William Seabrook: A ilha da magia
Por: Bruna Lamego • 22/11/2019 • Resenha • 4.267 Palavras (18 Páginas) • 551 Visualizações
William Seabrook
A Ilha da Magia
Escolhemos o relato do americano William Seabrook no qual conta sobre sua viagem para o Haiti no livro “Ilha da Magia” de 1929. Durante sua carreira como escritor esteve fascinado pelo exótico desde seu primeiro livro “Aventuras na Arábia” de 1927, se aproximando do grande místico e mestre espiritual armênio, George Ivanovich Gurdjieff. Mas antes disso já demonstrava interesse pelo oculto visto a proximidade com Aleister Crowley, renomado mago britânico que tinha como lema “faz o que tu queres", sendo crítico dos valores morais e religiosos do seu tempo.
Em 1966 Seabrook se suicida e sua ex mulher, também escritora, Marjorie Worthington, lança o livro “The Strange World of Willie Seabrook” descrevendo sua relação, cativante ao mesmo tempo que sádica e destrutiva, com o autor que era assumidamente alcoólatra. Uma das histórias sobre sua vida que foi amplamente divulgada, e que foi um grande escândalo na época, demonstra o nível de sua excentricidade. Ao lançar seu terceiro livro “Jungle Ways” escrito depois de sua viagem para a África em 1930, o autor admitiu ter ficado desapontado por o chefe Guere não o ter deixado participar do ritual de canibalismo lhe oferecendo carne de gorila. Pretendendo realizar seu fetiche procurou um amigo com certos privilégios no hospital e teria assim satisfeito seu desejo de comer carne humana.
Buscava experiências brutalmente encantadoras mais do que o sobrenatural. O misterioso, como irei destacar mais adiante, é sempre questionado por ele de forma racional. Em um de seus últimos livros “Witchcraft: Its Power in the World Today” lançado em 1940, Seabrook analisa seus primeiros anos como viajante. Já no início avisa que o livro será uma decepção para todos que acreditam no sobrenatural e conclui que apesar de ter buscado o mundo invisível nada que tenha visto não poderia ser explicado pela ciência.
Após compor um esboço do autor, achamos considerável trazer informações sobre o tempo e o espaço que procura descrever no livro escolhido. Apesar de haver muitas descrições políticas em seus contos, destaco que nos anos 10 o Haiti passava por uma grave crise governamental. Vários presidentes tomaram o poder através de pretensas revoluções que duravam um período muito curto até que outra tomasse o país para si. Em 1915, durante o governo de Guillaume Sam (história que será contada pelo autor a qual analiso) os Estados Unidos invade o país visando defender seus interesses, como os da empresa Hasco, ameaçados pela revolta contra o presidente. Os americanos ocuparam o Haiti até 1934 tendo Seabrook viajado para lá durante este período relatando o contato entre as duas nações.
Conversando sobre o folclore haitiano com um amigo fazendeiro chamado Constant Polynice, o autor deixa claro que este nada tinha em comum com os camponeses da floresta. Conhecia todas as superstições regionais das montanhas e das planícies mas sem, “absolutamente”, acreditar em nenhuma delas. “Julgava-se muito inteligente e evoluído para tais coisas.” Essa colocação que é feita em terceira pessoa, sugere um distanciando de sua própria opinião, insinuando que não seria a mesma. Durante o texto essa ideia de dúvida em relação ao haitiano se desenvolve. O homem lhe conta histórias sobre vampiros, lobisomens e os fogos-fátuos, já conhecidas pelo autor na literatura. Apenas uma não era de seu conhecimento: a dos zumbis. Temos hoje uma concepção formada sobre quem seria esse personagem, que vem sendo retratado pelo cinema há décadas. Mas a primeira representação feita para o público americano foi através de William Seabrook nesse texto, participando também da produção do primeiro filme do gênero nos Estados Unidos, “White Zombie”, lançado 4 anos após o livro em 1932.
Captando o relato do que pareciam “negros mais crédulos do que Polynice”, compõe o personagem que seria o corpo humano sem alma, um morto retirado do túmulo, exumado antes de se decompor e animado por feitiçaria. Poderia ser feito de escravo para cometer algum crime mas geralmente era para trabalhar no campo. Seabrook fala a seu amigo que gostaria de saber a origem dessa superstição, ao que ele responde que de forma alguma é superstição: “Essas coisas existem, num grau que vocês brancos não podem imaginar.” No início já percebemos a desconfiança do escritor com Polynice, em sua racionalidade, e parece debochar quando fala de “negros mais crédulos” já que o amigo, assim como eles, também acredita. Ao passo que o haitiano aponta a dificuldade do branco de compreender a cultura negra caribenha africana, e pergunta ao americano se já não havia escutado a história sobre os zumbis que haviam sido contratados pela Hasco (Haitian-American Sugar Company). Surpreso, responde que não, afirmando que este seria o último nome que poderia imaginar estar ligado com feitiçaria ou superstição. Isso porque como uma empresa americana industrial, sistemática, racional, pareceria contraditório se envolver com essas coisas.
Polynice então conta-lhe que durante a primavera de 1918, a colheita ultrapassou as expectativas e a fábrica contratou operários extras. A empresa americana que produzia rum e refinava açúcar, exigia trabalho árduo mas pagava pouco. Sabendo disso, certa manhã, Ti Joseph Colombier, “um velho chefe negro”, apareceu com um grupo de “seres andrajosos que o seguiam arrastando os pés, andando como sonâmbulos”. Na hora de serem contratados não respondiam as perguntas mas Ti Joseph disse que eram camponeses ignorantes das montanhas, que não compreendiam o crioulo falado nas planícies. E que o barulho das fábricas os aterrorizava sendo melhor que trabalhassem nos campos sobre seu comando. Uma vez contratados eram pagos toda a semana, mas “pouco importava à Hasco a forma como repartiam, desde que o trabalho fosse bem feito.” Nessa passagem vemos a crítica do autor à intervenção americana no Haiti que explora os ditos haitianos ignorantes e passivos também como escravos, sem se importar quem são e como estão. Mas apesar disso o chefe negro Ti Joseph consegue driblar os brancos e usa isso a seu favor.
O homem fazia os zumbis trabalharem o dia inteiro e sua mulher, Croyance, sentia pena deles. Num dia de Páscoa enquanto Ti Joseph foi à cidade sua esposa ficou em casa com os zumbis e decidiu levá-los para ver a procissão católica. Enquanto assistiam a cerimônia, passou por eles uma
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