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Resenha Crítica Gramsci

Por:   •  21/10/2019  •  Resenha  •  2.043 Palavras (9 Páginas)  •  413 Visualizações

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Resenha crítica de GRAMSCI, Antonio. Cadernos do cárcere. Vol. II. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001. [p. 15-53].

Vanessa Corrêa Cézar

Cadernos do Cárcere é como são chamados 29 cadernos que Antonio Gramsci escreveu enquanto esteve preso em Turi e, posteriormente, Fórmia, na Itália, entre 1926 e 1937. Originalmente composto por 33 cadernos, trata-se das reflexões do pensador comunista sobre temas como filosofia, educação, jornalismo, teoria política e econômica, literatura, gramática, etc. O volume II, na edição brasileira, é composto pelos cadernos 12, 24 e 28, que são considerados como “cadernos principais” por terem recebido maior atenção do autor, sendo retomados e reescritos, aprofundando o tema tratado em cada um; entre os “cadernos especiais” encontra-se os chamados “cadernos miscelâneos” que consistem em notas e fragmentos sobre temas variados, mas pertinentes ao “caderno principal” anterior. Nestes escritos Gramsci teoriza sobre a função e a construção da figura do intelectual, sobre jornalismo e expõe sua proposta de reforma educacional.

Gramsci inicia o caderno 12 - Apontamentos e notas dispersas para um grupo de ensaios sobre a história dos intelectuais – com uma questão acerca da origem e o papel dos intelectuais na sociedade. Ele define dois tipos de intelectuais: o orgânico, intelectual que se mantem conectado à sua classe de origem como gerador, administrador e difusor da sua ideologia, associado à burguesia, e o tradicional, intelectual que acredita que, por conta da sua “qualificação”, está em condição esclarecida e independente do grupo social dominante, seu distanciamento garante, ao mesmo tempo, uma inabilidade em compreender os mecanismos ideológicos hegemônicos e sua omissão diante da luta de classes. É a este intelectual tradicional que ele se detém, dando ênfase ao estudo de como são formados, como atuam dentro da sociedade e qual seu impacto na luta de classes pois, por afirmarem ser comprometidos apenas com a ciência e a “verdade”, possuem uma figura de autoridade diante das massas, principalmente em ambiente rural e pequenos centros urbanos. Sua preocupação em compreender esse tipo de intelectual fica claro na passagem:

Os intelectuais de tipo rural são, em grande parte, “tradicionais” , isto é, ligados à massa social do campo e pequeno-burguesa, de cidades (notadamente dos centros menores), ainda não elaborada e posta em movimento pelo sistema capitalista: este tipo de intelectual põe em contato a massa camponesa com a administração estatal ou local (advogados, tabeliães, etc.) e, por esta mesma função, possui uma grande função político-social, já que a mediação profissional dificilmente se separa da mediação política. Além disso: no campo, o intelectual (padre, advogado, professor, tabelião, médico, etc.) possui um padrão de vida médio superior, ou, pelo menos, diverso daquele do camponês médio e representa, por isso, para este camponês, um modelo social na aspiração de sair de sua condição e de melhorá-la. O camponês acredita sempre que pelo menos um de seus filhos pode se tornar intelectual (sobretudo padre), isto é, tornar-se um senhor, elevando o nível social da família (...).

A atitude do camponês diante do intelectual é dúplice e parece contraditória: ele admira a posição social do intelectual e, em geral, do funcionário público, mas finge às vezes desprezá-la, isto é, sua admiração mistura-se instintivamente com elementos de inveja e de raiva apaixonada. Não se compreende nada da vida coletiva dos camponeses, nem dos germes e fermentos de desenvolvimento nela existentes, se não se leva em consideração, se não se estuda concretamente e não se aprofunda esta subordinação efetiva aos intelectuais: todo desenvolvimento orgânico das massas camponesas, até um certo ponto, está ligado aos movimentos dos intelectuais e deles depende. (GRAMSCI, 2001, vol. 2, p. 22-23)

Fica claro que a questão dos intelectuais tradicionais preocupava Gramsci justamente pela pretensa “posição de isenção” da influência do sistema de classes que eles personificavam, induzindo o proletariado a ideia de que não só é possível como é moralmente superior se eximir da tomada de consciência e do posicionamento sobre a condição desigual das classes sociais. A “contribuição” desses intelectuais não só prejudicaria o acesso dos militantes à estes grupos da classe proletária como seria, intencionalmente ou não, agente conservador dos interesses das elites no poder. Daí a necessidade de assimilação desse grupos tradicionais através da “conquista ideológica”, que também está ligada a capacidade de uma classe social gerar intelectuais orgânicos. (GRAMSCI, 2001, vol. 2, p. 19)

O autor critica a postura negligente do movimento socialista de sua época em relação ao campo das ideias e a concepção determinista de inevitável colapso do modo de produção capitalista que, de certa forma, trazia uma postura menos ativa do partido sobre alguns assuntos, entre eles, a educação. Traçando uma linha de argumentos que conecta os intelectuais, o partido e o sistema educacional como única possibilidade para uma transformação revolucionária da sociedade, pois é somente através de uma educação contínua dos membros do partido, para que atuem como intelectuais orgânicos vinculados à classe proletária e para que tenham capacidade e autonomia para enxergar as críticas e as mudanças necessárias dentro do próprio partido, que se tornaria possível produzir e assimilar, ideologicamente, novos intelectuais orgânicos e tradicionais, respectivamente.

 Após trazer esta análise, Gramsci busca uma solução que vá na raiz da questão sobre a educação, compreendendo espaços educativos diversos e destacando novamente a urgência do desenvolvimento de mais intelectuais orgânicos à classe proletária e que estejam alinhados com o partido revolucionário. Essa proposta educacional seria uma forma de romper com a hegemonia da classe dominante, a qual utiliza o sistema educacional para formar seus intelectuais mas também para alienar e manipular a classe subalterna, trazendo assim, uma nova concepção de formação intelectual e moral capaz de construir indivíduos conscientes e autônomos:

A escola unitária ou de formação humanista (entendido este termo, “humanismo”, em sentido amplo e não apenas em sentido tradicional), ou de cultura geral, deveria assumir a tarefa de inserir os jovens na atividade social, depois de tê-los elevado a um certo grau de maturidade e capacidade para a criação intelectual e prática e a uma certa autonomia na orientação e na iniciativa. (...) A escola unitária requer que o Estado possa assumir as despesas que hoje estão a cargo da família no que toca à manutenção dos escolares, isto é, requer que seja completamente transformado o orçamento do ministério da educação nacional, ampliando-o enormemente e tornando-o mais complexo: a inteira função de educação e formação das novas gerações deixa de ser privada e torna-se pública, pois somente assim ela pode abarcar todas as gerações, sem divisões de grupos ou castas. (GRAMSCI, 2001, vol. 2, p. 36-37)

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