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Relaxamento de Prisão em Flagrante

Por:   •  9/9/2015  •  Resenha  •  2.947 Palavras (12 Páginas)  •  294 Visualizações

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FICHAMENTO

ZAFFARONI, Eugênio Raul. A palavra dos mortos. 1ª ed. Editora Saraiva, v.1, 2012, p. 324. VitalBook file.

A obra “A palavra dos mortos” de Zaffaroni apresenta um conjunto de conferências sobre a criminologia, com uma visão crítica a respeito da maneira como o crime é tratado pela sociedade, pelo poder judiciário e pela mídia. A décima sexta conferência, aqui destacada, trata em especial da criminologia midiática, expondo suas características e seus efeitos, instigando o leitor ao pensamento crítico.

DÉCIMA SEXTA CONFERÊNCIA: A CRIMINOLOGIA MIDIÁTICA (I)

Poder-se-ia dizer que, em paralelo às palavras da academia, há uma outra criminologia que atende a uma criação da realidade através da informação, subinformação e desinformação midiática, em convergência com preconceitos e crenças, que se baseia em uma etiologia criminal simplista, assentada em uma causalidade mágica.

O mágico é a ideia da causalidade especial, usada para canalizar a vingança contra determinados grupos humanos, o que, nos termos da tese de René Girard que comentamos dias atrás, faz desses grupos humanos bodes expiatórios. (p.303)

Zaffaroni inicia sua conferência distinguindo a criminologia acadêmica da criminologia midiática, sendo esta ultima caracterizada principalmente pela informação superficial e sem conteúdo, tendo como principal objetivo a disseminação de um discurso de vingança seletiva, sempre direcionada à determinados grupos.

 (A explosão francesa) No final do século XIX, o poder dos jornais e de sua construção da realidade alcançou limites até então sem precedentes, em particular na França em razão do caso Dreyfus, o que impressionou muito Gabriel Tarde. Em 1898, ele advertia sobre o enorme perigo que isso implicava. Infelizmente – escreveu –, a imprensa é beneficiária de uma enorme impunidade legal ou ilegal e pode publicar o assassinato, o incêndio, a espoliação, a guerra civil, organizar uma grande chantagem, aumentar a difamação e a pornografia ao nível das instituições intocáveis. A imprensa é o poder soberano dos novos tempos. (p.304)

No final do século XIX já era possível constatar que o poder exercido pela mídia, por meio dos jornais, havia alcançado precedentes sem limites e já representava o poder soberano dos novos tempos. Dois séculos depois, essa mesma constatação permanece vigente, mudando apenas os instrumentos utilizados pela mídia para exercer o seu poder de persuasão sobre a sociedade.

 (Sua tecnologia é televisiva) A característica central da versão atual desta criminologia é proporcionada pelo meio técnico empregado: a televisão. Por isso, quando falamos de discurso, não o fazemos no sentido da linguagem pura falada ou escrita, mas da mensagem imposta por meio de imagens. (p.305)

(O concreto e as catástrofes) Como a comunicação de imagens não costuma ser atrativa – ter gancho – provocando pensamento, deve impactar na esfera emocional mediante o concreto. Por isso, não é de se estranhar que os noticiários mais pareçam uma síntese de catástrofes, que impressionam mas que não dão lugar à reflexão.

Às vezes a imagem nem sequer precisa de som: recordemos que a imagem do 11 de setembro era muda, não havia ruídos, gritos, nada, só a interpretação do comentarista, que assinalava ao destinatário indefeso o que se estava vendo. A imagem não fala, quem fala é o intérprete. (p.306)

Atualmente, os programas sensacionalistas são campeões de audiência. Eles exploram o produto “crime”, pois sabem que a criminalidade representa um campo de vasto entretenimento, que prende a atenção do público do início ao fim e, consequentemente, aumenta a audiência da emissora.

Dessa forma, é mostrado diariamente inúmeros crimes, sempre com um “intérprete” revoltado, inconformado com a “impunidade”, clamando pela “justiça” e pela punição a todo custo.

(“Eles” como um todo: uma massa criminosa de “diferentes”) A criminologia midiática cria a realidade de um mundo de pessoas decentes frente a uma massa de criminosos, identificada através de estereótipos que configuram um eles separado do resto da sociedade, por ser um conjunto de diferentes e maus.

Os eles da criminologia midiática incomodam, impedem de dormir com as portas e janelas abertas, perturbam as férias, ameaçam as crianças, sujam por todos os lados e por isso devem ser separados da sociedade, para deixar- nos viver tranquilos, sem medos, para resolver todos nossos problemas. Para tanto, é necessário que a polícia nos proteja de suas ciladas perversas, sem qualquer obstáculo nem limite, porque nós somos limpos, puros, imaculados. (p.307)

Sem se dar conta o telespectador é tomado por essa revolta disseminada pela mídia e acaba acolhendo o mesmo discurso de punição e vingança, sem nem ao menos se questionar quais foram as razões que levaram aquele acusado a cometer o crime noticiado, ou ainda, se aquele acusado realmente praticou algum crime.

A criminologia midiática delimita mais o eles quando os identifica etnicamente, como no caso dos negros e índios, deixando-os mais abertos quando assinala uma classe ou estamento social, como os jovens pobres de comunidades precárias ou uma categoria política (subversivos, burgueses). (p.309)

Outro aspecto característico da criminologia midiática é sua seletividade, baseada na teoria do etiquetamento ou “labeling approach”, a qual afirma que a criminalidade é um processo de imputação, é uma etiqueta que se baseia não na conduta do sujeito, mas em suas características físicas, em sua condição social ou em sua raça.

Apesar de a enorme maioria de eles não ter cometido nenhum crime, são projetados como potenciais delinquentes, sob a alegação que nunca saberemos quando passarão da espreita à ação, mas assegurando que o farão; por isso, eles são maus e temíveis e ninguém deve assumir sua defesa nem discutir o que mostra a imagem, que é a única realidade midiática.

(É preciso matá-los, porque não se faz nada com eles) Eles nunca merecem piedade. São eles que matam, não os homicidas entre eles, mas todos eles, são todos assassinos, só que a imensa maioria ainda não matou ninguém. (p.310)

Assim, ao definir os supostos criminosos como “maus” e “temíveis”, a criminologia midiática afirma que a solução para o fim da criminalidade é a aplicação de penas mais duras, como a pena de morte, a prisão perpétua e penas que violam a integridade física e psicológica do sujeito.

Para a criminologia midiática não importa se o sujeito de fato praticou algum crime, basta apenas que ele seja um “potencial deliquente” para o surgimento do discurso de punição.

Basta olhar as estatísticas para verificar que são muitos os países onde há mais adolescentes mortos pela polícia do que vítimas de homicídios cometidos por adolescentes. (p.311)

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