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A Produtividade de Uma Escola Improdutiva - Frigotto

Por:   •  21/9/2022  •  Resenha  •  7.211 Palavras (29 Páginas)  •  130 Visualizações

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No capítulo introdutório assinalamos que o volume de trabalhos que se colocam numa perspectiva crítica à teoria do capital humano tem crescido tanto no âmbito econômico, como no sociológico, e mesmo, especificamente, no âmbito educacional. O desvendamento do real nas suas múltiplas determinações não se dá por verdades prontas, mas pela produção da verdade do real cada vez mais global, abrangente, ainda que sempre passível de ampliação e superação.

Enquanto ampliação, tendo como ponto de partida a discussão presente sobre o vínculo ou desvínculo entre a educação e estrutura econômico-social capitalista, e, como referencial, a análise efetivada no Capítulo II, buscaremos recolocar a questão do papel do sistema educacional no interior das formas que assumem as relações capitalistas hoje.

Sobre este aspecto, a idéia básica é que assim como o capital, no seu processo de acumulação, concentração e centralização pelo trabalho produtivo vai exigindo cada vez mais, contraditoriamente, trabalho improdutivo, como se fossem verso e anverso de uma mesma medalha, a "improdutividade da escola" parece constituir, dentro desse processo, uma mediação necessária e produtiva para. A desqualificação da escola, então, não pode ser vista apenas como resultante das `falhas` dos recursos financeiros ou humanos, ou da incompetência, mas como uma decorrência do tipo de mediação que ela efetiva no interior do capitalismo monopolista. Surge aqui, a problemática da direção e da estratégia que essa prática educativa deve assumir no interior do capitalismo monopolista, onde se amplia a separação entre mundo da escola e produção, trabalho manual e mental, e onde o Estado exerce uma dupla exploração.

Da análise até aqui realizada, a ideia fundamental é que a teoria ou doutrina do capital humano, enquanto um determinado processo e forma de conhecimento da realidade, não é algo que nasce por acaso. O mascaramento fundamental decorre da visão burguesa de que cada indivíduo é, de uma forma ou de outra, proprietário e, enquanto tal, depende dele -- e não das relações sociais, das relações de poder e dominação -- o seu modo de produção da existência. Ela se estrutura, em sua formalidade, com um referencial neoclássico que se afasta cada vez mais das formas concretas que assumem as relações de produção no capitalismo monopolista. Deste afastamento resulta a sua força de ilusão e, ao mesmo tempo, da legitimação das novas formas que assumem as relações capitalistas de produção.

O segundo capítulo buscou constituir-se no referencial para se entender o caráter circular da teoria do capital humano; e, ao historicizar esta teoria, revelar a que e a quem ela serve. A tentativa de apreender o movimento de autovalorização do capital e as novas formas que vem assumindo e, no seu interior, o novo papel que o Estado desempenha nos levou a perceber que a teoria nasce se desenvolve como um mecanismo de recomposição das próprias crises do capital em sua fase imperialista atual.

Com base no que desenvolvemos nos capítulos anteriores, julgamos poder abordar a questão dos vínculos entre o sistema produtivo e o sistema educacional (formal ou não-formal) por um ângulo que as abordagens mais usuais, sobre esta questão, não apreendem.

Parte 1

A ênfase das análises sobre os vínculos ou relações entre escola ou processo educativo e o sistema produtivo pode ser visualizada em três tendências bastante nítidas.

A concepção do capital humano, como vimos, postula que a educação e o treinamento potenciam o trabalho e, enquanto tal, constitui-se num investimento social ou individual igual ou superior ao capital físico. Há, nessa concepção, um vínculo direto entre educação e produção. A educação e a qualificação aparecem como panaceia para superar as desigualdades entre nações, regiões ou indivíduos.

A segunda visão, partindo de um "apelo a Marx", também postula que a educação potencia trabalho, gerando maior produtividade. Assume-se, pois, a existência de um vínculo direto entre mundo da produção e mundo da escola, ou com o processo educativo em geral.

Finalmente, encontramos a visão, também apoiada em Marx, que situa a um mesmo nível a posição burguesa neoclássica de capital humano e a dos críticos acima aludidos, que vêem no sistema educacional um mecanismo de produção e ampliação de produção de mais-valia relativa extorquida pelo capital.

O trabalho mais recente e diretamente estruturado em função dessa crítica é a tese de Salm cujo objeto central é "o conflito entre o agigantamento patológico do sistema educacional e as condições de trabalho avultadas para a maioria".

Seguindo o processo de desqualificação crescente e aviltamento do trabalho pelo sistema produtivo, Salm vai defender que é no seio da produção mesmo que devemos buscar a formação das qualificações requeridas e não numa instituição à margem, como é a escola.

O trabalho de Saem, é preciso frisar, sob o aspecto específico da relação entre processo produtivo imediato e processo de qualificação, tema central de sua tese, representa uma desmistificação do vínculo direto, linear, entre produção e qualificação - idéia-força da teoria do capital humano, amplamente assumida tanto pela tecnocracia educacional brasileira, quanto por aqueles "críticos" que concebem genericamente o trabalho escolar como um poderoso instrumento de produção de mais-valia relativa.

Primeiramente notamos que Salm, ao criticar, e adequadamente, tanto os neoclássicos por sua visão linear e a-histórica, como os "críticos" que enfatizam o vínculo entre produção e educação, por entenderem que a "qualificação" feita pela escola produz mais-valia relativa, cai, de certa forma, numa visão mecânica e simplificada, concebendo a escola como "não-capitalista" ou uma instituição que está à "margem" do sistema produtivo, pelo fato de não-existência do vínculo direto.

Percebemos, então, que tanto os neoclássicos e os críticos a que Saem se refere, quanto seu posicionamento frente a esses críticos, se caracterizam pelo abandono do campo das mediações a nosso ver, da prática educativa, escolar ou não-escolar.

Na medida em que a escola efetivamente não se define como sendo uma instituição que está na base da estrutura económico-social, e como tal, não é nela historicamente que se efetiva o embate fundamental do conflito capital/trabalho, faz pouco sentido a discussão do vínculo ou desvinculação direta, imediata. A direção da análise, tomando-se a especificidade da prática escolar em momentos históricos diferentes e em realidades específicas, situa-se não na busca de se demonstrar que a "escola serve ao capital de forma direta e imediata, ou que a "escola não é capitalista" ou uma "instituição à margem", mas na apreensão do tipo de mediação que essa prática realiza historicamente no conjunto das práticas sociais e, especificamente, com a prática da produção material.

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