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Processo E Cotidiano Das Organizações De Trabalho E Feira

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Por:   •  9/12/2014  •  5.502 Palavras (23 Páginas)  •  318 Visualizações

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Esse artigo tem por objetivo descrever algumas feições dos processos cotidianos que organizam o trabalho na feira livre. Partindo da compreensão de que tais processos têm sua substância em interações simbólicas, a pesquisa empírica foi desenvolvida por meio de convivência em uma feira livre da cidade de São Paulo, valendo-se também de dados secundários e de entrevistas. Como mercado de trabalho, estima-se que a feira livre gere trabalho e renda para cerca de quarenta mil pessoas. A feira livre organiza-se em redes de relações sociais e suas principais feições são: mesclar relações de trabalho com as familiares, de vizinhança e de amizade; acionar suas rotinas valendo-se de regras tácitas e operar por meio de relações de cooperação e de competição. Os processos que organizam a feira livre devem ser compreendidos à luz da posição da feira livre no processo de urbanização dos países subdesenvolvidos.

Palavras-chave: Psicologia Social; Psicologia do trabalho; feira livre; trabalho; processos organizativos; rede de relações sociais.

ABSTRACT

This article aims to describe some features of the everyday processes that organize work at the open street market. It assumes that symbolic interactions are the substance of these processes. The empirical study was conducted by means of the ethnographic approach in an open street market at São Paulo (Brasil). As a labor market, the open street market provides jobs and incomes for about forty thousand workers. The open street market is organized as a social network, and its main features are: to mix labor relationships with friendship, neighbour and family relationship; to be informed by tacit rules and to be sustained by cooperation and competitiveness. The processes that organize the open street market must be understood in face of the process of urbanization in underdeveloped countries.

Keywords: social psychology, psychology of work, open street market, work, organizational processes, social network.

O objetivo desse artigo é descrever algumas feições dos processos cotidianos que organizam o trabalho na feira livre. Para tanto, apresento a um breve histórico da feira livre, o método empregado, a leitura que orienta a compreensão dos processos organizativos, a descrição dos processos cotidianos que organizam a feira livre e as considerações finais.

A feira livre na vida da metrópole

A origem da feira livre remonta o século IX na Europa: os mercados locais organizados com vistas a suprir a população local com os gêneros de primeira necessidade (Pirenne, 1936).

No nosso caso, em São Paulo, a oferta de produtos alimentícios experimentou diversos tipos de comércio varejista em diferentes momentos de sua história: as quitandas, os mercados, os vendedores ambulantes (Guimarães, 1969; Kozlowski, 1976). A feira livre é oficializada em 1914, tendo sido uma reivindicação do movimento grevista de 1917, conforme depoimento de Edgard Leuenroth, importante líder anarquista desse movimento,2 como meio de baratear a oferta de gêneros de primeira necessidade (Pinheiro & Hall, 1979).

Atualmente a cidade de São Paulo abriga cerca de novecentas feiras livres semanais, de terça-feira a domingo. São instaladas nos diversos bairros da cidade, situando-se em locais com características econômicas e sócio-culturais diferentes. Como mercado de trabalho, estima-se que gere renda para aproximadamente quarenta mil pessoas. O número de comerciantes por feira livre é variável, mas há feiras que acolhem mais de cem unidades produtivas (bancas de propriedade do feirante titular), além dos feirantes ambulantes e muitos trabalhadores que vivem da oferta de pequenos serviços (carregadores, vendedores de lanches e refrigerantes, vendedores de rifa, trocadores de dinheiro para os feirantes etc.).

Passado quase um século desde a sua criação, a posição da feira livre no comércio varejista de alimentos in natura mudou significativamente com a crescente instalação de super e hipermercados. A década de 60 do século que passou testemunhou a expansão dos supermercados (Jesus, 1991). Esse crescimento acompanhou mudanças importantes no processo de urbanização da cidade de São Paulo. AAssociação Brasileira de Supermercados (ABRAS) estima que atualmente cerca de 40% do abastecimento de produtos hortículas é realizado por supermercados, porcentagem que conta com a distribuição de cinco grandes redes de supermercados (Souza, De Rezende & Prado, 2001).

Para compreender a posição da feira livre no espaço da metrópole, recorro à teoria de Milton Santos (1979/2004) sobre o processo de urbanização dos países subdesenvolvidos, a qual toma os diversos tipos de atividade econômica e ocupacional para compreendê-lo. Para o autor, esse processo caracteriza-se pela divisão do espaço urbano em dois circuitos econômicos. O "circuito superior" engloba as atividades econômicas ditas "modernas", voltadas para a acumulação de capital, como os grandes conglomerados orientados pela economia global; incorpora tecnologia de ponta, emprega trabalhadores com nível de escolarização/qualificação mais elevado; as atividades de comércio voltam-se para segmentos das classes média e alta. Por sua vez, o "circuito inferior" orienta sua atividade para a população e economia locais; é trabalho-intensivo utilizando tecnologia pouco sofisticada; os vínculos de trabalho são precários em termos de proteção social; a atividade comercial dirige-se, prioritariamente, para as camadas médias e populares e visa, também prioritariamente, garantir a sobrevivência. Por ser hegemônico, o "circuito superior" da economia orienta as regras para o funcionamento do "circuito inferior" também, o que pode ser sentido como uma convivência tensa.

No caso específico, a tensão entre o comércio da feira livre e o das grandes redes de super e hipermercados3 – exemplares do comércio varejista de alimentos alocados no "circuito superior" – é constantemente relatada pelos feirantes. Não é à toa que os feirantes trazem, espontaneamente, o tema da extinção da feira livre. As ameaças sentidas vêm de longa data. A pulverização dos supermercados freqüentemente é considerada a causa da queda de movimento das feiras livres.4

Muito embora haja distinções significativas entre os dois circuitos, suas atividades convivem e se influenciam mutuamente. A feira livre – característica de atividade situada no "circuito

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