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Discussão Da Filosofia Da Modernidade

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Por:   •  7/4/2014  •  3.819 Palavras (16 Páginas)  •  600 Visualizações

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Μετάνοια, São João del-Rei/MG, n.13, 2011

A DISCUSSÃO FILOSÓFICA DA MODERNIDADE E

DA PÓS – MODERNIDADE

Daniel Nery da Cruz

Orientador: Prof. Dr. João Santos Cardoso

Resumo:Este trabalho faz uma reflexão filosófica sobre a modernidade e

pós-modernidade e os seus impactos sobre o sujeito. Em primeiro instante,

será abordado como a idéia de modernidade e sujeito foram forjadas a

partir de Descartes. Em seguida, discorre-se acerca do sujeito e a pósmodernidade

na concepção de Lipovetsky e como o esvaziamento do

sujeito na sociedade do prazer e bem-estar dissolve os valores deixados

pela modernidade ocasionando um universo sem referenciais, sem sentido

e sem objetivo.

Palavras-chave: Pós-modernidade. Sujeito. Narcisismo. Lipovetsky.

Abstract: This work is a philosophical reflection on modernity and

postmodernity and their impacts on the subject. In the first moment, we shall

discuss how the idea of modernity and subject were forged from Descartes.

Then talks about the subject itself and postmodernity in designing and

Lipovetsky as emptying into the subject in society of pleasure and well-being

dissolves the values left by modernity causing a universe without references,

without meaning or purpose.

Key words: Post-modernity. Subject. Narcissism. Lipovetsky.

A Modernidade e a Descoberta do Sujeito

difícil definir a modernidade, pois se trata de um

período histórico que é ao mesmo tempo passado e

presente. No geral, ela é um processo de transformações do

pensamento ocidental iniciado no século XVI onde há uma

ruptura com a tradição medieval. Michel Focault (1984) no seu

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texto o que é o iluminismo diz que o tempo moderno é “tudo

isso, a filosofia como problematização de uma atualidade e

como interrogação para o filósofo dessa atualidade da qual

faz parte e em relação à qual tem que se situar, poderia

caracterizar a filosofia como discurso da modernidade e sobre

a modernidade.” Duas noções são importantes para entender

o moderno:

a idéia de progresso, que faz com que o novo seja

considerado melhor ou mais avançado do que o

antigo; e a valorização do individuo, ou da

subjetividade como lugar da certeza e da verdade, e

origem dos valores, em oposição à tradição isto é, ao

saber adquirido, às instituições, à autoridade externa.

(MARCONDES, 2004, p. 140).

Com a inauguração dos tempos modernos, o homem se

torna o centro, a medida do conhecimento em que tudo está

estritamente ligada à razão. Daí a importância da

compreensão da modernidade para, então, se compreender

como foi descoberta a idéia de sujeito, de agente dominador.

As grandes navegações dão uma nova visão de mundo no

contato de novas culturas, o Renascimento e a Reforma

Protestante trazem mudanças cruciais principalmente no

âmbito religioso e político. É indispensável considerar o

Renascimento como o momento chave nas profundas

transformações do Ocidente, em que a visão de mundo do

homem é marcada “por uma verdadeira paixão pelas

descobertas”. “Eruditos redescobrem as antigas doutrinas

filosóficas e cientificas, forjadas pelos gregos, e em nome das

quais torna-se possível constituir uma sabedoria nova, oposta

às concepções que prevaleceram na Idade Média”

(AMÉRICO, 2004. p. 07).

A modernidade é a época em que a alma se retira do

mundo das coisas e recolhe-se no mundo dos

homens, bem como a época em que os homens se

acreditam suficientemente fortes e poderosos, qual um

novo, qual um novo Prometeu, se não para elevaremse

contra a divindade e se imporem aos deuses, ao

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menos para prescindirem de sua proteção e

dispensarem seus serviços. (DOMINGUES, 1991,

p.32)

Com todas essas novidades, o mundo parecia está

desordenado, fragmentado e sem referência ou centro, era

preciso achar alguma orientação ou método para centralizar o

mundo. É aqui que a razão entra como aquela que vai restituir

a unidade perdida, pois ela está para além das culturas e é

universal.

A razão é de fato, o elemento comum a todos os seres

humanos e, por isso, assume a condição de

fundamento a partir do qual o mundo deve ser

organizado. É ela quem deve, a partir de agora, dar

unidade e sentido a todas as esferas que compõem a

existência humana. Tudo quanto pretenda ter

legitimidade para existir necessita, pois, de submeterse

ao crivo da Razão. (HANSEN, 1999, p. 37).

Ela, a razão, desmonta antigas crenças e reconstrói o

novo edifício do saber como destaca Cassier:

A razão desliga o espírito de todos os fatos simples, de

todos, de todos os dados simples, de todos as crenças

baseadas no testemunho da revelação, da tradição, da

autoridade; só descansa depois que desmontou peça

por peça (...) Mas, após esse trabalho, impõe de novo

uma tarefa construtiva (...); deverá construir um novo

edifício, uma verdadeira totalidade (CASSIER, 1992,

p.32-3)

Não é mais a vontade da divindade e entidades que

garantem ou definem o sentido do agir humano, é o próprio

sujeito quem dá significado à sua existência. O próprio

indivíduo é responsável pelo progresso ou decadência da sua

vida.

O Movimento Iluminista, grande propagador do projeto

moderno, depositou uma confiança cega e ilimitada na razão

a ponto de o século XVII ser denominado o “Século das

Luzes”. A razão teria chegado a um tal estágio de

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desenvolvimento que ela seria capaz de dissipar as trevas da

ignorância que obscurecem o espírito humano (MONDIN,

1980). Kant, ao tentar dar uma resposta ao o que é o

esclarecimento (Was is Aufklärung?) define Aufklärung como

uma saída do homem para a sua maioridade. Afirma Kant

sobre o esclarecimento, “é a saída do homem de sua

menoridade, da qual ele próprio é culpado” (KANT, 1974,

p.100), e continua: “fazer uso de seu entendimento sem a

direção de outro indivíduo” (KANT, 1974, p.100).

Segundo Touraine (1994), o que distingue a filosofia do

iluminismo da que a precede é a sua intenção de estender a

todos os homens o que havia sido propriedade de apenas

alguns, a saber, uma existência conduzida em conformidade

com a razão. Uma autonomia que leva o indivíduo à busca do

saber: “Sapere Aude” (KANT, 1988, p. 100), pois é do

conhecimento livre e correto que o ser humano alcançará o

progresso, a tranqüilidade e a felicidade. Como afirma Lyon

(1998, p. 14), “[...] a ênfase ao movimento progressivo da

história foi facilmente combinada com a convicção de que as

coisas, de uma maneira geral, estavam melhorando,

especialmente sob o impacto do pensamento iluminista

emergente.”

A ideologia moderna alicerça toda forma de conhecimento

num modelo natural sem relação a crenças religiosas, o que

deve valer é o que se pode medir “e o individuo só está

submetido às leis naturais” (TOURAINE, 1994, p. 20). O

pensamento científico deve ser totalmente transparente e a

sociedade deve refletir essa transparência sendo organizada

pela razão que, “nesse sentido, nada mais é do que cálculo,

isto é, adição e subtração [...]” (HOBBES, 2002. p. 39).

Já não mais indaga por aquilo que é a realidade, mas

por suas possibilidades. Se na antiguidade e na Idade

Média, o homem considerava verdadeiro o pensar de

acordo com o que existe na realidade, nos tempos

modernos inverte sua postura dizendo que aquilo que

pode pensar, poderá realizar. O homem passa a

interessar-se não tanto por aquilo que já é, mas por

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aquilo que ainda poderá ser. (URBANNO ZILLES,

1993, p. 10).

A Modernidade foi construindo assim um personagem

independente, livre das pressões tradicionais. Fazer a

pergunta o que é o sujeito ou o que se entende por sujeito

deve levar o investigador a buscar respostas nas duas “figuras

da modernidade: a racionalização e a subjetivação”

(TOURAINE, 1994, p. 218).

A absolutização da razão com a promessa de uma vida

de progresso, equilibrada e segura para o ser humano, fez o

sujeito se identificar e confiar plenamente na ciência que até

hoje existe um certo traço dessa influência iluminista. Porém,

a história mostrou principalmente no século XX, o mau uso da

razão pelo homem, não legitimando a promessa iluminista. “A

sociologia, por exemplo, que prometia conseguir o equilíbrio

nas relações sociais, presenciou contraditoriamente o caos

contemporâneo produzido pelo perverso e desumano uso da

razão” (CHAUÍ, 2003, p.). Habermas em o discurso filosófico

sobre a modernidade, faz uma reflexão de uma razão que não

busque conhecimento somente da relação sujeito objeto ou

que ela não seja fechada em si mesma. Ele busca uma

filosofia que seja pautada na comunicabilidade dos sujeitos

frente aos novos paradigmas da modernidade. Essa razão

moderna está centrada na sua auto-afirmação e na autoafirmação

da subjetividade é ai que Habermas alerta sobre o

perigo do purismo da razão: “Só a razão reduzida à

capacidade subjetiva de entendimento e de atividade

teleológica corresponde à imagem de uma razão exclusiva

que, quanto mais aspira triunfalmente às alturas se

desenraiza até finalmente cair, vítima da força da sua oculta

origem heterogênea.” (HABERMAS, 1990, p.284).

Quais as conseqüências de uma razão que subjuga tudo

em volta de si? Esse sujeito, guiado por um modelo de

absolutização do racional presenciou inúmeras ações

destruidoras: Confecção de bombas atômicas, massacres

totalitários, as guerras mundiais dentre outros atos

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destruidores, tudo isso levou o sujeito a perder confiança na

razão, entrando de forma descontrolada no universo das

emoções. Os ideais iluministas pareciam não garantir o que

prometeu.

Antes disso Nietzsche já fazia a crítica à modernidade, o

pensamento tradicional desde Aristóteles era totalizante e

coerente com a realidade, a verdade era procurada em um

sistema lógico e formal. Com Nietzsche há uma

desconstrução do modo de pensar tradicional. Desfazendo a

idéia de um pensamento sistemático, ele fundamenta sua

linguagem filosófica na vontade de poder e a própria verdade

é colocada em questão. Agora a verdade não está mais

pautada na razão, (que se engana) mas na vontade.

A descoberta do sujeito em René Descartes

O poeta inglês John Donne exprimiu em 1611 sua

preocupação e a inquietude provocadas pelo

desaparecimento da antiga ordem das coisas:

A nova filosofia Poe tudo em dúvida, o elemento do

fogo está extinto, o sol está perdido, e também a terra,

e nenhum espírito humano tem com o que se orientar

para a procura. E os homens confessam livremente

que este mundo está em ruínas, quando entre os

planetas e firmamento eles procuram tantos mundos

novos; Eles vêem então que tudo está de novo

pulverizado em átomos, tudo está em pedaços, toda a

coerência perdida (...).” (DONNE, 1949, p. 202)

Essa mesma angústia foi sentida por René Descartes.

Sua tomada de decisão em meio a uma época de inovações e

incertezas deu uma nova perspectiva no campo

epistemológico. Abandonando uma visão cosmológica do

homem centralizada na autoridade e na religião, ele propõe

um olhar centrado na certeza do conhecimento a partir do

próprio individuo. Esse fundamento antropológico deu origem

ao chamado racionalismo.

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O filósofo diferenciou seus escritos dos outros medievais

que usavam um modo impessoal de se comunicar,

escrevendo na maioria das vezes na primeira pessoa,

relatando suas meditações filosóficas.

Procurando encontrar um método seguro e indubitável

para as novas ciências, “em uma época em que haviam

afirmado e se desenvolviam com vigor novas perspectivas

científicas e novos horizontes filosóficos” (REALE, 2004, p.

287), Descartes desenvolve uma metodologia fundamentada

no conhecimento a partir de “[...] regras que se fundamentam

na certeza adquirida de que o “nosso eu” ou a consciência de

si como realidade presente se apresenta com as

características da clareza e da distinção.” (REALE, 2004, p.

293).

Formei um método pelo qual me parece que eu

consiga aumentar de forma gradativa meu

conhecimento, e de elevá-lo pouco a pouco, ao mais

alto nível, a que a mediocridade de meu espírito e a

breve duração de minha vida lhe permitam alcançar

(DESCARTES, 2004, p. 36).

Esse método é pautado na chamada “Dúvida Metódica”.

Ele começa duvidando de tudo, a reviravolta causada pelo

cogito está na desconfiança dos sentidos que podem enganar.

Duvidando até mesmo de sua própria existência, Descartes

conclui:

A noção que possuo do espírito humano, enquanto é

uma coisa pensante e não extensa, em comprimento,

largura e profundidade e que não participa de nada

que faz parte do corpo, é incomparavelmente mais

clara do que a idéia de qualquer outra coisa corporal.

(DESCARTES, 2004, p. 291)

Desconfiado de todos os sentidos e das opiniões que

enganam o gênero humano e não garantem uma certeza

sobre as coisas existentes, Descartes encontra segurança no

próprio indivíduo que com a capacidade de se autoconhecer

define-se claramente como um ser pensante, traduzido nas

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clássicas palavras: “cogito ergo sum” (“penso, logo existo”).

Descartes parte do pressuposto de que o sujeito, antes de

procurar conhecer o objeto, precisa voltar-se para si mesmo, e

a partir daí o conhecimento é comprovado.

Como no cálculo matemático, Descartes através de

dispositivos estritamente racionais declara o que está imerso

no seu “se duvido penso” a convicção de existir e esse existo

do eu é dependente do pensamento e, por ser o pensamento

colocado como fundamento do existir, naturalmente há uma

separação entre a subjetividade e a objetividade. Esta última

agora é dominada pela primeira, ou seja, a substância

pensante (res cogitans) mantém o domínio sobre a res

extensa (matéria). A razão é o instrumento por excelência da

conquista do sujeito que com o novo método garantirá a não

desarticulação das novas formas do saber.

Com as ideias de Descartes, o sujeito aparentemente

“livre”, “obedece a si mesmo e não a forças exteriores.”

(REALE, 2004, p. 305). O primado da razão é definido no “res

cogitans”, no eu interior onde deve haver uma perfeita

harmonia entre a realidade subjetiva e objetiva.

Assim, fica claro por que o racionalismo cartesiano é

considerado o marco da modernidade, pois ele produziu um

pensamento tão ousado para a ciência e para a formação do

sujeito moderno que perpassou a partir de sua época até os

dias atuais, provocando mudanças em todos os campos da

sociedade.

Pós-Modernidade e sujeito

O termo "pós-modernismo" teve sua origem na Espanha

na década de 1930. Perry Anderson em "As Origens da Pós-

Modernidade" (1999), aponta ter sido, Frederico de Onís, o

primeiro a usar o termo pela primeira vez. Mas foi o filósofo

francês Jean-François Lyotard, com a publicação "A Condição

Pós-Moderna" (1979), que expandiu do uso do conceito. Logo

no inicio do primeiro capitulo dessa obra Lyotard usa o termo

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idade pós-moderna se referindo ao objeto de estudo em

questão: “Nossa hipótese de trabalho é a de que o saber

muda de estatuto ao mesmo tempo em que as sociedades

entram na idade dita pós-moderna.” (LYOTARD, 1979, p. 03).

Em Lipovetsky o conceito é encarado como continuação

do processo moderno e elevação exagerada de seus ideais,

daí ele preferir usar o termo hiper-modernidade para se referir

a esse processo. O termo “hiper” faz menção a uma

exacerbação dos valores da modernidade, é a cultura do

excesso determinada e marcada pelo efêmero em que o

sujeito em ritmo acelerado busca a satisfação dos seus

desejos.

A sociedade contemporânea é a mais alta fase da

modernidade. É uma sociedade do excesso e do vazio que

dão autonomia e produz novas formas de liberdade causando

“novos problemas, novas angústias e novas expectativas”.

(MACHADO, 2005, p. 11). Em “A Era do Vazio” o filósofo

chama a atenção para a fragmentação da sociedade e seus

costumes, o consumo, o hedonismo, o individualismo e a

urgência de um novo paradigma social. Com o

enfraquecimento de todos os setores da sociedade e,

principalmente, do indivíduo contemporâneo emerge um modo

“inédito” de vivência, “numa ruptura com o que foi instituído a

partir dos séculos XVII e XVIII”. (LIPOVETSKY, 2005, p. 15).

Zigmund Bauman, outro filósofo contemporâneo, não

utiliza o termo pós-modernidade, mas “Modernidade Líquida”.

Em que os preceitos duros, sólidos e sedimentados da

modernidade derreteram-se (BAUMAN, 2001). Ele também

concorda com Lipovetsky quando afirma que “a sociedade de

consumo não é nada além de uma sociedade do excesso e da

fartura” (BAUMAN, 2007, p. 111).

Para Lyon (1998), a pós - modernidade existe como uma

idéia ou forma de critica na mente dos intelectuais e nos

meios de comunicação. Embora muitos autores usem

variados conceitos para discorrer sobre o fenômeno, um fio

une todos eles, a mudança: “o conceito de pós-modernidade

faz parte do pensamento social porque nos alerta para

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algumas mudanças sociais e culturais importantes que estão

acontecendo neste final de século XX” (LYON, 1998, p. 09).

Essa época, principalmente o século XX, é um ambiente

de muitos contrastes, onde acontecimentos desastrosos dão a

idéia de uma deserção social nunca ocorrida na História:

[...] o desenraizamento sistemático das populações

rurais, depois urbanas, langores românticos, o spleen

dandy, Oradour, os genocídios e etnocídios, Hiroshima

devastada em dez quilômetros quadrados, com 75 mil

mortos e 62 mil construções destruídas,os milhões de

toneladas de bombas jogadas sobre o Vietnã e a

guerra ecológica com produtos herbicidas, a escalada

do estoque mundial de armas nucleares, Phnom Penh

espoliada pelos Khmers vermelhos, as figuras do

niilismo europeu,os personagens mortos vivos de

Beckett, a angústia e a desolação interior Antonioni,

Messidor de A. Tanner, o acidente de Harrisburg...

com certeza a lista se alongaria desmesuradamente se

quiséssemos inventar todos os nomes do deserto.

(LIPOVETSKY 2005 p. 17)

É interessante notar que para Lipovetsky, diferentemente

de outros críticos, esse deserto, depois dessa hecatombe, se

alastra no interior do homem, sem catástrofes, sem tragédias

ou vertigem e acaba por se identificar com o nada e com a

morte.

Não é verdade que o deserto induz a contemplação de

crepúsculos mórbidos. [...] O deserto se alastra e nele

lemos a ameaça absoluta, o poder do negativo, o

símbolo do trabalho mortífero dos tempos modernos

até seu termo apocalíptico. (LIPOVETSKY, 2005.

p.18).

Numa incessante busca do seu bem-estar e uma

supervalorização do EU, o individuo moderno torna-se frágil e

vulnerável á medida que se fecha para o outro e imerge

dentro de si. Esse individualismo estimulado pelo consumismo

foi esvaziando o sujeito a tal ponto que ele já não tem mais

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forças para lutar pelos ideais comunitários e transfere a

responsabilidade política para os partidos por não ter tempo

disponível para a “res publica” estando envolvido nos seus

próprios negócios, em seu mundo, cuidando dos seus

interesses.

Todas as instituições, organizações e todos os valores

estão sendo esvaziados de sua substância. O saber, o poder,

o trabalho, o exército, a família, a Igreja, já não estão em

funcionamento como princípios absolutos e intangíveis. Há

uma descrença geral em todos eles.

Entretanto, o sistema funciona e as instituições se

desenvolvem multiplicando-se assustadoramente, a diferença

é que agora num ritmo livre e leve, no vazio e sem sentido. É

preciso saber viver ou sobreviver nos “espaços desativados”.

Uma onda de apatia invadiu a sociedade que

acompanhou a morte das ideologias e “a morte de Deus”

prevista por Nietzsche.

Deus está morto. Nós o matamos. Deus permanece

morto. E fomos nós que o matamos. Como nos

consolar, nós, os assassinos dos assassinos? Aquilo

que o mundo possuía até agora de mais sagrado e de

mais poderoso perdeu seu sangue sob nossos

punhais. Quem limpará esse sangue de nossas mãos?

Que água instral poderá jamais nos purificar?

(NIETZSCHE, 2002)

Nietzsche nos carrega de culpa diante da depreciação

mórbida dos valores e anuncia o niilismo europeu. Porém,

Lipovetsky vê um deserto pós-moderno todo feito de

indiferença e em que cada vez mais se afasta do niilismo.

“Deus morreu, as grandes aspirações se extinguiram, mas

ninguém está dando a mínima importância para isso”

(LIPOVETSKY, 2005, p.18). Essa é a boa noticia, eis o limite

do diagnóstico de Nietzsche em relação à tristeza européia.

Não estando sob pressão, livre das correntes tradicionais

e guiado pela lógica hedonista, a pós-modernidade forjou um

indivíduo “narcisista” voltado para si mesmo em busca de

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satisfação e realização pessoal. Na verdade, o que

caracteriza uma sociedade narcisista é a vivência do

presente e não mais atrelada ao passado e ao futuro. O

sentido histórico já não faz mais sentido, as pessoas não se

prendem mais às instituições e desacreditam em seus

valores. É instaurado por assim dizer um narcisismo coletivo.

“A cultura narcisista é a celebração da aparência física, o

triunfo do espelho e o culto da própria imagem” (PEREIRA

2006, p. 03). Narciso segue um caminho incerto, mas

consegue caminhar, atravessando sozinho o deserto, levando

a si mesmo sem qualquer apoio transcendental, o homem de

hoje é definido pela vulnerabilidade.

O que Lipovetsky quer demonstrar a respeito do individuo

é que a deserção da “res pública” foi limpando o terreno para

a ascensão do sujeito puro, em busca de si mesmo.

Obcecado por ele mesmo pode desmoronar a qualquer

momento por não se apoiar em nenhuma força exterior. “O

homem descontraído está desarmado” (LIPOVETSKY, 2005,

p.29).

Agora, os problemas da vida pessoal ganham proporções

desmensuradas, a grade psicológica e psicanalítica tenta

apresentar soluções para acabar com um devastador

solipsismo. A solidão não é apenas uma excepcional idade de

alguns “românticos” ela tomou proporções populares.

“Na verdade o narcisismo foi gerado pela deserção

generalizada dos valores e finalidades sociais [...]”

(LIPOVETSKY, 2005, p. 34). Com o enfraquecimento do

interesse pela esfera política nasce o narcisismo, marcado

pelo fim do “homo politicus” e o surgimento do homo

“psicologicus”, ansioso por identidade e bem-estar.

Um marasmo sem precedentes invade o interior do sujeito

pós-moderno, enfraquecido na vontade, ele já não tem forças

para a mobilização de massa. É o homem “cool” (vontade

enfraquecida), ele não é, segundo Lipovetsky, nem o

decadente pessimista de Nietzsche, nem o trabalhador

oprimido de Marx:

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O homem cool não é nem o decadente pessimista de

Nietzsche, nem o trabalhador oprimido de Marx, ele se

parece mais com o telespectador tentando “assistir”

uns após outros aos programas noturnos ou com o

consumidor enchendo o seu carrinho ou, ainda, com a

pessoa em férias que hesita entre uns dias nas praias

espanholas ou num acampamento na Córsega. A

alienação analisada por Marx,resultante da

mecanização do trabalho, deu lugar a uma apatia

induzida pelo campo vertiginoso das possibilidades e o

self–service generalizado. (LIPOVETSKY, 2005, p. 24)

O que deve ser percebido na visão lipovetskyana sobre a

pós–modernidade e o sujeito é uma abordagem critica em que

essa época não é vista de modo tão pessimista, porém é

oferecido um panorama sobre as realidades maléficas

infiltradas no interior da “era do vazio” em que surge uma

vasta gama de problemas relacionados principalmente à

pessoalidade humana.

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