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A SAÚDE AMBIENTAL

Por:   •  6/5/2015  •  Trabalho acadêmico  •  4.171 Palavras (17 Páginas)  •  225 Visualizações

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Cirrose hepática

1 - Como definir a cirrose hepática?

A cirrose representa o resultado final de uma doença crônica do fígado que leva a destruição e regeneração das células hepáticas, acarretando, do ponto de vista histológico, a presença de fibrose e formação nodular difusas, com conseqüente desorganização da arquitetura lobular e vascular do órgão. É importante que se tenha em mente que para o diagnóstico histológico de cirrose é necessário a presença de fibrose associada à transformação nodular do fígado. Assim, a presença de apenas um desses componentes não caracteriza cirrose, como a fibrose na esquistossomose e a regeneração nodular na hiperplasia nodular, que não são classificadas como cirrose.

2 - Quais são as principais causas de cirrose?

As principais causas de cirrose hepática são:

  1. Metabólicas: decorrentes de erros congênitos do metabolismo e que acometem, preferencialmente, crianças ou adultos jovens. Neste grupo estão incluídas a galactosemia, a tirosinemia, a doença de Wilson, a hemocromatose e a deficiência de α1-antitripsina, a esteatoepatite não alcoólica, entre outras.
  2. Virais: ocasionadas pelos vírus B (associado ou não ao vírus D ou Delta) ou C da hepatite.
  3. Álcool: principal agente etiológico entre pacientes adultos, ocorrendo após período médio de cinco a dez anos de ingestão de quantidade diária superior a 80 g de etanol para os homens e 60 g para as mulheres.
  4. Induzida por fármacos: como metotrexato, isoniazida, oxifenisatina e metildopa, entre outras.
  5. Auto-imune: conseqüente à evolução da hepatite ou da colangiopatia auto-imune, caracteristicamente afetando mulheres em idade jovem ou na pós-menopausa, com fenômenos auto-imunes concomitantes. Atualmente existem, pelo menos, três tipos de hepatopatias auto-imunes bem caracterizados que podem levar a cirrose.
  6. Biliares: enquanto a cirrose biliar primária representa entidade clínica definida, a cirrose biliar secundária é o processo final de doenças crônicas que acometem a árvore biliar com colangites de repetição, como na colangite esclerosante e na obstrução das vias biliares.
  7. Obstrução do efluxo venoso hepático: levando a anóxia congestiva do fígado, como ocorre na síndrome de Budd-Chiari, na doença veno-oclusiva, na pericardite constritiva.
  8. Criptogênicas: a despeito de todo progresso na identificação etiológica das cirroses, em torno de 10 a 15% delas permanecem com a etiologia indeterminada, em todo o mundo.

3 - Quais as principais manifestações clínicas da cirrose?

Mais comumente, o paciente é assintomático e o diagnóstico é feito de maneira acidental durante uma cirurgia, exame de imagem ou do encontro de varizes esofágicas em endoscopia destinada à investigação dispéptica. Outras vezes, o diagnóstico é suspeitado no exame clínico geral, encontrando-se hepato e/ou esplenomegalia. A cirrose também pode ser detectada a partir do achado de plaquetopenia ou de elevação das transaminases, ou ainda pela positividade de sorologia viral em banco de sangue. Na maioria desses casos, não há sintomas que possam ser definitivamente associados à lesão do fígado. Nos casos sintomáticos, o paciente é surpreendido pelo aparecimento súbito de icterícia ou do aumento progressivo do volume abdominal, quando não de forma dramática pelo aparecimento de hemorragia digestiva na forma de melena e/ou hematêmese. O início do quadro com alterações de comportamento, decorrentes da encefalopatia, é menos comum. É importante ressaltar a falta de relação entre doença hepática e sintomas popularmente atribuídos ao fígado, como enxaquecas, gosto amargo da boca, acne, sintomas dispépticos, intolerância à gordura etc. Esses sintomas têm sido associados às doenças hepáticas há longo tempo não só pelos leigos, mas também por alguns médicos.

4 - Como classificar o paciente cirrótico?

Uma forma simples é por meio da classificação em formas compensadas ou descompensadas, pela presença de ascite, encefalopatia e/ou icterícia. Apesar de ter valor prognóstico, essa classificação leva em conta apenas formas extremas de apresentação. A classificação que durante anos foi considerada o padrão-ouro para se avaliar a evolução e prognóstico desses pacientes foi a de Child-Turcotte, modificada por Pugh, que leva em conta critérios clínicos e laboratoriais e que classifica os pacientes em três grupos distintos (A, B ou C) em ordem crescente de gravidade ou, alternativamente, pela contagem total de pontos (tabela 1).

Tabela 1. Classificação de Child-Turcotte modificada por Pugh

 

1 ponto

2 pontos

3 pontos

Ascite

Ausente

Leve ou moderada

Tensa

Encefalopatia

Ausente

Graus I e II

Graus III e IV

Albumina

>3,5 g/dl

3-3,5 g/dl

<3 g/dl

Bilirrubinas

<2 g/dl

2-3 g/dl

>3 g/dl

Tempo de protrombina

< 4 seg

4-6 seg

>6 seg

Mais recentemente, uma outra classificação, denominada MELD, tem sido considerada superior à de Child-Pugh e envolve os parâmetros bilirrubinas, creatinina e tempo de protrombina (tabela 2). Por sua excelência em predizer a sobrevida desses pacientes, tem sido utilizada como critério para alocação de órgãos no transplante de fígado.

Tabela 2. Cálculo de MELD

MELD = 0,957 x Loge creatinina (mg/dL) + 0,378*Loge bilirrubinas(mg/dL) + 1,120 x Loge (INR)+ 6,4 x 10

INR = relação normatizada internacional, determinada a partir da dosagem do tempo de protrombina. Para a creatinina é considerado 4 mg/dL e esse é o valor de creatinina que deve ser usado para pacientes em diálise. Quando os valores de laboratório forem menores que 1, arredondar para 1. (Portaria do Ministério da Saúde, No 1116 de 29/05/2006).

5 - Quais os principais diagnósticos etiológicos da cirrose nas diferentes faixas etárias?

Em crianças, as doenças metabólicas como galactosemia, tirosinemia, deficiência de alfa1-antitripsina, más-formações congênitas como atresia biliar e as hepatites neonatais, devem ser consideradas em primeiro lugar. Nos adolescentes, lembrar de doença de Wilson, hepatite auto-imune, entre outras. No adulto, existem doenças que afetam mais a população acima de 40 anos, como a hemocromatose, cirrose biliar primária e o segundo pico da hepatite auto-imune, que atinge preferencialmente mulheres após a menopausa. Entretanto deve-se lembrar que algumas doenças, como as hepatites virais, podem acometer todas as faixas etárias na dependência da época da infecção. O mesmo se aplica à doença hepática alcoólica. Pacientes com deficiência de alfa1-antitripsina podem ser detectados desde a infância (geralmente com doença pulmonar associada) até em idades mais avançadas (50-60 anos).

6 - Quais as características clínicas e bioquímicas que nos permitem o diagnóstico não invasivo das cirroses de origem metabólica no adulto?

Em adulto jovem, com história familiar de hepatopatia ou de doença neurológica, baixos níveis de ceruloplasmina sérica devem ser encaminhados para exame com lâmpada de fenda para a detecção do anel de Kayser-Fleicher, para o diagnóstico de doença de Wilson. O conjunto de escurecimento da pele, diabetes melito, insuficiência cardíaca e cirrose deve levar o médico a investigar a presença de hemocromatose, que poderá ser confirmada pelos níveis elevados de ferro sérico, ferritina (geralmente acima de 1000 mcg), saturação férrica e, principalmente, pela biópsia hepática. A densidade tomográfica do fígado também pode ser sugestiva do diagnóstico. A deficiência de alfa1-antitripsina (AAT) pode ser sugerida na eletroforese de proteínas, pela diminuição significativa da alfa1-globulina, e confirmada pela dosagem sanguínea da AAT ou pela histologia. A esteatoepatite não alcoólica deve ser lembrada em pacientes sem marcadores de outras hepatopatias (virais, autoimunes ou metabólicas) e que apresentam características de síndrome metabólica, como obesidade, dislipidemia e intolerância à glicose ou diabetes tipo II.

7 - Qual o diagnóstico diferencial das hepatites crônicas que evoluem para a cirrose hepática?

Entre as causas virais, o diagnóstico deverá ser feito mediante pesquisa dos marcadores sorológicos (HBsAg e anti-HBc para o vírus B, e anti-HCV para o vírus C) e confirmação pela detecção do HCV-RNA ou do HBV-DNA no sangue periférico. O diagnóstico de cirrose por hepatite auto-imune (HAI) deve ser pensado especialmente em mulheres e apresenta dois picos de incidência, na criança ou adulto jovem, quando manifestações auto-imunes concomitantes são freqüentes (febre, artralgias, artrites, tiroidites, manifestações cushingóides, etc) e após a menopausa. Esse diagnóstico é reforçado pela presença de hipergamaglobulinemia e dos anticorpos antimúsculo liso, anti-actina e FAN (hepatite AI tipo I) ou de anticorpos antimicrossomais para fígado e rim (hepatite AI tipo II). Deve ser lembrado que a hepatite auto-imune tipo II acomete especialmente crianças e seu diagnóstico é feito por meio do anticorpo anti-LKM.

8 - Existem situações em que dois fatores etiológicos podem ser encontrados em um mesmo paciente?

Nos pacientes alcoolistas, a prevalência de marcadores virais para os vírus B e C da hepatite é maior que na população geral, por isso a concomitância de doença hepática alcoólica e de infecção por vírus hepatotrópicos deve sempre ser investigada. Várias outras associações são atualmente reconhecidas como hemocromatose e doença hepática alcoólica, hemocromatose com hepatite crônica pelo vírus C, esteatoepatite não alcoólica e hepatite B e, principalmente, hepatite C. É preciso, no entanto, compreender que a hemossiderose pode ocorrer em portadores de hepatites virais e na esteatoepatite não alcoólica, sem configurar hemocromatose.

9 - Como identificar a cirrose biliar e como diferenciar as principais causas de cirrose biliar no adulto?

As cirroses biliares apresentam características clínicas e bioquímicas de colestase crônica. As manifestações de prurido geralmente antecedem o aparecimento de icterícia. Há importante elevação de GGT e fosfatase alcalina e dos níveis de colesterol sérico. Na colangite esclerosante e nas doenças obstrutivas, surtos repetidos de colangite bacteriana podem ser encontrados. As principais doenças colestáticas do adulto são cirrose biliar primária, colangite esclerosante, colangiopatia auto-imune e doenças obstrutivas crônicas das vias biliares. A cirrose biliar primária, além do quadro clínico colestático (prurido, icterícia) e de significativas elevações da fosfatase alcalina e da gama-glutamiltransferase (GGT), apresenta positividade em mais de 90% dos casos para o anticorpo antimitocôndria e, principalmente, anti-M2. Nas cirroses biliares secundárias (colangite esclerosante e doenças obstrutivas crônicas) pode ser imprescindível o concurso da colangiografia, especialmente a endoscópica retrógrada ou, mais recentemente, da colangioressonância. O diagnóstico da colangiopatia autoimune é mais complexo, uma vez que não existe marcador específico. A biópsia hepática pode ser necessária.

10 - Quais as características das doenças do efluxo venoso que possibilitam o diagnóstico dessas situações?

A síndrome de Budd-Chiari geralmente está associada a doenças mieloproliferativas e seu diagnóstico pode ser feito por meio de ultra-som com Doppler ou arteriografia seletiva. A doença veno-oclusiva é mais freqüentemente observada em pacientes transplantados, especialmente no transplante de medula. A pericardite constrictiva pode ser detectada por meio do quadro clínico e do ecocardiograma. Essas causas podem ser suspeitadas em paciente com hepatomegalia dolorosa e ascite com elevado conteúdo protéico, embora em formas insidiosas essas manifestações possam não ser tão evidentes. A dilatação das veias hepáticas no ultra-som do fígado pode sugerir o diagnóstico.

11 - Quando está indicada a biópsia na cirrose hepática?

A biópsia em pacientes cirróticos tem risco aumentado de complicações; assim ela está indicada principalmente nos casos em que exista dúvida diagnóstica. A biópsia percutânea não deve ser realizada em pacientes com risco de sangramento, especialmente naqueles com índice de protrombina (RNI ou relação normatizada internacional) maior do que 1,30 e plaquetas menores que 80.000/mm3. Nestes pacientes e naqueles com hipertensão portal, tem-se preferido a realização de biópsia por via laparoscópica, sempre levando em conta a relação risco-efetividade do procedimento. Deve-se ter em mente que em 5% a 15% dos casos, mesmo com a biópsia, não se consegue fazer o diagnóstico, são as chamadas cirroses criptogênicas. Quanto menores os recursos complementares e o conhecimento do médico, maiores são os percentuais de cirrose criptogênica.

12 - Qual a importância do estado nutricional na cirrose hepática?

A desnutrição protéico-calórica (DPC) é um achado freqüente em pacientes portadores de doença hepática, trazendo graves repercussões sobre o estado geral e sobre a evolução clínica do paciente, devido à redução dos mecanismos de defesa imunológica e aumento da incidência de infecções. Em pacientes cirróticos alcoolistas hospitalizados, a prevalência de DPC tem variado entre 57% a 96% nos diferentes estudos. Prevalência elevada de DPC também pode ser observada entre pacientes cirróticos encaminhados para consulta ambulatorial em serviço especializado. No ambulatório de doenças hepáticas crônicas da Unifesp, quase 75% dos pacientes atendidos pela primeira vez já apresentavam algum grau de desnutrição, independente da etiologia da doença de base e que piora à medida que a função hepática se agrava (tabelas 3 e 4).

Tabela 3. Classificação do estado nutricional de 300 pacientes cirróticos, de acordo com a etiologia

Estado nutricional

Cirróticos

Total

Alcoolistas

Não alcoolistas

Eutrófico

55 (25,8%)

19 (21,8%)

74 (24,7%)

DPC leve

78 (36,6%)

33 (37,9%)

111 (37,0%)

DPC moderada

73 (34,3%)

32 (36,8%)

105 (35,0%)

DPC grave

7 (3,3%)

3 (3,5%)

10 (3,3%)

Total

213 (100%)

87 (100%)

300 (100%)

Tabela 4. Classificação do estado nutricional de 300 pacientes cirróticos, de acordo com a variável função hepática

Estado nutricional

Cirróticos – Clssificação Child-Turcotte-Pugh

A

B

C

Eutrófico

28 (53,8%)

27 (15,9%)

4 (5,1%)

DPC leve

13 (25,0%)

54 (31,8%)

29 (37,2%)

DPC moderada

10 (19,2%)

76 (44,7%)

37 (47,4%)

DPC grave

1 (2,0%)

13 (7,6%)

8 (10,3%)

Total

52 (100%)

170 (100%)

78 (100%)

Tem sido demonstrado que a DPC constitui-se em fator de risco independente para o prognóstico de mortalidade a longo prazo dos pacientes com doença hepática crônica. A DPC pode contribuir para o aparecimento das complicações mais graves em pacientes cirróticos, como ascite, encefalopatia hepática, infecções e, assim, influenciar de modo negativo a sobrevida. A DPC também apresenta valor prognóstico em pacientes submetidos a transplante hepático ou a outras cirurgias abdominais, havendo correlação significativa da DPC com mortalidade, aumento no período de permanência na unidade de terapia intensiva, tempo de internação hospitalar e, conseqüentemente, elevação de custos do transplante.

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