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A Introdução à Ontologia

Por:   •  25/9/2020  •  Relatório de pesquisa  •  17.584 Palavras (71 Páginas)  •  83 Visualizações

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Curso Online de Filosofia

Olavo de Carvalho

Aula 201

20 de abril de 2013

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Hoje temos aqui esse texto esplêndido do Philippe Perrot, do prefácio que ele escreveu ao livro Introduction à l’Ontologie (Introdução à Ontologia): um dos livros fundamentais do Louis Lavelle; que não é um livro fácil, e não é de maneira alguma uma introdução, mas é uma apresentação da própria filosofia ontológica do Louis Lavelle. Esse livro é particularmente importante por apresentar os três conceitos fundamentais da ontologia de Louis Lavelle: Ser, Existência e Realidade.

Esses conceitos podem ser resumidos mais ou menos assim: o Ser não pode ser confundido com o conjunto do que existe, e nem mesmo com o conjunto dos processos reais, porque isso seria reduzi-lo aos seus efeitos, reduzi-lo às suas criações; o Ser só pode ser compreendido como tudo isto inserido dentro da sua causa ou princípio fundante. Esse princípio, por sua vez, diz o Lavelle, não pode ser concebido senão como uma subjetividade criadora, autônoma, independente e totalmente auto-suficiente.

        

Ele entende, em seguida, por Existência a forma especificamente humana de ser, que é compartilhar um fragmento da força criadora do Ser na medida em que somos dotados da liberdade — podemos escolher quem nós vamos ser e, na verdade, o escolhemos a cada momento, a cada decisão que tomamos, a cada escolha que fazemos, ainda que não o percebamos, ainda que acreditemos que estamos agindo apenas por hábito, nós estamos ainda exercendo a nossa liberdade. Isso tem implicações de ordem moral que considero a parte mais difícil do ensinamento: levar as pessoas a perceberem a sua liberdade, e a perceberem as implicações das suas decisões. Particularmente, isso é difícil no Brasil por motivos que eu vou explicar daqui a pouco.

        

E, por fim, o conceito de Realidade, que é o campo onde o ser humano exerce a sua liberdade — ou a exerce ou abdica dela. Este campo é o que nós, normalmente, chamamos o mundo: a Realidade e o mundo, para Lavelle, são a mesma coisa, e nenhum deles é o Ser.

        

O ser humano é, portanto, uma espécie de intermediário entre o Ser e o mundo, entre o Ser e a Realidade; ele participa de um e participa de outro. Ou seja, em parte, ele é uma coisa, um animal, um ente condicionado por mil e uma circunstâncias e determinações; mas, em parte, também, ele participa do Ser por meio da sua liberdade.

        

Mas, visto de uma outra maneira, diz ele, o mundo é a prova da fraqueza humana, o mundo é o intervalo. Se o homem é o mediador entre o Ser e o mundo; o mundo, por sua vez, é o intervalo ou o espaço que separa o homem do Ser — separa não só exteriormente, mas separa também interiormente, na medida em que, dentro de nós, temos um elemento do Ser, que é a nossa liberdade, e temos um elemento mundano (ou de Realidade), que é tudo aquilo que nos constitui biologicamente, socialmente etc.

        

Então, diz ele, existem duas maneiras de você perder a conexão com a liberdade (isso vai ser explicado no texto, mais tarde). A primeira é, evidentemente, você identificar o Ser com a Realidade — isso, hoje em dia, é quase obrigatório, porque as pessoas tomam a realidade existente como se fosse o último limite do Ser, isto é, não há um Ser além das coisas (do mundo das coisas, incluindo aí o mundo social). E a outra maneira é você se identificar com o próprio Ser; isto é, você tentar aquilo que o René Guénon chamaria a última realização metafísica: você ser absorvido no Ser. Neste caso, a liberdade humana não faria o menor sentido, e, no primeiro caso, ela é perdida.

        

Então vamos ler esse texto aqui e examiná-lo pouco a pouco. É uma longa introdução, de cinqüenta páginas, muito eficiente, que o Philippe Perrot fez para a Introdução à Ontologia. A numeração, a seguir, é minha; eu a usei só para facilitar as coisas.

        

1. Na origem da obra filosófica há, necessariamente, um ponto de contato com o real suficientemente forte para suscitar o despertar do pensamento e dar-lhe, com ou sem razão, o sentimento de que tem aí uma abertura para o segredo do mundo.

        

Existem vários filósofos que insistiram nesse tipo de experiência. Henri Bergson dizia que toda a Filosofia era apenas a explicitação (ou exteriorização) de uma única intuição que o sujeito tivera um dia, e que ele tentava expressar e precisar, por todos os meios, pelo resto da sua vida. Lembro de ter lido uma coisa similar, também, em Ortega y Gasset, e que ele até datava mais ou menos a época da vida em que a pessoa tinha isso: “acontece entre os vinte e seis e os vinte e oito anos”. O sujeito percebe alguma coisa, e essa coisa, ele nota, está para além da experiência imediata da realidade; e que, de algum modo, ele conseguiu penetrar numa camada mais profunda e ter, por assim dizer, um vislumbre do Ser (entendido, no caso, como subjetividade criadora auto-suficiente).

        2. “É bom que cada um tente trazer de volta ao seu pensamento aquelas experiências primeiras nas quais, ultrapassando o mundo da aparência e do hábito, ele acreditou perceber, como num relâmpago, a essência mesma desta vida... E aquele que tem mais filosofia... é também aquele para o qual [essas experiências] ainda persistem quando os outros as esqueceram”.

        Isso aqui é absolutamente fundamental. Eu até acredito que Ortega y Gasset não está muito certo quando diz que “isso acontece entre os vinte e seis e os vinte e oito anos”, porque me lembro de ter tido essa experiência quando era muito pequeno — e, se eu tive, outras pessoas podem ter tido também. Até coloquei aquilo num blog que eu estava fazendo — depois parei o blog, mas os textos continuam publicados, um deles se chama “O filósofo-mirim”[1] e o outro “Confissões de um brontossauro”[2].

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