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Os Direitos da Personalidade

Por:   •  5/11/2020  •  Trabalho acadêmico  •  7.676 Palavras (31 Páginas)  •  104 Visualizações

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 Do  Direito à Vida ao Direito à Morte – Uma breve Reflexão[1]

Cristiane Gonçalves Kaizer[2]

1- Introdução

Nas palavras do doutrinador Daniel Francisco Mitidiero, “o direito pertence a cultura”[3]. Por este raciocínio, e partindo do princípio que a cultura é mutável e as  transformações são uma constante, tem-se como intento traçar uma linha de pensamento que assevere tal evolução.

É cediço que a civilização passou por muitos momentos em que nem mesmo um direito básico como o direito à vida era garantido pela ordem jurídica. Para que tal direito fosse alçado a categoria de direitos fundamentais foi necessário um longo percurso. No entanto,  após essa conquista, muitas  outras passaram a fazer parte desse rol.

Destarte, as construções filosóficas da contemporaneidade contemplam outros aspectos da vida, igualmente relevantes, como a saúde psiquica, o valor do trabalho,  vida digna. Em função da  complexidade e amplitude adquirida, o próprio direito à vida  pode apontar para possibilidades que a primeira vista pode parecer até mesmo  contraditório, como o direito à morte.

O objetivo do presente trabalho é discorrer sobre a necessidade/possibilidade  da descriminalização/legalização da eutanásia, tomando como parâmetro para isso, a análise histórico-filosófica da construção dos direitos positivados, fazendo para isso,  uma abordagem da perspectiva da teoria dos direitos humanos, dos direitos da personalidade e dos princípios constitucionais, em específico os que se relacionam à dignidade da pessoa humana.

2-  Do Direito à vida

O direito à vida está encartado dentro do rol do Capítulo I – Dos direitos e deveres individuais e coletivos na  Constituição Federal de 1988. Assim trata o Art. 5º: todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (…).

Paulo Gonet Branco afirma que:

“proclamar o direito à vida responde a uma exigência que é prévia ao ordenamento jurídico, inspirando-o e justificando-o. Trata-se de um valor supremo na ordem constitucional, que orienta, informa e dá sentido último a todos os demais direitos fundamentais” .(BRANCO, 2013)

A vida é, pois,  pressuposto básico para o exercício dos demais direitos constituídos, seja qual for o Estado-nação e a ordem jurídica prevalente. Não obstante, o próprio artigo 5º da Constituição Federal, inciso  XLVII traz uma exceção a essa regra, é o que se constata do texto:  não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX;  portanto, em que pese a vida ser um direito natural inquestionável,  nem por isso figura no ordenamento jurídico brasileiro como absoluto. Razão pela qual não se justifica a manutenção da indisponibilidade desse direito quando se trata do principal interessado nele, quando a vida de que se trata é a sua própria. Principalmente,  quando a justificativa para a disposição do próprio corpo é um grande sofrimento.

2.1- Perspectiva Histórico-filosófica

O direito à vida apesar  de ser um direito elementar foi necessário em muitos momentos da história de uma construção teórico-filosófica para minimizar e evitar a sua violação. É o que se pode depreender das teorias contratualistas clássicas[4].  Extrai-se também  o mesmo entendimento das teorias jusnaturalistas[5]. Em que pese o fundamento ser distinto, o caráter basilar do direito à vida permanece inalterado em ambas as teorias.

Em momentos outros, após a consolidação de legislações que buscavam garantir a vida, partiu-se para a busca do reconhecimento de direitos também importantes, como a igualdade, inicialmente formal,  caminhando em seguida para a garantia de igualdade substancial. E assim, sucessivamente, mais e mais direitos foram tomando corpo e compondo as ordenações jurídicas mundo a fora.

Para não se fazer um retorno a um tempo muito longíquo, partir-se-á das teorias contratualistas clássicas, as quais fundaram o Estado moderno. A começar por Thomás Hobbes[6], pai do estado absolutista. É possível por meio da análise de sua teoria  visualizar com clareza que a proteção da vida estava no cerne de todo o seu pensamento. O autor que olhando para uma civilização em guerra pretendeu que ao instituir um governo forte a vida estaria preservada. Ainda que mediante a outorga da liberdade de se defender por suas próprias forças, pois que, intituído um poder sem limites.

Já o teórico John Locke[7], pai do liberalismo econômico vislumbrava para além da proteção miníma da vida, alguns outros direitos civis, que segundo o autor compunham o direito natural do ser humano, por exemplo, o direito de propriedade. Para ele, tanto a vida, quanto a liberdade e os bens do ser humano, são sua propriedade, sendo que “a primeira coisa que a pessoa possui, portanto, é o seu corpo: todo indivíduo é proprietário de si mesmo e de suas capacidades” (RIBEIRO,2016)[8].

No final do séc. XVIII com a contribuição dos movimentos iluministas, da qual  Jean Jaques Rousseau foi um grande expoente, foi levado a cabo a Revolução Francesa que foi a expressão máxima, até então, da consolidação de direitos individuais. No entanto, conforme é cediço, direitos políticos e civis.

Nesse momento histórico a vida continua sendo um bem jurídico tutelado. Contudo, notem que o homem não era contemplado levando  em consideração todos os aspectos de sua existência. E isso, importa na privação da autodeterminação do indivíduo. O Que vai repercutir em mais de um século de história.

Na atualidade, porém, o direito à vida ganha  enfoques diversos. Na lição de André Ramos Tavares[9], o direito à vida assume duas vertentes, sendo a primeira no direito de permanecer existente, que é o direito principal. Em um segundo momento o direito a um adequado nível de vida. O que restará melhor explicado mediante o estudo da perspectiva do tópico que segue.

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