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O Que é Literatura

Por:   •  10/5/2017  •  Artigo  •  1.535 Palavras (7 Páginas)  •  281 Visualizações

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Quando estudamos literatura nas escolas, principalmente quando se tem essa disciplina no ensino médio ou se o professor tem conhecimento suficiente para aplicar esta disciplina, a primeira pergunta que se vem cabeça é entender o que significa essa palavra tão presente na nossa vida e na nossa história. Aquele que se diz apto a responder sob uma única perspectiva pode cometer um equívoco muito grande. Por quê? Porquê por mais que ela tenha um objetivo, a literatura não possui uma definição simples ou única. Há muitas tentativas que visam defini-la, mas são definições que não a integram totalmente. Estranho, não?

Quando tive minha primeira aula de Estudos Literários, li um trecho de um livro de um escritor chamado Terry Eagleton, um filósofo e crítico literário britânico identificado com o marxismo. Em seu livro Teoria da literatura: uma introdução (1983), Eagleton mostra as possíveis definições que a literatura pode ter e também que nem sempre tais definições são completas.

A primeira definição que Eagleton mostra é a de escrita “imaginativa”, no sentido de ficção – escrita essa que não é totalmente verídica. O interessante é que se você for analisar aquilo que seria comumente literatura, essa definição não procede. A literatura inglesa do século XVII inclui Shakespeare, Webster, Marel e Milton, mas se entende ser da literatura ensaios de Francis Bacon, sermões de John Donne, a autobiografia espiritual de Bunyan e escritos de Sir Thomas Brownie, por exemplo. Logo, a distinção entre “fato” e “ficção” não nos parece muito útil e o motivo é que a distinção é também questionável. No inglês entre os séculos XVI-XVII a palavra novel (novela, romance) era usada, pelo menos assim parece, tanto para fatos quanto ficções, sendo que até notícias de jornal dificilmente poderiam ser consideradas fatuais. Não é sabido se romances ou notícias eram ora fatuais, ora fictícios. A distinção entre estas categorias simplesmente não era aplicada.  Além disso, se a “literatura” inclui muito do que é baseado em fatos reais, ela também acaba excluindo uma boa margem de ficção. As histórias em quadrinhos do Super-Homem e os romances de Mills e Boon são ficção, mas isso não faz com que sejam geralmente considerados como literatura e tampouco como “Literatura”.

Daí vem a segunda definição de Eagleton onde ele tenta completar a primeira. Para ele, a literatura seja definível não pelo fato de ser ficcional ou “imaginativa”, mas porque emprega a linguagem de forma peculiar, o que o crítico russo Roman Jakobson define como escrita que representa uma “violência organizada contra a fala comum”. A literatura transforma e intensifica a linguagem comum, afastando-se sistematicamente da fala cotidiana. Um exemplo inusitado é se alguém se aproximar de uma moça em um ponto de ônibus e disser: “Tu, noiva ainda imaculada da quietude”, terei consciência de que estou em presença do literário. Sabemos disso por conta da organização das palavras, o ritmo e a vibração das palavras superam o significado abstrato – ou, como os linguistas diriam de maneira mais técnica, existe uma desconformidade entre os significantes e os significados. É um tipo de linguagem que chama a atenção sobre si mesma e exibe sua existência material, totalmente diferente do que ocorre com frases como “Você não sabe que os motoristas de ônibus estão em greve?”

Esta foi a definição de “literário” apresentada pelos formalistas russos. Os formalistas surgiram na Rússia antes da revolução bolchevista de 1917; suas ideias floresceram durante a década de 1920, até serem silenciados pelo Stalinismo. Era um grupo formado por críticos militantes, polêmicos que rejeitaram doutrinas simbolistas que haviam influenciado a crítica literária e por insinuarem um espírito prático e científico, transferiram a atenção para a realidade do texto literário em si. Em sua essência, o formalismo foi a aplicação da linguística ao estudo da literatura, onde passaram ao largo da análise do conteúdo literário e dedicaram-se ao estudo da forma literária.

Eagleton descreve que pensar na literatura como os formalistas o fazem é, na realidade, considerar toda a literatura como poesia. Porém, considera-se que a literatura contenha muitas outras coisas além da poesia (obras realistas, naturalistas). Inúmeras vezes um estilo é considerado “bom” porque não atrai sobre ele uma atenção indevida: admiramos sua simplicidade concisa e moderada. Então o que dizer das piadas, dos slogans e refrões das torcidas de futebol, das manchetes de jornal, dos anúncios, que muitas vezes são verbalmente exuberantes, mas não são classificados como literatura?

Um problema concernente ao argumento da “estranheza” é o de que todos os tipos de escrita podem ser considerados “estranhos”. Um exemplo pode ser encontrado no metrô: “Cachorros devem ser carregados na escada rolante”. Isso talvez não seja claro quando pode parecer: significará que nós devemos carregar o cachorro na escada rolante? Seremos impedidos de usar a escada se não encontrarmos um vira-lata para tomarmos nos braços? Há vários avisos que aparentam ser claros, mas encerram ambiguidades semelhantes: “Coloque o lixo no cesto” ou uma placa de sinalização em um país aonde a malha é diferente da nossa. O anúncio do metrô poderia ser lido como literatura mesmo se deixarmos de lado tais “ambiguidades perturbadoras”. Ou poesia, que é apenas uma parte do que a literatura abrange. Em um outro exemplo, se houver um bêbado, tarde da noite, segurando-se no corrimão da escada rolante e lê aquele aviso com uma atenção prejudicada durante um bom tempo para depois dizer a si mesmo: “Como é verdade!”, entendemos que o bêbado faz é considerar o aviso como uma espécie de afirmação dotada de uma significação geral, universal. Ele as elogia sem relacioná-las com o seu contexto imediato, generalizando-as além de sua finalidade pragmática e dando-lhes uma significação mais ampla e profunda. Isso parece ser uma operação envolvida naquilo que as pessoas chamam de literatura. Quando, por exemplo, um poeta diz que seu amor é como uma rosa vermelha, sabemos que só por ter colocado esta informação não lhe devemos perguntar se ele tem realmente uma namorada que poderia ser semelhante a uma rosa. Ela está dizendo algo sobre as mulheres e o amor geral. Portanto, a literatura é um discurso “não pragmático”, bem diferente dos manuais de biologia, por exemplo. Ela não tem nenhuma finalidade prática imediata, referindo-se apenas a um estado geral de coisas. Às vezes ela pode empregar uma linguagem peculiar como se quisesse tornar evidente esse fato (falar sobre a mulher, não uma em particular da vida real), enfoque esse que é considerado uma indicação do que entendemos por literatura: uma espécie de linguagem auto referencial, uma linguagem que fala de si mesma.

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