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O Agradecimento especial a Rubens Espírito Santo

Por:   •  21/4/2023  •  Ensaio  •  28.592 Palavras (115 Páginas)  •  51 Visualizações

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Formigas famintas em fila

Sobre os poemas de Rubens

Espírito Santo


Agradecimento especial a Rubens Espírito Santo

Rubens,

Eu te agradeço por me ensinar a fazer estes livros[1] que fiz hoje. Estou tão feliz – você nem acredita – esta semana em particular, desde que voltei das férias. Agradeço inclusive por ter conseguido terminá-los – se você ver algum erro que eu não tenha visto, por todos os motivos que ainda estão impregnados na minha falta de visão, por favor me deixe saber que eu corrigirei com prazer.

Eu te agradeço por me obrigar a andar com passos lentíssimos – os quais eu nunca daria.

Eu te agradeço por me enviar personagens que falam através de imagens comigo – até porque você é, antes de tudo, como você sempre diz, um artista visual. Eu ainda não vejo as imagens que eles me mostram – mas só de conseguir olhar pelo buraco da fechadura, que é talvez a melhor metáfora do que seja meu olho hoje, já é incrível – mais do que isso seria letal para mim hoje.

Eu te agradeço por me falar que o Ezequiel[2]  não quer ser guiado por mim – é ele quem precisa me guiar. E você me lembra disso – existem, mesmo que eu não queira ou perceba, vontades sorrateiras em mim de achar que eu posso ensinar algo pro Ezequiel. Talvez essa vontade de guiá-lo tenha sido o que o matou – isso me entristece porque não quero matar quem pode me ensinar a viver nos minutos cruciais – aqueles em que estou sozinha.

Eu te agradeço por falar sobre meu poema hoje – eu não fico triste nunca com nenhuma crítica sua, ser criticada por você é uma honra mesmo e eu sou bastante privilegiada. Sei que minhas tentativas de poemas não estão – e nem poderiam estar – à altura do que é um poema de verdade,  como os seus – como os do Paul Celan, cujo livro vive na minha cabeceira. Dessas obras, pinga sangue – eu as vejo talvez como materializações de gratificação – como matéria que captura algo tão inesgotável e tão fugaz – porque você é feito mesmo dessa matéria – você é tão movediço, trágico e leve quanto ela – e sua obra tão eterna quanto ela – o que faz você ser também eterno – o que me faz entender porque eu penso em você todos os minutos e te sinto perto quando está longe – e vice-versa.

Eu te agradeço por me ensinar que a definição de um poema pode ser refeita diariamente. Por me mostrar que eles podem ser como aparelhos sísmicos que medem os terremotos que estão acontecendo na minha terra natal – e que talvez essa terra pode tentar ser móvel e ainda assim não deixará de ser minha – mas quem sabe, se Deus quiser, eu deixarei de me entender como sempre me entendi – e assim ser parte do mundo no qual a palavra minha não faça mais tanto sentido.

(Fiz uma digressão um pouco longa aqui, mas voltando à questão do poema...) Eu sei que três linhas perfeitamente escritas do Paul Celan, ou que suas frases cujas palavras comem umas às outras, como formigas famintas em fila que não carregam folhas para comerem – mas sim outras formigas – são talvez como o cume de uma montanha vital – frente a qual você me coloca, mesmo sabendo que eu não sei suportar o vento gelado que sobrevoa por ela.

Eu te agradeço por me fazer ver que o poema não se trata mesmo dele – mas precisa dele para respirar.

Eu te agradeço por me fazer questionar cada linha que escrevo – e não me importar se precisar jogar fora e escrever de novo.

Eu te agradeço por me obrigar a andar sobre terra movediça e ver que só posso andar se cair algumas vezes – e que cair não é impedimento para andar.

Eu te agradeço por ter hoje uma volição que mesmo que não possa ser satisfeita, já é maravilhoso de ter. Esta volição é a de – eu ainda não sei colocar em palavras – talvez a tentativa de ser escritora seja a de tentar escrever isso tão difícil – ansiar por um dia transparecer ou materializar ou ser esse movimento, essa embriaguez, essa felicidade melancólica, essa absurda ausência de palavras – mesmo quando eu as amo tanto – que me dá ao passar um dia perto do Rubens e dos discípulos, ao ler um poema do René Char, ao identificar nas palavras do Blanchot os desenhos incompreensíveis de Rubens e achar que ele está falando sobretudo de Res – eu anseio traduzir essa noção tão vital e letal ao mesmo tempo que tudo isso me dá.

Eu te agradeço por me dar gotas de bebidas misturadas – aquelas para as quais eu ainda não tenho paladar afinado o suficiente para degustar e por isso ainda me embriague e fique tonta – mas é a mesma mistura que um dia me fará estar sóbria. E é assim que eu gostaria de conversar com você: sóbria – falando sobre nada mais que a altura da saia das mulheres que passam pela rua.

Eu te agradeço por ter discípulos.

Eu te agradeço por olhar para mim.

Eu te agradeço por me fazer olhar para mim – e ver que não sou nada. E um nada bem diferente de todos os que já ouvi antes. É o que me faz estar tão feliz hoje.

Janeiro de 2018


Agradeço aos meus pais Edinalva e João

pela infinita compreensão, apoio incondicional e amor.


Os textos presentes neste livro, em sua grande maioria, foram escritos de abril de 2017 a abril de 2018 a partir de aulas de Rubens Espírito Santo no Atelier do Centro nas Aulas de Segunda, das aulas do Curso do Méthodo por Anna Israel e das aulas do curso Felipe Goes: Lições de pintura por Rubens Espírito Santo.


O poema quer ir ao encontro de um Outro,

precisa desse Outro, de um interlocutor.

Procura-o e oferece-lhe.

Paul Celan, O Meridiano


índice

PREFÁCIO: O que é escrever um poema?

INTRODUÇÃO: Por que escrever sobre textos de Rubens Espírito Santo?

SOBRE OS POEMAS DE RUBENS ESPÍRITO SANTO

Fora das Algibeiras

Uma casinha bordada na pele do seu pulso: A fuga da linguagem

é sinal de sua vinda

O fio da meada de uma locomotiva imóvel

Emboscada

A anáfora do homem e do touro        

Ser remoto de mim        

Um funil        

Dezesseis metros quadrados        

RELAÇÕES

O buraco: Madame Bovary Rubens e Espírito Santo        

...

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