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As Jurisprudência na Administração

Por:   •  5/6/2020  •  Monografia  •  7.052 Palavras (29 Páginas)  •  111 Visualizações

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NOVOS DANOS NA RESPONSABILIDADE CIVIL. A PERDA DE UMA CHANCE

1. A lei não dispõe expressamente sobre a indenização por perda da chance, mas nossa doutrina e jurisprudência consolidadas admitem, atendidos os requisitos, a responsabilização daquele que, agindo indevidamente, impede a superveniência de um fato que poderia trazer benefício ao lesado.1

2. É antiga a lição de Serpa Lopes, que admitia, em meados do século passado, o ressarcimento pela frustração, quando a possibilidade de obter lucro ou evitar prejuízo era muito fundada, isto é, quando mais do que a possibilidade havia uma probabilidade suficiente.2

3. Na perda da chance, há processo interrompido com a aniquilação da oportunidade (de ganho, de evitação de resultado, de cura), e o ordenamento jurídico autoriza uma interpretação mais alargada do conceito de dano, para nele compreender também essa perda. Respeitável corrente de opinião entende que, entre o dano incerto, que não é indenizável, e o dano certo, que merece reparação, situa-se em posição intermédia o dano que consiste na perda de uma chance. À falta de previsão legal expressa, admite-se a incidência do art. 403 nessa hipótese:

Embora a realização da chance nunca seja certa, a perda da chance pode ser certa. Por esses motivos não vemos óbice à aplicação criteriosa da Teoria. O que o art. 403 afasta é o dano meramente hipotético, mas, se a vítima provar a adequação do nexo causal entre a relação culposa e ilícita do lesante e o dano sofrido (a perda da probabilidade séria e real), configurados estarão os pressupostos do dever de indenizar.3

4. A responsabilidade civil tem por pressupostos: ação ou omissão ilícita (em certos casos, também lícita), o dano injusto ao patrimônio jurídico do outro,4 a relação de causalidade entre a ação e o dano,5 o fator de atribuição (culpa ou risco).

A responsabilidade por perda de uma chance6 deve apresentar esses mesmos componentes, sendo que o dano consiste na perda de uma expectativa favorável (dano imediato).7-8-9

A perda da chance pode derivar de ação (comissão) ou omissão, praticada por descumprimento de contrato, ou por violação delitual (extracontratual), atingindo vítimas imediatas ou por ricochete (por exemplo, quando os parentes sofrem pela perda da chance da vítima).10

Sua abordagem pode ter dois focos: o dano ou a relação causal. O chamado approche restritivo, que se situa no nível do dano (é a perda certa de uma vantagem provável – é o caso do concurso perdido); approche extensivo, que se situa no plano do nexo causal (o dano se realiza, mas não se pode demonstrar com certeza a relação entre a falta cometida e o resultado – é o caso do erro médico).11 Acertada é a primeira corrente. Porquanto o resultado final (resultado mediato) está fora da relação “perda da chance”, o que se indeniza é o dano pela perda da oportunidade. O resultado final deve existir, mas não interessa para o exame do dano e da causalidade da perda da chance, apenas serve para assegurar a legitimidade da expectativa (concurso, cura) e para a avaliação da indenização pela oportunidade perdida (prêmio, vida, saúde), considerando o bem mediato.

A consideração de um fato futuro, para compor a figura da perda da chance, não é novidade do instituto da responsabilidade civil, pois assim acontece na condenação em lucros cessantes (prejuízo futuro que aparece como certo), e na indenização do dano pré-contratual pela recusa de celebração de um contrato futuro.

Vejamos as hipóteses de fato que podem existir para que se reconheça a perda de uma chance.

5. Caso clássico. “A” tem a expectativa de obter um prêmio, alcançar uma promoção,12 ser aceito em um emprego, vencer um concurso,13 ganhar uma causa judicializada.14 “B”, por ação ou omissão, pela qual responde por culpa ou objetivamente, elimina essa expectativa, que não mais poderá ser realizada.15 O dano consiste na eliminação da expectativa. O nexo de causalidade está entre a ação do agente e o dano imediato (perda da expectativa, isto é, a perda da chance). O dano não consiste na perda do prêmio, da promoção ou do concurso, que seria o resultado final, definitivamente eliminado pela perda da chance. No entanto, o prêmio, a promoção ou o concurso devem existir, como fato ou como programa. Esse fator externo não integra a relação de responsabilidade, apenas justifica a existência da expectativa. Nada há de eventual na perda da chance: o dano acontece no momento da frustração da oportunidade.

A avaliação do dano levará em conta a participação causal do agente na eliminação da expectativa e o grau de probabilidade de alcançar o resultado mediato (externo). Nesse caso, a expectativa é um traço da realidade concreta, que está no patrimônio jurídico de “A”, diminuído pela ação de “B”. O lesado deve provar que o fato externo existia ou estava programado; que ele estava (naquele momento) em condições de alcançá-lo; que o réu praticou a ação que eliminou a expectativa de obter o resultado aleatório, sem que incida causa excludente da responsabilidade do agente. A avaliação será feita com os dados da concorrência causal do agente, das condições de o lesado alcançar o resultado, no nível da probabilidade.

6. Outra hipótese é a perda da oportunidade de evitar o mal. “A” tem a expectativa de evitar ou diminuir um prejuízo (um incêndio, um assalto). Esse prejuízo realmente ocorre. “B”, por ação ou omissão, eliminou essa expectativa (os aparelhos de prevenção instalados não funcionaram, ou funcionaram mal). “B” não responde pelo resultado mediato (incêndio ou assalto), mas apenas pela perda da chance de evitá-lo (resultado imediato, dano imediato). O lesado deverá provar que (i) a expectativa de evitar existia, com os cuidados preventivos que adotara; (ii) a ineficiência dos serviços de proteção, que eliminaram a sua expectativa; (iii) o grau de probabilidade de evitar o resultado mediato.

Se “A” está colocado na posição de garantidor do bem ameaçado e se omite na sua proteção, “A” responde pelo resultado. É o mesmo que acontece no direito criminal, quando se pratica crime comissivo por omissão, que somente pode ser cometido por quem é o guardião e não cumpre o seu dever, assim permitindo que o resultado danoso ocorra. Responde pelo resultado final.

7. Os casos médicos merecem cuidado especial.

O erro médico pode estar no diagnóstico, na avaliação de um exame, no receituário, no tratamento etc. Se o paciente sofre um dano em virtude disso (morte, incapacidade), surge a questão da responsabilidade do médico ou do profissional da saúde que cometeu o erro. Temos a ação (ou omissão) e o dano final, ambos fatos certos. Quando ficar demonstrado que do erro resultou o dano, quer dizer, quando estabelecido, de acordo com a teoria causal aceita, que a ação indevida foi a causa do dano final (morte, sequela etc.), o agente responde integralmente. Se inexistir essa prova do nexo causal, mas comprovados os outros dois elementos (ação e resultado), sendo a ação uma condição presente no nexo causal (mas não a causa provada), os tribunais franceses têm deferido uma indenização parcial.16

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