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Cidadania

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Por:   •  21/3/2015  •  6.908 Palavras (28 Páginas)  •  186 Visualizações

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Civitas Porto Alegre v. 6 n. 1 jan.-jun. 2006 p. 39-58

A atualidade

de T. H. Marshall no estudo

da cidadania no Brasil

Lea Guimarães Souki*

Introdução

O tema da cidadania já é bastante estudado no Brasil, no entanto, em muitas

circunstâncias, não é abordado com a devida clareza, na medida em que o

conceito mescla-se com a atividade política. O que aqui se pretende enfatizar

são pressupostos que, sob o meu ponto de vista, estão contidos no trabalho de

T. H. Marshall e que poderiam ser objeto de debate no estudo da cidadania no

Brasil. Trata-se, especialmente, de explorar uma possível presença de uma

espécie de rationale das classes dominantes em relação à tolerância acerca da

desigualdade no caso inglês. Haveria implícito no trabalho de Marshall o esboço

de um projeto de nação das classes dominantes inglesas em relação à quantidade

de desigualdade compatível com o que concebem como vida civilizada?

O trajeto a ser seguido na argumentação é o seguinte. Em primeiro lugar,

um esclarecimento sobre os conteúdos, empíricos e normativos que delineiam o

conceito de cidadania no Brasil. Em segundo lugar, a consideração de um dos

* Doutora em Sociologia Política pela UnB, professora titular no PPG em Ciências Sociais na

PUC-MG; áreas de pesquisa: cidadania, metrópole. Mail: leaguim@terra.com.br.

40 Civitas – Revista de Ciências Sociais, v. 6, n. 1, jan.-jun. 2006

aspectos teóricos mais relevantes considerados por T. H. Marshall, a saber, a

tensão existente no próprio conceito entre os princípios de direitos iguais e a

desigualdade contida na ordem capitalista. Finalmente, coloca-se a questão se

se pode inferir, no caso do Brasil, a inexistência, do ponto de vista das classes

dominantes, de um cálculo ou até mesmo de uma preocupação sobre o quanto

de desigualdade seria tolerável como parte da construção da nação.

O conceito e a atividade política

Para realçar os aspectos que considero relevantes, inicio a discussão procurando

esclarecer o que o conceito não é. Como já foi afirmado anteriormente,

o conceito se confunde com a atividade política. O primeiro ponto a

chamar a atenção é sua reificação como se a cidadania tivesse corpo visível e

material e fosse, ao mesmo tempo, capaz de ter vida própria (Carvalho,

1998). Afirmações como, por exemplo, “a cidadania reagiu favoravelmente a

tal candidatura ou deixe a cidadania chegar ao seu bairro, a cidadania não

tolerará tal coisa” e dezenas de outras formulações similares revelam um

conceito carregado de conteúdos e projeções. Esta espécie de ficção, do ponto

de vista teórico, traz alguma obscuridade ao conceito e o impregna de senso

comum e estereotipia que, embora seja compatível com a atividade política,

não favorece a sua precisão conceitual nem tampouco a sua compreensão.

O segundo ponto é o de que cidadania não é sinônimo de democracia,

pois, embora guardem nexos estreitos entre si, esses dois conceitos revelam

amplitudes diferentes. Tomando apenas o contexto da transição à democracia

no Brasil, podendo também ser incluídos outros países da América Latina nos

anos de 1980 e da Europa Meridional nos anos de 1970, o discurso político

do início desse período esteve impregnado da idéia de cidadania. As oposições

à ditadura tomaram este discurso para afirmar direitos antes interditados,

assim como para se diferenciar dos setores de oposição que teriam adotado a

confrontação armada no período anterior. A idéia de luta pela conquista da

cidadania procurava afirmar, dentro da legalidade institucional, tudo o que se

teria direito como país civilizado sem colocar em xeque a ordem estabelecida.

Nesse contexto, ela também continha a bandeira da defesa de direitos,

bem como a idéia de civilidade, enquanto cumprimento das obrigações do

Estado e dos indivíduos.

L. G. Souki – A atualidade de T. H. Marshall no estudo da cidadania no Brasil 41

Um terceiro conteúdo confundido com cidadania situa-se historicamente

no momento seguinte à transição democrática, quando cidadania passou a ser

sinônimo de empowerment. Este conteúdo de empoderamento e fortalecimento

da sociedade civil coincidia com as novas experiências da esquerda à frente de

funções executivas no plano local, contando com a adesão dos setores da sociedade

civil potencialmente participativos. Estes setores ativos da sociedade, participantes

das políticas públicas como objeto e, às vezes, como sujeito, reivindicam,

além de serviços, também bens simbólicos. Nesse sentido, pode-se dizer

que as exigências

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