TrabalhosGratuitos.com - Trabalhos, Monografias, Artigos, Exames, Resumos de livros, Dissertações
Pesquisar

Cidade de Muros Crime Segregação e Cidadania em São Paulo” de Teresa Pires do Rio Caldeira

Por:   •  6/12/2018  •  Resenha  •  2.972 Palavras (12 Páginas)  •  439 Visualizações

Página 1 de 12

Livro: “Cidade de Muros - Crime, segregação e cidadania em São Paulo” de Teresa Pires do Rio Caldeira.

  • Resumo do capítulo 7- ENCLAVES FORTIFICADOS: ERGUENDO MUROS E CRIANDO UMA NOVA ORDEM PRIVADA

Os condomínios fechados constituem o tipo mais desejável de moradia para as classes altas em São Paulo hoje em dia, porém, não são um fenômeno isolado, mas a versão residencial de uma nova forma de segregação nas cidades contemporâneas.

Os condomínios fechados são a versão residencial de uma categoria mais ampla de novos empreendimentos urbanos que a autora chama de enclaves fortificados. Os enclaves fortificados incluem conjuntos de escritórios, shopping centers, e cada vez mais outros espaços que têm sido adaptados para se conformarem a esse modelo, como escolas, hospitais, centros de lazer e parques temáticos. São propriedade privada para uso coletivo e enfatizam o valor do que é privado e restrito ao mesmo tempo que desvalorizam o que é público e aberto na cidade. São fisicamente demarcados e isolados por muros, grades, espaços vazios e detalhes arquitetônicos. São voltados para o interior e não em direção à rua, cuja vida pública rejeitam explicitamente. São controlados por guardas armados e sistemas de segurança, que impõem as regras de inclusão e exclusão. São flexíveis: devido ao seu tamanho, às novas tecnologias de comunicação, organização do trabalho e aos sistemas de segurança, eles são espaços autônomos, independentes do seu entorno, que podem ser situados praticamente em qualquer lugar. Embora tendam a ser espaços para as classes altas, podem ser situados em áreas rurais ou na periferia, ao lado de favelas ou casas autoconstruídas. Os enclaves privados e fortificados cultivam um relacionamento de negação e ruptura com o resto da cidade e com o que pode ser chamado de um estilo moderno de espaço público aberto à livre circulação. Eles estão transformando a natureza do espaço público e a qualidade das interações públicas na cidade que estão se tornando cada vez mais marcadas por suspeita e restrição.

A transformação dos enclaves fortificados em espaços de prestígio exigiu algumas mudanças importantes nos valores das classes altas. Primeiro, residências coletivas passaram a ser preferidas a residências individuais. Os valores de privacidade, liberdade individual e família nuclear embutidos na casa independente sustentaram tanto a guerra contra os cortiços quanto a difusão da casa própria entre as camadas trabalhadoras. Segundo, áreas isoladas, não urbanizadas e distantes foram transformadas em espaços mais valorizados do que os tradicionais bairros centrais e com boa infraestrutura. Essa mudança requereu a inversão dos valores que haviam prevalecido dos anos 40 até os 80, quando o centro era inequivocamente associado aos ricos e a periferia, aos pobres. Pela primeira vez algo como o subúrbio americano tornou-se popular entre a elite, e a distância do centro foi resignificada para conferir status em vez de estigma.

Os condomínios existem desde 1928 em São Paulo. Embora tenha levado um bom tempo para perderem o estigma de cortiço e se tornarem populares entre a classe média, os apartamentos se. generalizaram a partir dos anos 70, dadas as mudanças nos financiamentos e o boom de construções que se seguiu. Apesar do antigo tipo de apartamento continuar a ser construído e ter expandido seu mercado até para as camadas trabalhadoras, os empreendimentos mais sofisticados e caros são de um outro tipo. Uma diferença é a localização: enquanto nos anos 70 os prédios residenciais ainda estavam concentrados nos bairros centrais, os condomínios fechados da década de 90 tendem a se situar em áreas distantes. Segundo, os condomínios fechados são por definição murados, enquanto os edifícios dos anos 70 costumavam ser abertos para as ruas. Embora a maioria destes tenha sido cercada recentemente, o isolamento não era parte de sua concepção inicial, mas sim uma adaptação ao novo paradigma. Terceiro, o novo tipo de condomínio fechado costuma ter grandes (algumas vezes muito grandes) áreas e equipamentos de uso coletivo, enquanto na geração anterior os espaços comuns limitavam-se geralmente a garagens, áreas de circulação, pequenos playgrounds e talvez um salão de festas.

Enquanto os condomínios dos anos 70 eram basicamente prédios de aparta~ mentos, nos anos 90 eles podem ser de dois tipos: vertical ou horizontal. Os primeiros são geralmente uma série de edifícios em grandes áreas com vários equipamentos de uso coletivo, e são o tipo predominante em São Paulo. Os últimos consistem em uma série de casas- este tipo predomina nos outros municípios da região metropolitana. As casas são geralmente construídas pelos próprios proprietários, não pelos incorporadores, ao contrário do que é a regra nos Estados Unidos.

Os condomínios fechados brasileiros não são obviamente uma invenção original, mas partilham várias características com os CIDs (common interest developments ou incorporações de interesses comuns) e subúrbios americanos. No entanto, algumas diferenças entre eles são esclarecedoras. Primeiro, os condomínios fechados brasileiros são invariavelmente murados e com acesso controlado, enquanto nos EUA, os empreendimentos fechados (gated communities) constituem apenas cerca de 20% dos CIDs. Segundo, os tipos mais comuns de condomínios fechados em São Paulo ainda são os de prédios de apartamentos, e, apesar de poderem ser vendidos como um meio de escapar da cidade e seus perigos, ainda são mais urbanos do que suburbanos.

Os condomínios horizontais começaram a ser construídos no final dos anos 70, especialmente nos municípios adjacentes à capital na parte oeste da região metropolitana. Eles apresentam algumas interessantes diferenças em relação aos seus equivalentes americanos. Embora a homogeneidade social seja obviamente valorizada, a homogeneidade do projeto não o é: casas com a mesma planta e fachada são desvalorizadas e pouco comuns. Tradicionalmente, em São Paulo, casas padronizadas têm sido construídas para as camadas trabalhadoras e são desvalorizadas não só pela população em geral, como também pelas pessoas que não têm outra opção a não ser viver nelas. Os moradores fazem incríveis esforços para transformar suas casas e dar-lhes o que chamam de "personalidade", isto é, uma aparência individualizada. Essa rejeição da homogeneidade até entre pessoas que são parte de um mesmo grupo social pode estar relacionada ao fato de que na justificação ideológica dos condomínios fechados de São Paulo não há nenhuma referência positiva à ideia de comunidade, algo sempre invocado nos empreendimentos americanos.

...

Baixar como (para membros premium)  txt (19.4 Kb)   pdf (136.7 Kb)   docx (18.1 Kb)  
Continuar por mais 11 páginas »
Disponível apenas no TrabalhosGratuitos.com