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Negociação e Administração de Conflitos

Por:   •  6/10/2020  •  Trabalho acadêmico  •  5.053 Palavras (21 Páginas)  •  91 Visualizações

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ATIVIDADE INDIVIDUAL

Matriz de análise

Disciplina: Negociação e Administração de Conflitos

Módulo: julho/2020

Aluno: Marcelo Lopes David Filho

Turma: MBA Business Law

Tarefa: Atividade Individual

Introdução

O homem é um ser social por natureza e, por isso, a negociação encontra-se presente em todas as fases e âmbitos de vida, na medida em que se relacionar acaba por gerar conflitos entre os indivíduos, exigindo-se, assim, que sejam adotadas medidas para a sua resolução.

Com efeito, os indivíduos são diferentes entre si, com desejos, vontades, culturas e crenças diversas e, por isso, utilizam-se da ferramenta negocial para lidar com os conflitos que por venturam surjam da sua interação, a qual, com o advento tecnológico, encontra-se mais intensa e complexa.

Ocorre que, a despeito da negociação estar presente na vida de todos, muitos desconhecem ou ignoram as técnicas e métodos para ser um bom negociador, acreditando, no mais das vezes, que negociar exige, ao final, a existência de um vencido e um vencedor.

Ao contrário, negociar é a arte do consenso, da busca pelo equilibro e pela comunhão de interesses e objetivos. Uma negociação é exitosa quando ambas as partes saem satisfeitas, preservando-se, ainda, o bom relacionamento entre elas.

Negociar, a despeito de estar presente na vida de todos, não é uma tarefa fácil, na medida em que, além de técnica, envolve aspectos emocionais e psicológicos das partes que influenciam sobremaneira no processo negocial. Em razão disso, é certo que quem domina minimamente a arte de negociar tem muito mais chances de satisfazer os interesses envolvidos e atingir os objetivos traçados na negociação.

Feita essa breve introdução sobre o tema, tem-se que o presente trabalho tem como objetivo analisar o processo de negociação retratado no filme “Coach Carter: treino para a vida”, lançado em 2005 pelo diretor Thomas Carter e estrelado pelo ator Samuel L. Jackson.

Em um primeiro momento, será apresentado o plano de fundo da história retratada no filme e seus principais personagens. Após, serão analisadas as técnicas de negociação apresentadas, analisando o processo negocial a partir da classificação dos atores da negociação, identificação das fontes de poder, ferramentas e táticas e, ainda, avaliação das etapas da negociação e da comunicação verbal e não verbal descrita. Por fim, serão avaliados os aspectos positivos da negociação retratada, apresentando, ainda, sugestões de melhorias.

Desenvolvimento – análise do processo de negociação representado no filme eleito

O filme “Coach Carter – Treino para a Vida” é um filme de drama teuto-estadunidense lançado em 2005, que conta a história de Ken Carter, o dono de uma loja de artigos esportivos que aceita ser o técnico de basquete da sua antiga escola. Ao aceitar o cargo, mais do que se preocupar em tornar os jogadores vitoriosos nas quadras, Carter objetivava que os mesmos conseguissem superar a pobreza que estavam inseridos e, com bons rendimentos acadêmicos, pudessem ir para a universidade.

Assim sendo, Carter impõe um rígido regime, no qual os alunos que quisessem continuar jogando no time de basquete deveriam assinar um contrato que incluía um comportamento respeitoso, modo adequado de se vestir e ter boas notas e frequência em todas as matérias, o que, ao longo do filme, fez com que surgissem vários conflitos e, ainda, que Carter adotasse medidas drásticas e que geraram espanto em toda a comunidade escolar.

Durante todo o filrme, são retratados diversos momentos em que os personagens negociam entre si, cujos processos e dinâmicas negociais serão sintetizadas no presente trabalho.

Em relação à classificação das partes envolvidas nas negociações (atores da negociação), tem-se, pelo modelo proposto por Wood e Colosi (1999), que o processo de negociação é multidimensional, composto pela dimensão horizontal, vertical interna, interna e vertical externa. Sua compreensão ajuda a identificar “os stakeholders, indivíduos e grupos que afetam e são afetados pelo processo, os que se opõem e podem criar barreiras e os que podem ajudar a construir pontes e conexões”.[1]

Na dimensão horizontal é que se encontra a mesa de negociação, com as partes de cada lado visíveis e interagindo entre si. Nesse plano, também se encontra a figura dos intermediários, formais e informais, que podem afetar o resultado das negociações. Na dimensão vertical interna é onde são definidas a estratégia e as implicações dos resultados dentro de faixas e limites estabelecidos. A negociação na dimensão interna, por sua vez, busca-se auxiliar no planejamento, colaborando com movimentos táticos. Por fim, na dimensão vertical externa busca-se identificar os tomadores de decisões estratégicas e as relações de poder e de influência que lá ocorrem.[2]

No filme analisado, os principais atores das negociações são o treinador Ken Carter e o time de basquete da escola, que se encontram na dimensão horizontal. Há, ainda, outros atores que, no decorrer do filme, também passam a integrar diretamente a negociação, tais como os pais dos alunos e a diretora da escola.

Os pais e a diretora também podem ser inseridos na dimensão vertical interna, uma vez que, embora não participassem diretamente da negociação relizada entre o treinador e os jogadores, poderiam influenciar no resultado. O conselho da escola, por sua vez, pode ser inserido na dimensão vertical externa, dada a sua autoridade na tomada de decisão.

Classificando os atores da negociação a partir de duas características fundamentais do relacionamento entre as partes, quais sejam, as ideias e a confiança, pode-se dizer que, no início do processo negocial (quando o treinador é apresentado ao time de basquete), as partes envolvidas eram adversários, na medida em que, além de não existir confiança entre elas, as ideias era divergentes, uma vez que, enquanto Ken Carter objetivava que os jogadores fossem bons alunos e pudessem entrar em uma universidade, os atletas desejavam, apenas e tão somente, treinar basquete e vencer os jogos do campeonato.

Com o passar do tempo, o relacionamento entre as partes foi se consolidando, de modo que, no final do filme, treinador e jogadores eram aliados, já que existia confiança entre eles e as ideias passaram a ser convergentes (quando os atletas entenderam a importância do estudo para seu futuro e, ainda que autorizados pelo conselho a participarem dos jogos, optaram por continuar estudando para que pudessem atingir as notas e frequências mínimas estipuladas no contrato firmado com Carter).

Pode-se dizer que, em relação ao treinador e a diretora da escola, os mesmos começaram o filme como oponentes (havia confiança entre eles, mas também algumas divergências de ideias, especialmente em relação à possibilidade de os jogadores irem para a universidade) e, no final, notadamente quando a diretora precisa proferir seu voto durante o julgamento do conselho, tem-se que as partes passaram a ser aliados.

Quanto aos estilos e comportamentos dos negociadores, pode-se dizer que, enquanto Carter se encaixava no perfil de administrador ou controlador (valoriza a tradição, os costumes e as regras sociais e, ainda, é orientado pelo cumprimento de metas, resultados e efeiciência[3]), os jogadores apresentavam um perfil ativo (motivados pela necessidade de liberdade e ação).

Outrossim, deve-se compreender que a negociação é um processo e, portanto, é composta por etapas que se seguem umas as outras e que, ao final, buscam alcançar o objetivo traçado. Dessa forma, a negociação inicia com a fase de planejamento, na qual se busca determinar as partes, o objeto e o contexto e, a partir de então, definir as estratégias e métodos que serão utilizados durante a execução. Após, inicia-se a fase de execução, que se subdivide em preliminar (onde as apresentações são feitas e o relacionamento é iniciado), abertura (onde as primeiras propostas são feitas), exploração (na qual de busca a geração de opções de acordo) e encerramento (quando é concretizado o acordo). Por fim, tem-se a fase de controle, que tem por objetivo controlar as condições posteriores, avaliar o processo e aprender com a experiência.[4] 

Em relação às etapas do processo de negociação retratado no fime, nota-se, logo no início, a fase de planejamento, tendo em vista que, antes de aceitar o cargo de treinador, Ken Carter busca assistir um jogo de basquete do time da escola Rickmond e, ainda, obter informações sobre os alunos, analisando sua disciplina dentro do vestiário a fim de definir a estratégia a ser utilizada durante a negociação.

Assim, em razão das informações colhidas na fase de planejamento, quando o treinador se apresentou aos alunos (fase preliminar), dando início a fase de execução da negociação, já trouxe consigo o contrato com as cláusulas que deveriam ser aceitas pelos jogadores do time (ter boas notas, assistir todas as aulas, usar determinadas vestimentas, etc), cujas regras estavam adequadas ao perfil dos mesmos (esse momento pode ser inserido na fase de abertura e exploração da etapa de execução).

A fase de encerramento ocorre quando os jogadores aceitam as condições apresentadas pelo treinador, assinando o contrato e dando início aos treinamentos em quadra.

Posteriormente, na fase de monitoramento, Ken Carter solicita à diretora os relatórios acadêmicos dos jogadores, de modo a verificar se os mesmos estão cumprindo com os termos do contrato, especialmente no que tange a frequência às aulas e a obtenção das notas mínimas estipuladas. Diante da inércia da diretora em entregar os documentos requeridos, o treinador passa a ir diretamente às aulas e, ao indagar sobre a presença dos jogadores, descobre que não estavam respeitando os termos do acordo que foi celebrado.

O monitoramento da negociação também ocorre quando Ken Carter interdita a quadra de basquete e impede que o time participe dos jogos, até que os jogadores passem a obter melhores notas e frequentar as aulas da escola.

No final do filme, Ken Carter faz uma avaliação do projeto que realizou, considerando satisfatórios os resultados obtidos com a negociação, na medida em que, além do time de basquete se mostrar vencedor nos jogos, grande parte dos jogadores, com a melhora na atividade escolar, conseguiu ser aprovado em universidades (sendo esse o principal objetivo perseguido por Carter).

Verifica-se que, no início da negociação, para Ken Carter, atingir o objetivo traçado (que os jogadores do time de basquete tirassem boas notas e conseguissem ir para a universidade) era mais importante do que manter um bom relacionamento com os atletas, ou seja, o treinador era voltado apenas para o resultado. Com o passar o tempo, o treinador passou a ser mais flexível com a rigidez das regras impostas, prezando mais pelo relacionamento sem, contudo, perder de vista o objetivo almejado.

Além disso, nota-se que, ainda que inicialmente em conflito, o treinador e os jogadores apresentavam interesses comuns, relacionados a tornar o time de basquete vitorioso. Entretanto, em relação às posições das partes negociantes, conquanto para Carter o objetivo seria alcançado mediante a melhora acadêmica dos jogadores, para estes, apenas os treinos em quadra seriam suficientes.

Com efeito, por interesses deve-se entender quais são os verdadeiros anseios e objetivos das partes negociantes, ou seja, a real motivação para a negociação, ainda que não estejam visíveis ou sejam facilmente identificáveis. Posição, por sua vez, representa a forma que cada parte entende a mais viável/melhor para atingir os objetivos traçados.[5]

No decorrer do filme, os jogadores passaram a comungar dos mesmos interesses e objetivos do treinador, inclusive quanto à forma (posição) que os mesmos seriam alcançados (dedicação aos estudos).

Em relação aos critérios da negociação, tem-se que Carter os definiu de forma objetiva, uma vez que o resultado almejado seria avaliado por padrões objetivos, quais sejam, as notas e frequência dos alunos.

Importante ressaltar, nesse ponto, que a definição de critérios objetivos é fundamental para uma boa negociação, na medida em que afasta eventual sensação de injustiça da contraparte e, ainda, ancora a negociação em bases claras, imparciais e facilmente aceitas por todos.[6]

Durante todo o processo negocial retratado no filme, Ken Carter, além da inteligência emocional, sempre foi claro e objetivo em relação a seus interesses, não deixando dúvidas sobre as regras que deveriam ser seguidas pelos jogadores e o que ele esperava deles como performance, seja dentro da quadra, seja, principalmente, dentro da sala de aula.

Outrossim, Ken Carter demonstrou possuir, como negociador, as seguintes características: preparação estratégica e visão holística do problema, integridade, autocontrole, ter raciocínio rápido sobre pressão e incerteza e capacidade de se expor a riscos.

No que tange às bases de poder da negociação, essas representam importante referência para a escolha do posionamento estratégico das partes negociantes, sustentando o grau de influência que uma parte tem sobre a outra. Assim, identificando-se o poder relativo entre as partes, os posicionamentos estratégicos poderão ser melhor definidos, de modo a profuzir efeitos efetivos no processo negocial.[7]

Com efeito, pode-se citrar três variáveis que sustentam o poder das partes em uma negociação, sendo elas o tempo (esolha da melhor oportunidade), a informação (obtenção de informação correta) e o poder do negociador (oriundo de diversas fontes).[8] 

No filme analisado, em relação às fontes de poder, verifica-se que Ken Carter se utilizou de várias delas durante o processo negocial com os jogadores. Em um primeiro momento, cita-se o poder da recompensa, na medida em que, caso os jogadores apresentassem boas notas e frequências nas aulas, poderiam continuar fazendo aquilo que mais gostavam: jogar basquete.

Pode-se mencionar, também, o poder da coeção, uma vez que o treinador, a partir do fechamento da quadra e suspensão dos treinos/jogos, pressionava os jogadores para que melhorassem os seus resultados acadêmicos. Outra fonte de poder era a posição hierárquica do treinador, na medida em que, por ser o técnico, poderia definir quem iria ou não jogar no time, o que fez com que muitos aceitassem as condições impostas no contrato, ainda que, inicialmente, não concordassem com elas.

Tem-se, ainda, o poder decorrente do conhecimento do treinador que, por já ter estudado na mesma escola e tido inúmeras vitórias no basquete, tinha conhecimento e talento no que tange ao objeto da negociação e, por isso, era mais respeitado pelos alunos. Por fim, cita-se o poder da persuasão, uma vez que, em diversas passagens do filme, o treinador buscava persuadir a contraparte (jogadores, pais, diretora e conselho) a partir de argumentos emocionais e, ainda, criando uma identificação com eles (já que também tinha estudado na escola e jogado basquete naquele time), demonstrando preocupação e compreensão com a realidade e passando uma mensagem de esperança sobre um futuro melhor que poderia ser alcançado pelos jogadores.

Em relação ao tempo da negociação, Carter tinha um deadline bem definido, uma vez que havia sido contratado para treinar o time de basquete por quatro meses. Além disso, o treinador também fez uso estratégico do fator tempo quando, objetivando com que os alunos apresentassem uma rápida melhora acadêmica, fechou a quadra de basquete e suspendeu os treinos no meio do campeonato. Dessa forma, como os jogos seguintes estavam se aproximando, os jogadores não tiveram outra alternativa além de aceitar as condições do treinador e iniciar os estudos na biblioteca.

A variável relativa à informação também foi bem explorada por Carter, na medida em que, antes da negociação, o treinador buscou colher informações sobre o perfil dos jogadores, evitando surpresas e traçando a melhor abordagem durante o processo negocial. Durante a fase de monitoramento, Carter também buscou informações confiáveis sobre a situação acadêmica dos jogadores, o que lhe deu substrato para constatar que os mesmos não estavam cumprindo com as condições do contrato.

Outrossim, quanto aos posicionamentos estratégicos das partes, tem-se que os mesmos são definidos a partir da intensidade com que o negociador orienta suas ações para os relacionamentos ou para os resultados. Nesso contexto, os posicionamentos mais radicais priorizam em alto grau as tarefas (uso do poder) ou as pessoas (amaciamento), um em detrimento do outro. A forma integrativa, por sua vez, consiste na busca conjunta para a solução das divergências e antagonismos.[9] 

Em relação ao filme, no início da negociação, o treinador, fazendo uso do poder (posicionamento estratégico), tinha foco total no resultado, o que acabou por gerar uma antipatia em relação aos jogadores e demais atores com quem precisava negociar. Inclusive, parte dos alunos apresentou um posicionamento estratégico de fuga, na medida em que, considerando as exigências feitas e o poder de Carter, desistiram de jogar e deixaram o time de basquete.

Com o passar do tempo, a negociação deixou de ser instintiva e passou-se a adotar uma postura de integração, buscando maximizar os resultados com a preservação do relacionamento.

Ademais, um dos itens importantes na fase de planejamento de uma negociação é a definição dos limites das propostas que poderão, ou não, ser aceitas. Para tanto, é importante ter por referência a melhor alternativa em caso de não acordo (MACNA), a qual serve de baliza para o negociador saber quando deve se retirar da negociação, uma vez que, aceitar qualquer proposta situada abaixo da linha do MACNA, representa prejuízo para alguma das partes.[10] 

Quanto ao MACNA (melhor alternativa em caso de não acordo) identificado no processo negocial do filme analisado, verifica-se que, quando da contratação do treinador pela escola, enquanto o MACNA da escola seria buscar outros técnicos no pouco prazo que tinham, o MACNA de Ken Carter seria continuar trabalhando em sua loja de esportes. Tal cenário fez com que a escola aceitasse as condições do treinador, qual seja, ter liberdade total na condução do trabalho.

Em relação ao técnico e jogadores, tem-se que, enquanto o MACNA dos alunos era não jogar no time de basquete, o do treinador era procurar outros jogadores para o time, o que fez com que os jogadores aceitassem as condições do contrato apresentado por Carter.

Além disso, durante as negociações realizadas, Carter lançou mão de várias táticas para atingir os objetivos traçados. Inicialmente, a fim de demonstrar respeito e criar uma relação de confiança, exigiu que os jogadores o chamassem de ‘senhor’, tal como ele os chamava. Além disso, no decorrer do filme, ao tentar convencê-los da importância dos estudos, apresentou dados e estatísticas, trazendo a negociação para o campo objetivo e racional e, dessa forma, dificultando que os alunos rebatessem seus argumentos.

Não bastasse, por diversas vezes, o treinador também fez uso de argumentos indiretos e, ainda, mediante metáforas ou histórias (inclusive a sua própria, uma vez que já tinha estudado na esola e jogado no time de basquete), a fim de atingir a emoção e convencer os jogadores da importância do estudo. Além disso, Carter buscava não fazer uso de palavras negativas, de modo que eventuais recusas eram exteriorizadas por meio de perguntas ou frases afirmativas.

Quando Carter apresenta as condições do contrato aos jogadores, é possível perceber que fez uso da tática da concorrência, argumentando que, caso eles não aceitassem, ele iria buscar e treinar outros alunos da escola para que integrassem o time de basquete.

Além disso, quando da reunião do conselho, Carter fez uso da tática da retirada, já que ameçou deixar o cargo de técnico do time de basquete caso fosse suspensa sua determinação de fechamento das quadras e não participação dos jogos do campeonato. Com efeito, se a tática utilizada, em relação ao conselho, não surtiu efeito, já que, na votação, a maioria definiu pela autorização do uso da quadra e participação dos jogos, em relação aos jogadores a ameaça foi exitosa, uma vez que, ao buscar seus pertences na escola, Carter foi surpreendido pelos jogadores estudando na quadra, recusando-se a treinar enquanto não atingissem as notas mínimas previstas no contrato.

Outrossim, negociação é comunicação, seja ela verbal e não verbal, de modo que as mensagens passadas de uma parte a outra são composta de palavras, gestos e expressões que, muitas vezes, se contradizem, o que exige atenção redobrada dos negociantes em relação à sua linguagem corporal.[11]

Analisando a comunicação verbal e não verbal do processo de negociação retratado no filme, verifica-se que, quando Carter é apresentado aos jogadores e expõe as condições do contrato para que pudessem jogar no time, sua expressão corporal é firme e em total sintonia com que estava falando. Seus gestos e olhar não deixam dúvidas que, caso alguém não respeitasse as regras, estaria fora do time, tranpassando a imagem da seriedade e importância que aquele trabalho lhe representava. Nesse momento, a despeito de parte dos alunos aceitarem as condições apresentadas, a expressão corporal dos mesmos era de contrariedade, demonstrando que só concordaram para que não sofressem as consequências de eventual negativa (afastamento/exclusão/expulsão do time).

Além disso, os alunos, ao terem que chamar o técnico de ‘senhor’, o faziam com deboche, ironia e, no mais das vezes, sequer olhavam diretamente para ele, o que demonstra que não estavam levando a sério as exigências/condições do treinador.

Mesmo em momentos de embate, Carter não alterava o tom de voz e a postura, de modo a passar uma imagem de firmeza, segurança e convicção aos jogadores.

Há um momento do filme, entretanto, em que a comunicação não verbal do treinador não estava em sintonia com suas palavras. Na passagem do filme em que os jogadores, em conjunto, começam a fazer flexões para que Cruz pudessem voltar ao time, a despeito de Carter manter o tom de voz e buscar manter a firmeza/dureza enquanto técnico, sua postura, além de transparecer surpresa, também demonstrou que o treinador ficou orgulhoso pelo fato dos jogadores terem pensado e agido como uma equipe.

De toda forma, Carter demonstrou ter controle de suas emoções em todas as negociações que realizou, fazendo com que sua linguagem corporal refletisse a seriedade e importâncias das suas palavras.

Em relação às concessões, são poucas as passagens do filme em que Carter fez concessões aos alunos. Em uma dessas, após expular Battle do time, o treinador o aceitou de volta desde que ele se comprometesse com as regras definidas e, ainda, fizesse a quantidade de flexões indicadas. Nesse momento, ao ouvir o relato comovente da mãe do aluno, Carter buscou equalizar os interesses, de modo que o treinador, com empatia, buscou entender e compreender os problemas enfrentados pelo jogador decorrentes da morte de seu irmão. Nesse momento, Carter ouviu atentamente os argumentos da mãe e do aluno e buscou ler os sinais não verbais (olhar e tom de voz) para verificar se realmente estava comprometido a voltar ao time.

Dentre os aspectos positivos do processo negocial retratado no filme, pode-se citar o fato de Carter sempre negociar a partir de critérios objetivos e quantificáveis (notas e frequência dos alunos), não dando azo para critério puramente subjetivos e emocionais. Com isso, o treinador sempre deixou claro para aos jogadores o que eles deveriam cumprir/respeitar para poder continuar jogando no time.

Além disso, a postura adotada por Carter também é um ponto que merece destaque. Em todo o decorrer do filme o treinador não perdeu a firmeza no trato com os jogadores ou com os conflitos que surgiram. Sempre se manteve focado em alcançar os objetivos que foram por ele traçados quando aceitou o cargo de técnico do time de futebol.

Pode-se citar também, como aspecto positivo, a preocupação de Carter em, antes de iniciar a negociação, colher informações sobre os jogadores, de modo a, conhecendo o perfil da contraparte, se preparar adequadamente para a negociação. Esquecida por muitos negociadores, a fase do planejamento foi correta e habilmente explorada por Carter, que já traçou seus objetivos, bem como a forma que iria negociar (estratégia), a partir das informações obtidas anteriormente.

Como sugestões de melhoria, pode-se citar a postura de Carter no início da negociação, que se mostrou irredutível/inflexível nas condições apresentadas, sem buscar um consenso com a contraparte (jogadores), o que fez com que, inicialmente, restasse prejudicado o bom relacionamento entre eles. Além disso, a despeito de ser claro em seus objetivos e condições, Carter não buscou exercer uma escuta ativa e compreender os interesses mais mediatos dos jogadores, compreendendo, ou ao menos tentando compreender, a realidade dos mesmos.

Assim, Carter falhou ao não ouvir a contraparte (jogadores), de modo a compreender seus reais interesses e motivações para jogar no time de basquete da escola. A realidade na qual os jogadores estavam inseridos foi ignorada pelo treinador quando definiu as condições do contrato sem buscar outras opções que fossem viáveis à negociação.

Outrossim, a forma com que Carter se portou durante toda a negociação (irredutível quanto à sua posição), a despeito de alcançar os resultados esperados, poderia ter inviabilizado por completo o processo negocial caso os jogadores se recusassem a seguir as ordens e deixassem o time ou, ainda, se revoltassem com o treinador e, por meio de pressão junto à diretoria ou ao conselho, conseguissem fazer com que fosse demitido. Assim, ao invés de negociar por posições, Carter poderia ter lançado mão da negociação baseada em princípios, consenso e relacionamento[12], concentrando-se nos interesses existentes e buscando se colocar no lugar dos jogadores para entender seus reais motivos e obstáculos.

Se a negociação baseada em princípios tivesse sido adotada desde o início por Carter, por certo que o treinador teria evitado os inúmeros embates e conflitos que teve com os jogadores, na medida em que, focando nos interesses (e não em posições), buscaria obter resultados mais sensatos e justos.

De todo modo, em uma análise global do processo de negociação retratado no filme, pode-se dizer que o mesmo foi exitoso, uma vez que, a despeito dos conflitos iniciais, acabou por atender, ao fim e ao cabo, as expectativas e interesses de todas as partes envolvidas.

Fazendo-se um paralelo da negociação retratada no filme e minha realidade profissional, posso dizer que, como advogado, já testemunhei inúmeras negociações em que, uma das partes, utilizando-se do poder para sustentar a influência sobre a contraparte, apresentava propostas de acordo com inúmeras condições (quase todas vantajosas apenas para si), recusando-se, por outro lado, a fazer qualquer tipo de concessão ou buscar eventual consenso.

Ainda que no filme os objetivos traçados por Carter com a posição adotada fossem, ao final, ser benéficos para os próprios atletas, é comum que, no mundo real, a inflexibilidade nas condições impostas tenha por propósito beneficiar apenas a parte que as fez, não havendo preocupação em manter ou criar um bom relacionamento com a contraparte.

Essa forma de negociação é muito comum nas relações de trabalho, na medida em que, os empregadores, fazendo uso de seu poder hierárquico e do desequilíbrio natural existente nesse tipo de relação, impõem, ainda que de forma velada, condições/exigências aos trabalhadores para que aceitem determinados pedidos ou soliticações. Nesse contexto, é comum que, a despeito da legislação brasileira exigir que certas definições sejam fruto de negociação entre patrões e empregados, e não decorrentes apenas do poder discricionário do empregador, é comum que, a partir de ameaças sofridas, os trabalhadores aceitem firmar contratos, obrigações ou eventuais perda de direitos, o que, finda a relação laboral, faz com que seja comum o ajuizamento de ações para que o Judiciário repare eventual direito lesionado ou, ainda, invalidade eventual manifestação de vontade feita sob coação.

Assim, diferentemente do filme que, com as condições impostas, Carter buscava ajudar os atletas a terem um futuro melhor, na vida real, adotar uma posição estratégica baseada no uso do poder e uma negociação baseada em posições (e não em princípios), preterindo a busca pelo consenso e pelo, no que for possível, atendimento aos interesses de todos os envolvidos, pode representar o insucesso do processo negocial, com o surgimento de inúremos conflitos e degradação total do relacionamento existente entre as partes, sem prejuízo, ainda, de eventuais implicações legais.

Por outro lado, os aspectos positivos verificados no filme também se aplicam à minha realidade profissional, na medida em que, um bom planejamento, com a colheita de informações corretas e relevantes, pode representar uma vantagem importante sobre a contraparte, auxiliando na definição da melhor estratégica (o que é fator de sucesso em um litígio ou demanda judicial) e, ainda, na antecipação de eventuais obstáculos ou problemas que possam surgir durante a fase de execução.

Considerações finais

O filme “Coach Carter – treino para a vida” é um ótimo exemplo para servir de análise e estudo do processo negocial, na medida em que, na sua história ficcional, acaba por retratar técnicas, táticas e fundamentos teóricos relacionados à negociação.

Como visto no desenvolvimento do presente trabalho, no filme é possível perceber com clareza os atores da negociação, bem como os estilos de cada um e os métodos/táticas utilizados no processo negocial. Além disso, as fases da negociação são bem marcadas, especialmente a fase de planejamento e a sua importância para o resultado exitoso do acordo.

Outrossim, tem-se as bases do poder da negociação e suas variáveis (tempo, informação e poder) identificadas no filme, bem como as fontes do poder do treinador que sustentava o seu grau de influência sobre os jogadores e, ainda, servia de parâmetro para o posicionamento estratégico das partes.

Destarte, é possível extrair do filme analisado a importância da negociação baseada em princípios, na qual, ao se identificar o real interesses das partes, busca-se o consenso e um resultado exitoso para todos, em contraposição a negociação baseada em posições, que, no mais das vezes, acaba por inviabilizar por completo o sucesso do processo negocial.

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