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Projeto de Autoria no Curso

Por:   •  18/10/2020  •  Ensaio  •  1.254 Palavras (6 Páginas)  •  131 Visualizações

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Bairro de Fátima.

Niterói.

Verão de 2005.

Final de Tarde.

Naquela época, era costume que a vista da deformada janela da sala de visitas desse exatamente em direção a um guarda-sol pernoitado, criando um quadro que trazia certa beleza a aquela tentativa frustrada de um objeto de se misturar com a vegetação rasteira de um jardim. Ao mesmo tempo esse quadro acidentalmente entrelaçava memórias do mar e uma certa dose de personalidade efêmera ao hit do momento que tocava no quintal vizinho.

...

Aqueles três copos na sua frente denunciavam o tanto de tempo ociocoso que havia sido investido sentado na mesa, Tito não via a hora de tirar um cochilo. Subiu a escada, tirou a camisa e se jogou na direção oposta a ela, e que coincidentemente era a mesma direção aonde se encontrava a cama. Ele o fez com tanta rapidez que não precisou nem chegar totalmente de encontro à queda macia pra se ter noção de que os lençóis haviam sido limpos naquela mesma manhã. Quem o visse ali, confortávelmente contorcido, podia jurar que Tito dedicava o seu mais engomado “Deus te abençoe” a sua mãe só pela forma preguiçosa com que fungava.

Pouco a pouco, Tito começava a se sentir de certa forma traído pelo próprio corpo. Notou que, diferente de como se sentia sentado na mesa momentos atrás, agora podia dizer que o principio de sono não havia vingado.  

Tito estava acordado, mas tão acordado que no mesmo ritmo que estremecia suas narinas ele podia sentir não só o cheiro dos lençóis, mas também o aroma encorpado do café de sua Irmã Sophia. Um perfume que deveria ser evitado, especialmente naquele dia, pois provocava reações adversas até nos poros do braço. Um perfume capaz de afetar Tito tão profundamente que, a cabo de um momento, ele foi capaz de deslizar sua mão esquerda pelo lençol e numa tentativa desesperada pôs o indicador da sua respectiva mão em rota de compressão com as suas próprias narinas, a fim de abafar aquele zumbido sensorial vindo da cozinha.

Quando desistiu de vencer a batalha pelas vias do ofato, Tito resolveu salvar a sanidade corporal restante. Direcionou todas as forças do braço esquerdo para o chão assim que percebeu que seu travesseiro tinha sido arremessado no chão graças a ele mesmo. Logo comprimiu a almoçada na nuca, misturando em doses iguais a brutalidade de uma tentativa de asfixia encenada numa cena de assassinato (utilizando como referência um filme de serial killer que havia assistido na noite anterior) com a busca por um conforto similar ao encontrado durante um beijo idealizado.

 Tal dualidade foi demais para Tito, e ele, aos poucos, arrastava a peça de forma que proporcionava certa dose de massagem para seus ombros confusos, ainda que ele fizesse tudo às pressas.

 Largam-se as lisas fibras e abrem-se as ásperas paginas do livro que recentemente começou a ler. Não tardou a facilmente se pegar distraído e olhando para fora da janela o anoitecer de verão. Ele tenta ler novamente, mas ainda sem sucesso. Seu olhar examina o quarto, os objetos abandonados e os cantos escuros como se procurasse alguma alma pra contar sobre a leve irritação na nuca que sentia no momento.

O calor mesmo ao anoitecer o forçava a ficar na beirada, mais pro lado de fora de casa do pra dentro do quarto propriamente. Foi quando Tito escutou bem baixinho a seguinte frase aleatória:

“Si tratta de um Piazzetta, ragazzo!”

O qual ele creditou apenas ser mais um dos ocasionais ecos da família Itáliana vizinha, cujas conversas uma vez ou outra esbarravam no seu quarto.

“Piazzetta, piazzeta!”

Ele repetiu mentalmente com um sotaque caricato-tímido, fazendo com que risse de si mesmo por não mais que 10 segundos.

 A imitação improvisada e malfada rendeu frutos, Tito lembrara do passeio com sua amiga Esther, somando detalhes e mais detalhes a memória a cada “Piazzetta” repetido para fins cômicos.

A única conexão que fazia entre estes pontos distintos do seu dia é que parte da sua manhã no museu com Esther foi dedicada a observar uma excepcionalmente fiel reprodução em miniatura do Palazzo de Rucellai, que, segundo a legenda informativa ao lado da maquete, era uma casa de cidade renascentista do século XV.

Tito continuou procurando no quarto um cantinho com a cara de quem ele pudesse contar algo que ele não tinha coragem de contar a Esther, sobre o passeio deles, sobre o motivo de ter encostado a mão na dela enquanto seus olhares percorriam os corredores da maquete (decisão essa que de tão constrangedora da parte de Tito foi sequer foi comentada no decorrer do passeio).

Menos de um minuto depois resolveu mudar de estratégia, já estava voltando para cama. O plano de repetir Piazzetta sussurrando saiu pela culatra e se tornou sufocante.  Sufocante por que o segredo de Tito precisava sair de seu corpo. Até seu short o sufocava.

...

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