ser também acionadas como elementos centrais na construção de momentos, escalas e percursos de abordagem, sem os quais a apreensão da realidade educacional em sua complexidade fica impossibilitada.

O livro Fundamentos da educação escolar do Brasil contemporâneo, organizado por Júlio César França Lima e Lúcia Maria Wanderley Neves, da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV), da Fundação Oswaldo Cruz, traz uma inestimável contribuição a essa forma de abordagem da questão educacional. Elaborado no contexto das comemorações dos 20 anos de existência da EPSJV, apresenta ao leitor uma coletânea de artigos que, escritos por intelectuais largamente reconhecidos em suas áreas, tratam com profundidade e de forma encadeada dos elementos estruturais da vida política, econômica e social a partir dos quais se formam, historicamente, relações, condições e valores que persistem como "elementos ativos" na produção da nossa educação escolar, definindo seus traços constitutivos centrais e, conseqüentemente, os principais desafios para o pensamento e a ação comprometidos com sua transformação.

Para que sejam compreendidos aspectos importantes de sua forma, de seu conteúdo e de sua relevância, cabe registrar que se trata de um livro inscrito em um processo formativo de longo prazo realizado por professores e pesquisadores da EPSJV, já que, desde sua criação, em 1985, essa escola realiza numerosas atividades de estudos e debates com o objetivo de subsidiar a formulação e a implementação de seus cursos, pautados pela proposta de integração efetiva entre formação geral e formação técnico-profissional. Essa prática sistemática de estudos e debates tem propiciado a consolidação da interlocução e a participação orgânica de professores e pesquisadores da EPSJV em variados espaços de discussão e formulação de políticas públicas de educação e de saúde, enriquecendo as experiências e ampliando os canais de contato desses profissionais com a realidade concreta para a qual se dirige seu trabalho.

Por isso, é também importante ressaltar o quanto essa experiência de estudos e discussões em "duplo registro" - educação e saúde - tende a contribuir para o rompimento das fronteiras setoriais que persistem no debate da questão social brasileira. A setorialização da discussão dos problemas implicados com a erosão das condições coletivas de vida, no atual contexto, bem como a fragmentação das lutas em torno dos direitos sociais, acaba concorrendo para manter a pauta político-social dos países periféricos como uma "questão menor", soterrada pela presença totalitária da pauta econômica mundializada.

Sabemos que não há como discutir, hoje, qualquer aspecto da questão social brasileira - incluindo-se aqui as verdadeiras sagas constituídas em torno do acesso a direitos elementares, como à moradia, à educação e à saúde- sem se levar em conta que a inserção subordinada do Brasil nas relações capitalistas envolve, inevitavelmente, a produção de formas particulares de organização das relações e das práticas econômicas e políticas que repercutem negativamente em nossa formação societária e na organização das bases jurídicas e institucionais que sustentariam, ao longo de nossa história, as práticas de direitos. É exatamente esse o ponto de partida do debate, proposto no ensaio de Miriam Limoeiro Cardoso, "Sobre as relações sociais capitalistas".

Recuperando as formulações fecundas de Florestan Fernandes a respeito da especificidade histórica brasileira, Cardoso mostra que, sob o "capitalismo dependente", as forças sociais têm sua formação e seu peso nas relações sociais intensamente mediados pelos interesses instrumentais de inserção subordinada do país no processo de expansão capitalista. A permanente atualização desses interesses, por sua vez, implica a tendência à reiteração de formas de dominação que dificultam ao máximo quaisquer modificações substantivas nas correlações de forças. Por isso, essas diferenças de peso entre as forças sociais passam a corresponder, permanentemente, a graves assimetrias de participação político-social, que acabam por expressar-se também no desenho dos direitos sociais, atingindo desde sua forma jurídica até a configuração das políticas a eles referidas.

A persistência dessas assimetrias na definição dos mais elementares aspectos da vida social, no Brasil, bem como suas atualizações no atual contexto de mundialização da economia, constituem elementos centrais para a compreensão de uma forma histórica da escola brasileira, cujo processo de expansão atravessa mais de um século sem abalos significativos na sua tendência à precariedade e à manutenção de padrões diferenciados de acesso ao conhecimento para os diferentes grupos sociais. Por isso, a compreensão dos desafios analíticos e políticos aí inscritos envolve sua consideração a partir de diversos ângulos complementares.

Tratando-se de uma sociedade cuja inserção nos novos processos econômicos e políticos não implica, necessariamente, a eliminação de antigas dependências, mas, ao contrário, determina sua atualização instrumental, fazendo renascer antigas relações centro-periferia, cabe atenção especial tanto à nossa história particular, como à própria história geral do capitalismo. Como mostra Cardoso, retomando Marx, Althusser e Foucault, o entendimento das forças em confronto no presente requer atenção aos "mecanismos de dominação, administrados por diferentes tecnologias de poder e inculcados nos diversos aparelhos ideológicos do Estado" (p. 43), engendrados ao longo da consolidação do capitalismo. Tratando-se, porém, de discutir a realidade, não para lamentá-la, mas para discernir os desafios nela implicados, cabe não perder de vista, no passado

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