A EPISTEMOLOGIA QUALITATIVA: CONTRIBUIÇÕES PARA A PESQUISA EM EDUCAÇÃO ESPECIAL

A EPISTEMOLOGIA QUALITATIVA: CONTRIBUIÇÕES PARA A PESQUISA EM EDUCAÇÃO ESPECIAL

Alexandra Ayach Anache

        Este artigo trata da contribuição da Epistemologia Qualitativa ancorada na perspectiva histórico cultural, cuja proposta é que uma leitura avançada do processo de constituição dos seres humanos na vida social, que é onde residem as possibilidades de desenvolvimento, para a pesquisa em Educação Especial.

Destacando os aspectos mais frágeis da Educação Especial, Anache ressalta entre eles a sua amplitude, por exemplo, a definição de qual população pretende educar, pois a atual Política de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva a concebe como uma modalidade de educação que intenta oferecer ensino aos alunos com necessidades educacionais especiais simultaneamente nas escolas de ensino comum e nas de ensino especial. Para a autora, o público-alvo da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva são os alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação, ressalvando que, para aqueles com transtornos funcionais específicos, a Educação Especial deverá promover articulação com o ensino comum, orientando para o atendimento às necessidades educacionais especiais desses alunos. Os processos de aprendizagem de alunos com deficiência intelectual - aqueles cuja deficiência recai nas dificuldades de adaptação na escola e na aprendizagem dos conteúdos acadêmicos -, segundo ela, demandam metodologias diferenciadas, quando comparados, por exemplo, àqueles que apresentam deficiência visual/auditiva, etc. 

Referindo-se ao pensamento de Garcia (2008), que afirma que a avaliação de desempenho escolar está entre os desafios que precisam ser enfrentados pelas escolas, pois esta, em muitos estados e municípios da federação brasileira, se expressa em regime de notas, Anache também menciona outros trabalhos - Bueno (2008) Tavares Silva (2008), Dallabrida (2008), Siqueira (2008) e Santos (2008) – que apontam para a necessidade de se investir no processo de escolarização de alunos com deficiência como a intelectual. Isso porque as especificidades dos seus processos de ensino aprendizagem exigem estudos e pesquisas que possam transformar os problemas que além dos individuais em desafios a serem enfrentados.

Para Anache, a intencionalidade é a principal característica do processo de ensino aprendizagem, que deve contar com estratégias para promover o desenvolvimento da aprendizagem de pessoas com deficiência. Ela destaca a definição de Epistemologia Qualitativa como uma perspectiva teórica e metodológica de pesquisa de processos psicológicos; citando González Rey (1997), que foi quem quem usou esta terminologia para referir-se à análise qualitativa desses fenômenos à luz do materialismo dialético, por causa das dificuldades de definição da pesquisa qualitativa, já que esse termo abrange uma série de concepções diferentes daquela na qual ele embasou seus estudos, Anache enfatiza que, em prol da neutralidade científica, a subjetividade, como  categoria na ocorrência dos fatos sociais, perdeu importância. Para González Rey (1997), tal fato determinou o isolamento acadêmico da área da trama social dos fenômenos que aconteciam no cotidiano da sociedade.

Com base em algumas proposições de Vygotsky (1995) sobre o método para estudar as funções psicológicas superiores, González Rey (1997, 2005) apresentou a Epistemologia Qualitativa como uma proposta de pesquisa avançada na explicação dos fenômenos psicológicos. E Anache pontua que os fenômenos sociais de ordem econômica, política e institucional são expressos através da subjetividade social e da subjetividade individual - dois conceitos importantes para a compreensão dos diferentes comportamentos manifestados pelos indivíduos nos espaços das pesquisas, manifestados nas contradições entre as necessidades sociais e individuais dos sujeitos,que são  fatores importantes para a constituição do sentido subjetivo síntese de múltiplas determinações. Segundo González Rey (2003), é por meio do conceito de situação social de desenvolvimento que se compreende a formação social do psiquismo como produção e não como interiorização.

Para Anache, a linguagem tem função mediadora da percepção humana, sendo fator estruturante do desenvolvimento do ser humano, pois é por meio dela que o homem se constitui como sujeito. Em consonância, González Rey (2005) declara que a aprendizagem é um processo psicológico, resultante nas diversas formas de humanização e que viabiliza a constituição do sujeito para a sua participação na sociedade. Nesse contexto, a Educação formal e a informal é fundamental para a formação das pessoas, pois os espaços de convivência entre elas são fatores determinantes para a humanização dos indivíduos, incluindo-se nesse processo a aquisição e a produção de conhecimentos acumulados pela sociedade e também a aquisição de habilidades, atitudes, valores, conceitos, etc.

Anache continua o artigo com a afirmação de que essa visão rompeu com o reducionismo tecnicista, para dicotomia existente entre o social, afetivo, cognitivo e o individual, uma vez que no espaço educacional existem os conflitos, as contradições, convergências -, para González Rey (2005), a pesquisa educacional deve considerar os sentidos e significações que depreendem de outras formas de vida social, os quais foram ocultados pelas teorias produzidas sobre os processos de aprendizagem de alunos com deficiência intelectual, visualizando a sala de aula como lugar de relações de ensino aprendizagem não apenas cognitivas.  

Segundo González Rey (2005), o desenvolvimento é um processo ativo, contraditório, em que sentidos subjetivos foram produzidos em diversas experiências e se configuram no processo dialógico entre os sujeitos e os seus interlocutores diretos e indiretos – e essa visão respaldou a sua compreensão dos processos de aprendizagem de alunos com deficiência intelectual, por meio da valorização da subjetividade como uma dimensão implicada nas relações presentes no cotidiano dos espaços educativos pesquisados por Anache, tendo como guia a Epistemologia Qualitativa como guia.