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Os Fatos Jurídicos

Por:   •  15/6/2015  •  Trabalho acadêmico  •  1.849 Palavras (8 Páginas)  •  827 Visualizações

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1. Introdução

Este trabalho visa aliar às cenas do filme “O Auto da Compadecida” os fatos jurídicos em sentido amplo, distinguindo fatos jurídicos de fatos comuns em relação ao Direito Civil. Antes de começar a análise do fime em si, entretanto, é válido fazer uma diferenciação dos fatos jurídicos dos fatos comuns. Segundo grande parte da doutrina, fato comum é toda ação humana ou fato da natureza que não interessa ao Direito. Já os fatos jurídicos (em sentido amplo) são acontecimentos, previstos em norma de direito, em virtude dos quais nascem e se extinguem as relações jurídicas.

O fato jurídico lato sensu pode ser classificado em:

I – Fato Jurídico em sentido estrito (ou Fato Jurídico Natural):

        1) Ordinário: é um fenômeno da natureza, sem intervenções da vontade humana, ocorre normalmente, como o nascimento, o decurso do tempo, a maioridade, a morte (ressaltando que não pode se confundir a morte com a conduta homicida).

        2) Extraordinário: trata-se do caso fortuito ou da força maior, não há como precisar o momento do início ou do alcance. Ex.: um tufão, maremoto.

II – Ato Jurídico em sentido amplo:

        1) Ato-Fato Jurídico: o elemento volitivo não é relevante e, sim, o resultado obtido pelo ato-fato. Ex.: Art. 1264

        2) Ato Jurídico em sentido estrito: o elemento volitivo é relevante, porém não é capaz de modificar a efetuabilidade ordinária produzida pelo ato. Os efeitos são os impostos pela lei, como o reconhecimento de um filho, não havendo, portanto, regulamentação da autonomia privada. Ex.: o casamento, a adoção, reconhecimento de filiação

        3)Negócio Jurídico: o elemento volitivo é relevante, portanto os efeitos são os desejados pelas partes, como um Contrato de Compra e Venda, havendo, logo, autonomia entre as partes. Pode-se adicionar à declaração de vontade elementos acidentais ou cláusulas acidentas (Condição, Termo, Encargo).

III – Ato Ilícito: praticado em desacordo com a ordem jurídica, conduta antijurídica.

2. Análise do filme “O Auto da Compadecida” de acordo os fatos jurídicos (lato sensu)

Diante do exposto, então, é possível analisar os fatos jurídicos presentes no filme em questão.

1)         A primeira cena analisada se trata de quando Chicó e João Grilo vão atrás do padeiro, o qual está precisando de um ajudante. O padeiro queria contratar inicialmente apenas um ajudante por 5 tostões. O padeiro, como o serviço é muito, diz que contrata os dois amigos, como ajudantes, pelo preço de um. Usando da sua esperteza, João Grilo engana o padeiro ao dizer que Chicó irá trabalhar por dois, ganhar 5 tostões, que é o preço de 1, e dará contra da metade do serviço, enquanto João trabalhará por mais dois, ganhará o preço de outro e dará conta da outra metade. João Grilo diz a verdade, mas utiliza-se de artifícios na fala para enganar o padeiro.

Nessa cena, foi acordado um negócio jurídico, mais precisamente um contrato, em que uma das partes paga um valor em troca de um serviço prestado. Para que um negócio jurídico ocorra, é preciso que ele satisfaça o plano da existência, de validade e o de eficácia. Uma das condições que compõe o plano da existência é a declaração de vontade, na cena do filme, o contrato é celebrado oralmente, mas isto não impede o elemento volitivo. Já em relação ao plano de validade, há um vício de consentimento neste contrato, tornando-o passível de anulabilidade: o vício em questão foi o dolo (Art. 145 ao 150), este consiste em um erro somado a uma operação ardilosa, pois há uma utilização de artifícios para induzir a outra parte ao erro, no caso é o que João Grilo faz com o padeiro, levando este à prática de um ato que o prejudique. O dolo pode ser o dolus bonus (a manobra não prejudicará a outra parte), dolus malus (utilizado para prejudicar o outro) ou o dolus acidental (apesar do dolo, o negócio seria realizado, embora de outro modo). No caso, portanto, sendo o dolus malus.

  1. A segunda cena analisada refere-se ao furto, por Chicó e João Grilo, da comida da cachorra. Sendo, portanto, um ato ilícito, pois a ação deles vai de encontro com o disposto na norma jurídica vigente.
  2. Chicó e João Grilo vão pedir para o padre benzer a cachorra da mulher do padeiro, o padre diz que não o fará, mas João Grilo afirma que a cachorra é do Major, então o padre aceita benzer. Novamente, pode-se dizer que foi um negócio jurídico celebrado oralmente e com vício de consentimento, o dolus malus.
  3. A morte da cachorra da mulher do padeiro não caracteriza um fato jurídico pelo fato dela não ser um ser humano, mas caso se tratasse de um ser humano, seria um Fato Jurídico (em sentido estrito) ordinário.
  4. Para convencer o padre a enterrar a cachorra, João Grilo afirma que ela tem um testamento “passado em cartório”, o qual foi escrito pelo padeiro e a cachorra “assinou” com a pata. E neste testamento havia uma quantia para o padre e para o bispo, pois ela queria ser enterrada como cristã. Conforme já foi dito, para que um negócio jurídico exista, é preciso que ele preencha o plano de validade e, para isso, de acordo com o Art. 104, o agente precisa ser capaz de celebrar o negócio. Essa capacidade das partes se refere a capacidade de fato ou de exercício. Com isso, pode-se afirmar que o testamento da cachorra é um negócio jurídico inexistente, pois a Cachorra é um animal, não tendo personalidade jurídica, pois de acordo com o artigo 1º e 2º do Código Civil de 2002, só pessoa, ser humano é capaz de exercer direitos e deveres na ordem civil, iniciando a personalidade jurídica com o nascimento com vida. Assim, falta capacidade a cachorra para que ela possa praticar qualquer negócio jurídico.

Apesar do testamento não ser válido, pode-se, entretanto, observar que o enterro como cristã é uma condição para que o padre e o bispo recebam os nove contos de réis, sendo, portanto, uma condição suspensiva, já que a eficácia do ato fica suspensa até a realização do evento futuro e incerto.

  1. Cena em que o Major Antônio Morais oferece um emprego a João Grilo, mas faz três perguntas para João Grilo como condição para que João consiga o emprego. Se João acertar as perguntas, ele consegue o emprego com o Major, caso não, o Major “arrancará uma tira de couro das costas” de João. Pode-se observar a existência de um contrato de emprego, o qual seria um Negócio Jurídico, pois há livre manifestação entre as partes. Foi posta uma condição suspensiva para que João Grilo fosse empregado, que é ele acertar as três perguntas, porém se João não acertar as perguntas, o Major arrancaria uma tira de couro de João. Este fato invalidaria, já que, conforme o artigo 123 do Código Civil, referindo-se ao plano de validade do negócio jurídico, as condições ilícitas invalidam o negócio, pois o fato de João dispor do próprio corpo é uma conduta ilícita, uma vez que, de acordo com o artigo 13 do Código, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando contrariar os bons costumes.
  2. O fato jurídico aqui analisado refere-se ao presente que é prometido à Rosinha pela sua avó, mas apenas quando Rosinha se casasse. Caracteriza-se, portanto, uma esponsal, uma promessa de casamento. Consiste, por conseguinte, em um negócio jurídico condicionado (doação com condição), sendo uma condição suspensiva, pois a doação só ocorrerá se houver um casamento.
  3. Chicó e João Grilo vão à casa do Major para que este conceda o casamento entre Chicó e Rosinha, contudo João Grilo mente sobre as condições financeiras de Chicó, afirmando que este é um homem muito rico, pois só assim o Major aprovaria o casamento. Há nesta situação uma questão peculiar, pois sabe-se que o casamento não é um negócio jurídico e, sim, um ato jurídico, mas dentro deste contexto e da época em que se passa o filme, o casamento é, de fato, tratado como um negócio jurídico, o qual ocorre com um vício de consentimento, já que há a presença do dolus malus (mentira sobre as condições financeiras).
  4. Ainda no contexto da “negociação” do casamento, o Major manda Chicó pagar 10 contos de réis para a reforma da Igreja, alegando que está sem o dinheiro no momento, o Major Antônio Morais empresta o dinheiro, mas, como garantia, pede que João Grilo vá buscar a escritura da Fazenda Serra Talhada de Chicó, pois deverá dar a fazenda como garantia do empréstimo. João Grilo afirma que a palavra é muito mais importante do que a escritura e diz que Chicó dá como garantia uma tira de couro sua. Chicó carimba o dedo como assinatura do contrato e João Grilo também, como testemunha. Primeiramente, existe um negócio jurídico, um contrato particular de empréstimo de dinheiro com garantia. A garantia, antes, era a suposta fazenda pertencente a Chicó, mas passa a ser “uma tira de couro” do mesmo. Ademais, de acordo com o atual Código Civil, não é possível a garantia com uma parte do corpo, pois este não é um bem disponível quando contrariar os bons costumes, logo o objeto da garantia não é lícito, atingindo o plano de validade do negócio jurídico.

No ordem cronológica normal, há ainda algumas cenas correspondentes ao homicídio de diversos personagens do filme, mas a fim de otimizar o tempo, durante a aula na qual o filme foi exibido, adiantou-se para a cena do casamento, por isto estas cenas não assistidas em classe não serão aqui analisadas.

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