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Resenha de “(O que) Pode a Curadoria Inventar?”, de Gabriel Menotti Gonring

Por:   •  20/11/2023  •  Resenha  •  1.748 Palavras (7 Páginas)  •  33 Visualizações

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Disciplina: Sociedade, Arte e Cultura

MBA em Curadoria, Museologia e Gestão de Coleções

Julia Alexandre Abreu

Matr.: 202004299425

Turma: 2020.2

RESENHA CRÍTICA

“(O que) pode a curadoria inventar?”, de Gabriel Menotti Gonring

(Galaxia São Paulo, Online, n. 29, p. 276-288, jun. 2015).

        

“Seria a curadoria uma forma de linguagem tão apta a produzir valor e sentido quanto outras modalidades de criação? Ou não passaria ela de um conjunto de procedimentos organizacionais neutros, responsável por estabelecer as bases para a circulação da arte e negociar sua existência em diferentes contextos?”

        É esse dilema, apresentado no periódico curatorial Manifesta Journal, que Gabriel Gonring utiliza como premissa para desenvolver sobre os diversos aspectos das práticas curatoriais, no intuito de entender o que nos leva a pressupor uma possível linguagem curatorial, assim como a sua futura consolidação, destrinchando desde os principais expoentes dessa profissão à sua contextualização com as mídias recentes, nos permitindo refletir sobre a autonomia simbólica do curador. O dilema, que especula se a curadoria possui uma veia criativa que a assemelhe à classe artística, de início, é refutado pelo autor ao declarar que se trata de um “impasse falso”, definindo que a curadoria é mais um “conjunto de práticas por meio das quais a obra se realiza publicamente”.

        Para fundamentar esse pensamento, precisamos admitir duas figuras transformadoras do campo de ação da curadoria, Pontus Hultén, que ampliou o conjunto de formas e linguagens acolhidas, ao incluir outras formas de manifestação cultural durante exposições de arte, e Harald Szeemann, que expandiu o número de operações e espaços disponíveis para o curador, ao ser um dos pioneiros a atuar como curador independente. Ambos são responsáveis por transformar a curadoria em uma prática multidisciplinar. A atuação de Szeemann, em especial, nos remete a um ponto importante no que se refere à autonomia criativa da profissão, Gonring ressalta a questão levantada por Boris Groys (2007) de como os encargos do curador independente se equiparam ao do artista contemporâneo. Nesse ponto, acho válido evocar o pensamento de Fayga Ostrower, que não delimitava a criatividade como uma característica exclusiva de um determinado grupo de indivíduos, mas a reconhecia como um potencial inerente da condição de ser humano. Logo, o ato de criar pode abranger os mais diversos campos, não se restringindo apenas à arte. Portanto, ainda que seja inevitável o curador exercer a sua criatividade, o quanto da sua autonomia pode invadir o espaço do artista e sobrepor os valores e princípios estruturadores das próprias obras? E, deste feito, no papel de autor, receber as glórias? Ainda assim, a intervenção curatorial se faz necessária ao criar condições estruturais para as produções artísticas cada vez mais conceituais e efêmeras e criar pontes entre as obras e o público, permitindo a sua total fruição.

        Seguindo adiante sobre a autonomia do curador, Gonring destaca a definição de Aracy Amaral sobre Bienais e documentas, que se tratam de “exposições de curadores, e não mais de artistas” (AMARAL,1988). Porém, Amaral avalia como um sintoma da ideologia capitalista que promove essas mega exposições. De modo preciso, nesse caso, o autor contextualiza o curador quase como um “agente de marketing”, delineando que, ainda que a sua atuação seja criadora de valor e sentido, se sucede de forma publicitária. Em contrapartida, ao usar como exemplos a documenta de Kassel (2007) e as 28ª e 29ª Bienais de São Paulo (2008 e 2010), projetos que trouxeram a reflexão sobre a identidade do evento (no caso da documenta) e seus próprios formatos de exposição (no caso das bienais), denota uma abertura do exercício curatorial à cooperatividade, ao incluir o trabalho de outros agentes, e demonstra não estarem exatamente relacionadas a um sistema de exploração capitalista da produção artística.

        Entretanto, quando Gonring assemelha as experiências das vanguardas modernistas (entre a década de 1920 e 1940) com o desenho de exposição e que, posteriormente, viriam a suceder na definição da instalação como uma categoria de produção artística (conforme Staniszewski, 1998) e destaca ainda como Marcel Duchamp empregou práticas curatoriais na produção da sua obra “Fonte” (1917), o autor nos faz constatar que a autonomia simbólica do curador no final da década de 1960 não se resumiria, necessariamente, a uma invasão do espaço do artista contemporâneo e, sim, a uma renegociação de competências atribuídas a cada um dos mesmos. Considerando esses acontecimentos, podemos constatar que, mesmo antes de suas áreas estarem definidas, já ocorria, o que o autor nomeia, de uma contaminação bilateral.

A profissionalização e proliferação do curador

        Analisando os apontamentos apresentados, entendemos como a autonomia criativa do exercício curatorial pode ter se consolidado. Sem que fosse requerida pelo curador, parece aflorar em ressonância às novas práticas e teorias estéticas exploradas pelos artistas, possivelmente, de início, incitada por Duchamp até atingir seu ápice na década de 1960. Para uma compreensão mais acurada, o autor introduz uma outra perspectiva da problemática curatorial na atualidade, que é a projeção obtida pela função do curador em outras áreas, não mais apenas em museus e galerias.

        Gonring menciona a crescente procura por estudo na área e a mudança de grande parte dos programas de formação do curador para um formato mais dinâmico, ao reunir participantes de todo o mundo em minicursos ou residências conjuntas, um modelo que se adéqua perfeitamente à atuação itinerante do curador contemporâneo. Em paralelo à difusão da profissão, parece ocorrer uma popularização do termo “curador” para além do campo da arte, ao ponto de se poder usar “curadoria” para denominar as mais diversas atividades, como a seleção de produtos para uma loja de rua. Conforme evidenciado por um artigo do New York Times, isso ocorre pelo desejo de distinção – um modo inocente de agregar capital cultural a várias formas de comércio (WILLIAMS, 2009). De forma sagaz, o autor traz a resposta por meio de Hans Ulrich Obrist que, em uma entrevista para a página Huffpost, alerta para a necessidade cada vez maior de “selecionar, editar e definir múltiplos caminhos”, como um “filtro”, em meio à expansiva quantidade de dados presentes na atual era digital (apud BONOMI, 2011). Obrist define que, diferentemente de recriar uma obra, o trabalho do criador é estabelecer diálogos, o que ocasiona na transformação da crescente produção de informações em conhecimento.

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