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O Entendimento Jurisprudência

Por:   •  4/8/2021  •  Trabalho acadêmico  •  2.303 Palavras (10 Páginas)  •  66 Visualizações

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O direito a não autoincriminação – no latim, princípio do nemo tenetur se detegere –, versado no inciso LXIII, art. 5º da Constituição Federal, impede que o cidadão brasileiro seja coagido a realizar ou produzir provas contra si, trazendo-lhe prejuízo no âmbito processual. A doutrina e a jurisprudência são pacificas no entendimento de que, embora a Constituição disponha somente sobre o direito de permanecer calado, este, envolve também outras garantias, como a que diz respeito a produção de provas. Nesse sentido, Guilherme de Souza Nucci afirma:

Trata-se de decorrência natural da conjugação dos princípios constitucionais da presunção de inocência (art. 5º, LVII) e da ampla defesa (art. 5º, LV), com o direito humano fundamental que permite ao réu manter-se calado (art. 5º, LXIII). Se o indivíduo é inocente, até que seja provada sua culpa, possuindo o direito de produzir amplamente prova em seu favor, bem como se pode permanecer em silêncio sem qualquer tipo de prejuízo à sua situação processual, é mais do que óbvio não estar obrigado, em hipótese alguma, a produzir prova contra si mesmo. (2011, p. 86)

Desse modo, o acusado tem a possibilidade de se negar a produzir provas por meio da intervenção corporal, como ocorre nos testes de alcoolemia, não podendo o Estado compeli-lo a realizar provas que o prejudicaria. Porém, com o advento do art. 165-A do Código de Transito Brasileiro, ao negar a prática do teste do bafômetro ou teste sanguíneo, o indivíduo responde administrativamente pelo ocorrido, ficando a mercê das sanções elencadas no mencionado artigo.

Muito se questiona sobre a aplicação do princípio do nemo tenetur se detegere no âmbito do Direito Administrativo, entretanto na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 395, ocorrida em 14 de junho de 2018, o Ministro Celso de Mello, em seu voto, aduz a não aplicação de tal princípio em sanções administrativas, sendo pertinentes, especialmente, na persecução penal, como exposto no trecho abaixo:

Cabe advertir, portanto, presentes tais razões, que a ausência de colaboração do indiciado ou do réu com as autoridades públicas, de um lado, e o exercício da prerrogativa constitucional contra a autoincriminação, de outro, não podem erigir-se em fatores subordinantes da decretação de prisão cautelar ou da adoção de medidas que restrinjam ou afetem a esfera de liberdade jurídica de qualquer réu, como resulta claro da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal:

(...)

“– A recusa em responder ao interrogatório policial e/ou judicial e a falta de cooperação do indiciado ou do réu com as autoridades que o investigam ou que o processam traduzem comportamentos que são inteiramente legitimados pelo princípio constitucional que protege qualquer pessoa contra a autoincriminação, especialmente quando se tratar de pessoa exposta a atos de persecução penal. O Estado – que não tem o direito de tratar suspeitos, indiciados ou réus, como se culpados fossem, antes do trânsito em julgado de eventual sentença penal condenatória (RTJ 176/805-806) – também não pode constrangê-los a produzir provas contra si próprios (RTJ 141/512), em face da cláusula que lhes garante, constitucionalmente, a prerrogativa contra a autoincriminação. (…).” (HC 99.289/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Logo, entende-se que as sanções empregadas ao descumprimento dos testes de alcoolemia não ofendem a garantia da não autoincriminação, podendo ser ignorada frente a procedimentos administrativos.

É perfeitamente questionável a inconstitucionalidade do art. 165-A, fundamentada na garantia contra a autoincriminação. Mesmo que não haja obrigação em cumprir os procedimentos previsto no art. 277 do CTB, as sanções aplicadas aquele que rejeita cumpri-los, violariam, em tese, o princípio anteriormente mencionado. Portanto, há uma desuniformidade jurisprudencial, existindo entendimentos diferentes acerca do assunto. O Supremo Tribunal Federal se manifestou favorável ao cabimento do art. 165-A, negando provimento a um recurso extraordinário que alegava sua inconstitucionalidade:

DECISÃO: Trata-se de agravo interposto contra decisão de inadmissibilidade de recurso extraordinário em face de acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, (Colégio Recursal de Catanduva), ementado nos seguintes termos: “Ação anulatória de auto de infração. Dirigir sob a influência de álcool. Recusa em fazer o teste de etilômetro. Aplicação das penalidades do art. 165 do CTB ao condutor que se recursa a submeter a qualquer dos procedimentos insertos no § 2º do art. 277 do CTB. Alegação de vícios formais no auto de infração e notificação realizado. Descabimento. Auto de infração e notificação que contêm, na espécie, os requisitos exigíveis do art. 280 do CTB. Presunção de veracidade e legitimidade dos atos administrativos não elidida pelo autor. Sentença Improcedente. Recurso Improvido. Manutenção da sentença pelos seus próprios fundamentos. Art. da Lei 9099/95”. (eDOC 12, p. 2). No recurso extraordinário, interposto com fundamento no art. 102, III, “a”, da Constituição Federal, aponta-se violação aos arts. 5º, XV, LV e LXIII, do texto constitucional. (eDOC 13). Aduz-se, em síntese, que o bafômetro não seria o único meio de constatação da embriaguez, e que ninguém é obrigado a produzir prova contra si mesmo. Assim, argumenta-se que o arts. 277, § 3º e 165-A do CTN seriam inconstitucionais. Decido. A irresignação não merece prosperar. O Tribunal de origem, ao examinar a legislação infraconstitucional aplicável à espécie (Código de Trânsito Brasileiro) e o conjunto probatório constante dos autos, consignou que o recorrente ao ser abordado pelo policial se recusou a fazer o teste de etilômetro, o que atrai a incidência do artigo 277 do CTB. Nesse sentido, extrai-se o seguinte trecho do acórdão impugnado: “ Nesse contexto é que destacamos o seguinte trecho da r. Sentença que bem resolve a controvérsia: Logo, através da interpretação de mencionados dispositivos, conclui-se que, para aplicação das penalidades e medidas administrativas previstas pelo Código de Trânsito Brasileiro, nos casos de infrações relacionadas à condução de veículo sob influência do álcool, basta a simples recusa do condutor infrator. O ilícito administrativo não se confunde com o penal, cujo tipo previsto no art. 306, CTB demanda efetiva alteração da capacidade psicomotora. Não há qualquer inconstitucionalidade no dispositivo, conforme reiterada jurisprudência do TJSP (…) O autor, em resumo, foi autuado em razão do descumprimento de regra de natureza administrativa, por ter se recusado a se submeter a exame que, diante da determinação expressa do § 3º, do art. 277, do CTB, implica nas mesmas cominações legais previstas no art. 165, da mencionada legislação.”. (eDOC 12, p. 3). Assim, verifica-se que a matéria debatida no acórdão recorrido restringe-se ao âmbito infraconstitucional, de modo que a ofensa à Constituição, se existente, seria reflexa ou indireta, o que inviabiliza o processamento do presente recurso. Além disso, divergir do entendimento firmado pelo Tribunal de origem demandaria o revolvimento do acervo fático-probatório, providência inviável no âmbito do recurso extraordinário. Nesses termos, incide no caso a Súmula 279 do Supremo Tribunal Federal. Confiram-se, a propósito, os seguintes precedentes: “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. RECURSO INTERPOSTO EM 17.02.2017. AUTO DE INFRAÇÃO. TESTE DO BAFÔMETRO. REGULARIDADE. REEXAME DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 279/STF. JULGAMENTO MONOCRÁTICO. POSSIBILIDADE. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA AMPLA DEFESA E DO CONTRADITÓRIO. AUSÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL. TEMA 660. 1. O relator pode julgar monocraticamente recurso manifestamente incabível. Precedentes. 2. Rever a regularidade do auto de infração por embriaguez ao volante requer o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, o que encontra óbice na Súmula 279/STF. 3. O Supremo Tribunal Federal já assentou, sob a sistemática da repercussão geral, que suposta ofensa aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e dos limites da coisa julgada, quando a violação é debatida sob a ótica infraconstitucional, não apresenta repercussão geral, o que torna inadmissível o recurso extraordinário. (RE 748.371-RG, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe 1º.08.2013 tema 660). 4. Agravo regimental a que se nega provimento, com previsão de aplicação da multa prevista no art. 1.021, §4º, CPC”. (ARE 1.019.554 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, DJe 21.6.2017). “DIREITO ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. APLICAÇÃO DE MULTA. CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 5º, LIV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. DEVIDO PROCESSO LEGAL. NATUREZA INFRACONSTITUCIONAL DA CONTROVÉRSIA. EVENTUAL VIOLAÇÃO REFLEXA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA NÃO VIABILIZA O MANEJO DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ACÓRDÃO RECORRIDO PUBLICADO EM 18.6.2015. 1. Obstada a análise da suposta afronta ao inciso LIV do art. 5º da Carta Magna, porquanto dependeria de prévia análise da legislação infraconstitucional aplicada à espécie, procedimento que refoge à competência jurisdicional extraordinária desta Corte Suprema, a teor do art. 102 da Magna Carta. 2. As razões do agravo regimental não se mostram aptas a infirmar os fundamentos que lastrearam a decisão agravada, mormente no que se refere à ausência de ofensa direta e literal a preceito da Constituição da República. 3. Agravo regimental conhecido e não provido”. (ARE 928.592 AgR, Rel. Min. Rosa Weber, Primeira Turma, DJe 23.2.2016). Ante o exposto, nego seguimento ao recurso (art. 932, IV, a, do NCPC c/c art. 21, §1º, do RISTF) e majoro, em 10%, o valor da verba honorária fixada pela origem (eDOC 12, p. 4), observados os limites previstos nos parágrafos 2º e 3º do artigo 85 do CPC, ressalvada a concessão de justiça gratuita. Publique-se. Brasília, 28 de fevereiro de 2019. Ministro GILMAR MENDES Relator Documento assinado digitalmente. (STF - ARE: 1178114 SP - SÃO PAULO, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 28/02/2019, Data de Publicação: DJe-045 07/03/2019)

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